Opinião

Nesta próxima década, pense em si

Ricardo Tomé, diretor-coordenador da Media Capital Digital

Virámos o ano e simultaneamente a década. Tempo de balanços e listas de resoluções. Na web somam-se várias previsões do que mudará no mundo. Mas o meu convite é para que se volte para dentro de si. Nesta década não pense nos outros e não pense nas coisas. Pense em si.

O tema central é só um: o sonho. O sonho de uma vida melhor. E que vida pode ser melhor sem ócio? A promessa divina está aí. Tecnologia. E com ela, o milagre da Inteligência Artificial, que aliada à robótica nos trará simpáticas máquinas que nos substituirão nas tarefas mais ingratas, desprendendo-nos para fazermos o que mais gostamos. Viver. Sem grilhões. Sem horários. Desfrutando da vida.

Será, pois, a próxima década aquela em que assinalaremos o fim do trabalho humano?

O que a tecnologia nos tem ensinado nas várias revoluções é que tende a avançar depressa demais para a podermos entender antecipada e atempadamente – quando a dominamos, é tarde demais, a mudança já ocorreu (e as várias consequências também). No caso da revolução digital em curso, contudo, esse problema agrava-se. A velocidade da transformação é superior à que se verificou em qualquer outra. Veja-se os últimos 20 anos. E a curva será exponencial no caso da Inteligência Artificial combinada com a Robótica, Machine Learning, Computação Quântica e a infraestrutura 5G que está a ser montada.

Esperar que o melhor da tecnologia impacte nas sociedades sem haver intervenção é apenas incauto e infantil. Está, pois, na formação, educação e preparação mental e no estudo da própria que poderemos estar melhor preparados e conduzir essa transformação da tecnologia para o bem comum. Ou isso ou é como acender um fósforo numa floresta e esperar para depois do incêndio se começar a pensar em como o dominar…

Pensar em si significa não cair na tentação de achar que uma pré-reforma aos 30 anos é ótimo. Lembre a alegoria que a Pixar nos mostrou, provocando-nos, no filme “WALL-e”, por onde humanos sedentários em suas cadeiras flutuantes se regozijam do cimo dos seus 100 e muitos quilos e sem mobilidade própria, numa vida sem rumo. Achar que empresas e governos estão alinhados no mundo inteiro de forma coordenada conduzindo esta revolução de forma a saberem exatamente como a mesma impactará as nossas vidas e, em específico, que nos ajudará a trabalhar menos e a ganhar mais (dinheiro e tempo e saúde), é talvez demasiado (muito) ambicioso.

Nesta nova década, portanto, pense em si. Comece por aí. Volte-se para dentro e pense que o mais importante é focar as nossas energias num objetivo. Ou se preferir, num sonho. Num caminho. E se alguma máquina lhe retirar um papel que tem na vida, um espaço, um propósito, duvide dela. Questione-a.

Pensar em si significa pensar-se como agente mobilizador. Desse propósito. Ou desse sonho. Mobilizar os outros numa busca. No que efetivamente vai ser relevante para a sociedade e para a empresa e para a sua família.

Mobilizar-se a si mesmo não se deixando enredar por esse fatum, qual ideia de que alguém nos vai pagar para não fazermos nada e podermos passear ou procrastinar o dia inteiro, qual ilha do éden, com tal imagem de máquinas escravas a trabalhar por nós e para nós, para que os humanos possam regozijar-se em dias de pacata preocupação, entre cafés, praia, cinema e sabe-se lá que gozos mais.

Não que não possa vir a acontecer, mas pela imprevisibilidade do que possa acontecer e pela improbabilidade de que possa acontecer.

Nesta década, pense em si. Deixe de lado a ansiedade da espera pelas máquinas. Acredite em mim, por maior I.A. que venham a ter elas só pensam nelas (pelo menos nas próximas décadas). Não há nada pior para a vida de um ser humano do que uma vida sem propósito – pense em si e em qual vai abraçar nesta década. Depois agarre nisso e não pense mais.

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Ricardo Tomé

Ricardo Tomé

Ricardo Tomé é Diretor-Coordenador da Media Capital Digital, empresa do grupo que gere a estratégia e operação interativa para as várias marcas – TVI, TVI24, IOL, MaisFutebol, AutoPortal, etc. – com foco especial na área mobile (Rising Star, MasterChef, SecretStory) e Over-The-Top (TVI Player), bem como ativação de conteúdos multiscreen em todas as plataformas e realizando igualmente a ponte com o grupo PRISA nas várias parcerias: Google & YouTube, Facebook, Twitter, Endemol, Shine, entre outras. Foi, até 2013, coordenador da... Ler Mais..

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