Opinião
O Mundo 5.0

Decorrido um quinto deste Século XXI, o Mundo vê-se a braços com uma pandemia global que, de uma forma ou de outra, vai inevitavelmente conduzir a mais um salto na evolução da espécie tal como a conhecemos.
Os sucessivos confinamentos globais, mais frequentes em determinados países ou regiões, menos relevantes noutros, levaram-nos já a uma transformação que não pode ser ignorada, com o quase ou total desaparecimento de vários negócios e empresas e, por outro lado, com o surgimento de novas formas de pensar a realidade económica e com o exponencial desenvolvimento de negócios já existentes, mais focados na distância, no online e nas novas tecnologias.
No ido Século XVII o Mundo assistiu a uma revolução industrial que mudou de forma total a face deste planeta. Não será demais admitir que nos tempos em que vivemos iremos assistir cada vez mais a uma “revolução pandémica” que, para o bem e para o mal, obrigou a mais um salto evolutivo. Não tenhamos dúvidas que, passada esta calamidade global, o Mundo nunca mais será o mesmo.
Desenganem-se, porém, aqueles que acreditam que esta nova revolução tecnológica deriva da atual pandemia. Sem dúvida que os impactos da mesma no forçar a alteração de condutas, processos, negócios e, inevitavelmente da realidade em que vivemos, é evidente. Mas num canto deste Mundo esta realidade já não é novidade. Com efeito, há algum tempo que o Japão entendeu, fruto da sua realidade demográfica muito específica, com uma população envelhecida e uma redução possível e a breve prazo da sua força laboral ativa, que o futuro – seu e quiçá do resto do Mundo – passaria pelo domínio do conceito de “Sociedade 5.0”.
O conceito desta evolução é simples e faz uso daquilo que tem sido já o desenvolvimento tecnológico das últimas décadas: a maior produtividade e eficiência dos processos, sempre tendo no centro a tecnologia (internet, sensores, nanotecnologia), a qual deixa de ser entendida como uma possível “besta negra” da Humanidade (afastando aqui a realidade dos filmes do Exterminador Implacável enquanto consequência única de tal salto tecnológico), para ser sim uma convergência de ferramentas com vista à melhoria global da qualidade de vida dos seres humanos.
A crescente automatização industrial e tecnológica, o controlo energético inteligente, o aumento da previsibilidade dos desastres naturais, a robotização da segurança e, em alguma medida, a informatização e afastamento da subjetividade humana na resolução das desigualdades sociais, são assim os objetivos a que o Japão se propõe de forma clara, pretendendo estar na linha da frente desta nova fase evolutiva do planeta, admitindo claramente que a tecnologia não é “inimiga” do ser humano, mas sim existe para o servir.
O mais irónico desta questão não é a posição do Japão, mas sim a resposta do resto do Mundo. Se pensarmos bem, tal resposta poderia ter alguns anos, ou até décadas de atraso, como se todos os demais estivessem ainda a funcionar com um qualquer processador já ultrapassado nas suas especificações. A pandemia veio mudar isso. Obrigou os demais países a pensarem já, talvez mais do que esperavam, na necessidade de avançar para esta nova realidade e acompanharem aqueles que a anteciparam de forma visionária.
Serão sem dúvida anos muito interessantes aqueles que temos pela frente. Olhando para as gerações que nos sucedem, parece que falar de um mundo sem conectividade global é já uma blasfémia. Explicar o conceito de uma televisão a preto e branco, de um computador de torre com disquetes, até mesmo de telefones fixos, parece já uma quimera em que transportamos as nossas gerações mais jovens para uma realidade tão distante quanto para nós foi, por exemplo, a invenção da roda. Acompanhar a sua evolução – delas, as gerações mais jovens -, torna-se diariamente mais difícil e não podemos duvidar que este Mundo 5.0 será, não de seres humanos, mas de seres tecnológicos, com tudo de bom e de mau que isso possa trazer.
Como se diz tanto atualmente, tudo vai ficar bem. O Mundo vai evoluir, vai vencer a pandemia, a tecnologia vai disparar, novos negócios surgem. Mas e o que acontecerá nos países que não possuem os meios para este salto? Não é difícil antever que a desigualdade será cada vez maior, que uns darão o salto e outros ficarão para trás, cada vez mais dependentes da solidariedade dos mais desenvolvidos, mais afastados deste novo Mundo, como se ainda estivessem na Idade da Pedra. Esse é o principal risco que advém de tudo isto, e seguramente um que não pode ser ignorado pelos líderes mundiais. Esse e a Skynet, claro está.