Opinião
O futuro do trabalho: competências, pessoas e inteligência artificial
Vivemos um momento de inflexão histórica em que o avanço da inteligência artificial, da robótica e da automação está a remodelar radicalmente a forma como trabalhamos, produzimos e nos relacionamos.
Em muitas narrativas, o futuro do trabalho surge como uma ameaça iminente: substituição das pessoas por máquinas, algoritmos com maior capacidade de decisão, mais rápidos e, tendencialmente, mais precisos do que cérebros humanos, sistemas que assumem funções outrora consideradas exclusivamente humanas.
Esta visão, embora compreensível, é redutora. O verdadeiro desafio, e também a maior oportunidade, não reside em competir com as máquinas, mas sim em aprender a colaborar com elas, reconhecendo que o futuro do trabalho será feito da aliança entre a capacidade humana e a tecnologia.
Relatórios recentes do World Economic Forum indicam que quase metade das competências atuais dos trabalhadores sofrerão alterações até 2027. Estes dados não apontam para o desaparecimento em massa de profissões, mas sim para a sua reconfiguração. A automação tende a libertar os trabalhadores das atividades repetitivas, criando espaço para aquilo que nos distingue como humanos: imaginar, criar, inspirar, estabelecer relações significativas.
O futuro do trabalho não se resume a uma substituição, mas sim a uma potenciação das capacidades humanas através da tecnologia.
Nesse contexto, a grande questão que se coloca é quais são as competências que permanecerão verdadeiramente relevantes. A OCDE identifica como centrais a criatividade e o pensamento crítico, a aprendizagem contínua, a inteligência emocional e a colaboração. Estas competências são o alicerce do trabalho do futuro, em que o conhecimento e a competência do digital será, apenas e somente, o ponto de partida.
Não basta utilizar ferramentas! É necessário compreender os seus limites, questionar os seus resultados e integrá-las de forma crítica em processos de decisão mais amplos. A tecnologia exige especialistas, mas sobretudo exige cidadãos e profissionais capazes de a utilizar de forma ética, estratégica e criativa ao serviço das organizações, dos setores sociais e econónicos, das pessoas!
A mente humana continua a ser o mais poderoso ativo competitivo das organizações!
As máquinas são extraordinárias na análise de dados e na execução de tarefas complexas, mas não conseguem sentir o que considero verdadeiramente ímpar e distintivo: empatia, consciência ética e visão de propósito. A Harvard Business Review tem sublinhado que a criatividade deve ser encarada como o novo capital das empresas.
Com efeito, e num mundo onde a tecnologia se democratiza rapidamente, o verdadeiro diferencial não está no acesso às ferramentas, mas na forma como as mentes criativas, nós, as aplicamos. Se a inteligência artificial acelera processos, cabe-nos questionar, imaginar e dar sentido a esses processos.
Este futuro não será, contudo, construído de forma isolada. O trabalho do futuro exige redes colaborativas e ecossistemas de inovação em que empresas, universidades, centros de investigação, organismos públicos e os sistemas políticos, convergem para criar valor conjunto.
A União Europeia tem promovido parcerias industriais orientadas para a transição digital e verde, reconhecendo que nenhum ator, por mais poderoso, pode vencer sozinho os desafios da transformação digital, profissional e social em curso. O sucesso não estará nas organizações que concentram talentos, mas sim nas que conseguem tecer redes de competências, cruzar perspetivas e alimentar ecossistemas abertos de colaboração.
Olhando criticamente para o presente, considero que a maior ameaça não é a tecnologia em si, mas a falta de capacidade de investir nas pessoas. Se os agentes de decisão não apostarem de forma clara no desenvolvimento de competências humanas, não fomentarem a criatividade e o pensamento crítico, não incentivarem a aprendizagem ao longo da vida, o risco é criar uma geração de profissionais tecnicamente competentes, mas intelectualmente frágeis, incapazes de pensar, de inovar, ou de questionar o óbvio.
Por isso, o debate sobre o futuro do trabalho deve ir além da dimensão tecnológica e assumir uma perspetiva marcadamente humana e social, onde todos são chamados a dar o seu contributo e onde de facto, nós, humanos, temos um papel diferenciador, dinamizador e de criação! O futuro do trabalho não será ganho pelas máquinas mais rápidas, mas pelas mentes humanas mais criativas, críticas e colaborativas.
A questão central não é o que as máquinas farão, mas sim o que nós faremos com elas. E é aqui que reside a diferença entre um futuro de mera eficiência e um futuro de verdadeiro progresso. Cabe-nos, portanto, decidir se queremos um mundo em que a inteligência artificial apenas reproduz o que já existe, ou um mundo em que a inteligência humana, apoiada pela tecnologia, abre horizontes.
O destino não está traçado. Está, mais do que nunca, na nossa capacidade de imaginar e de agir coletivamente. Esta é, de forma sincera, a minha visão e a minha pretensão enquanto cidadão e profissional que pretende trabalhar, criar valor de forma colaborativa!
Bibliografia
World Economic Forum (2023). Future of Jobs Report 2023.
OECD (2022). Skills Outlook 2022: The Future of Skills.
Harvard Business Review (2024). Creativity as Capital in the Age of AI.








