Entrevista/ “Temos de perceber o papel do ser humano no mundo de abundância”
A SingularityU Portugal Summit chega daqui a menos de um mês. O evento, que traz consigo grandes nomes do mundo das tecnologias emergentes, vai realizar-se em Cascais. Para percebermos o que esta cimeira vai trazer ao concelho, que se quer tornar “o melhor sítio do mundo para se viver”, falámos com Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara Municipal.
Agendada para os próximos dias 8 e 9 de Outubro, a conferência SingularityU Portugal Summit vai abordar temas como inteligência artificial, carros e redes autónomas, medicina e biotecnologia, o futuro do trabalho… ou seja, um sem número de temáticas em que a tecnologia é a peça central. As palestras vão estão a cargo de oradores e especialistas nacionais e internacionais que vão abordar o impacto da tecnológica em diferentes componentes da vida pessoal e empresarial.
O evento decorre no novo campus da Nova SBE, em Carcavelos, e por isso convidámos o vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais a falar das suas expetativas sobre esta iniciativa que promete animar o concelho.
O que espera do SingularityU Portugal Summit Cascais?
Espero que consigamos compilar um programa que traga a Cascais os melhores oradores na área da disrupção tecnológica, da inteligência artificial e da sensibilização do mundo para as transformações que aí vêm.
Há algum speaker que lhe desperte especial interesse?
Há vários. Eu já tive oportunidade de assistir a duas summits: uma em Amesterdão e outra em São Francisco, em agosto, e há muitos oradores que aconselho vivamente a não se perder porque nos trazem uma visão que não é assustadora, é otimista, mas que nos faz olhar para o mundo de outra forma. Trazem-nos outra perceção da necessidade de termos de mudar nos próximos cinco a dez anos, sob pena de ficarmos completamente para trás. Mas, por exemplo, o David Roberts [disrupção da tecnologia e liderança exponencial] e a Vivienne Ming [neurociência cognitiva] são oradores que estão confirmados e que não podemos perder.
Que possível retorno pode haver para Cascais com a entrada deste evento?
Nós não medimos o retorno. Cascais organiza dezenas de eventos, que atraem milhares e milhares de pessoas e turistas. Este evento não tem esse objetivo. O SingularityU está alinhado com uma necessidade e uma responsabilidade quase institucional por parte da Câmara de Cascais de contribuir para este debate sobre o futuro. O que é que estas tecnologias vão impactar na nossa vida, a quantidade de postos de trabalho perdidos com a robotização da indústria e a inteligência artificial, todos os dilemas éticos da condução autónoma, os transportes e a mobilidade… Tudo isto vai mudar as nossas vidas e nós temos de estar preparados e Cascais tem essa responsabilidade porque, desde sempre, foi uma autarquia e um município que liderou as transformações. Cascais teve a primeira rede elétrica do país, o primeiro jogo de ténis, a primeira vez que se surfou uma onda e a primeira gravação de um filme.
Portanto, o concelho está conotado com este legado de disrupção, de experimentar aquilo que é novo e, por isso mesmo, não há melhor sítio como a nossa vila em que, também hoje, se estão a experimentar caminhos novos em smart cities, em cidadania eletrónica e em gamificação da vida urbana para fazer uma cimeira como esta.
Pegando na gamificação, este ano, a Câmara Municipal de Cascais foi distinguida na categoria de Government & City Engagement, na Global World Summit Awards, por causa da app City Points. Sendo as tecnologias emergentes um dos temas centrais do evento, que problemas poderiam ser resolvidos com uma solução de base tecnológica para facilitar o dia-a-dia dos visitantes e dos munícipes?
Há muitos. Cascais hoje está na moda e, por isso, temos milhares e milhares de pessoas que visitam a vila. E, às vezes, é impossível receber todas as pessoas que querem vir com a capacidade que temos. Se tivéssemos sistemas inteligentes de gestão da mobilidade – que estamos a implementar neste momento – podíamos melhorar a qualidade de vida das pessoas. Outros exemplos são o abastecimento de água, a recolha de resíduos sólidos urbanos, a capacidade de termos as nossas ruas limpas e a segurança dos cidadãos através da videovigilância. Tudo isso são temas que importam aos nossos cidadãos e Cascais tem tudo a ganhar. Mas temos de compreender os impactos positivos e negativos que qualquer tecnologia tem. As tecnologias não são um fim em si mesmo, mas sim um meio para atingir um fim – que é a qualidade de vida e a felicidade dos cidadãos.
E em que outras iniciativas é que a Câmara tem trabalhado com o objetivo de potenciar este tipo de inovação?
Nos nossos museus, no nosso arquivo – que está inteiramente digitalizado -, na interação com os cidadãos, onde mais de 90% das alterações são feitas digitalmente, a Câmara hoje está toda em cloud. São tudo áreas em que a Câmara de Cascais tem vindo a liderar e quer continuar neste caminho.
E do ponto de vista negativo. Que desafios é que podem surgir para as autarquias com a adoção deste tipo de tecnologias emergentes?
A perda de postos de trabalho, por exemplo. Cada vez que há uma nova tecnologia que substitui uma pessoa, há uma perda de um posto de trabalho. Temos de perceber como é que conseguimos reintegrar essas pessoas na sociedade e de as capacitar para responderem a um novo desafio de carreira.
E acredita que a acessibilidade na tecnologia pode diminuir as disparidades entre as classes sociais?
Acredito que sim. Acredito num mundo futuro onde a tecnologia pode resolver grande parte dos nossos problemas e, por isso, é que nós temos de perceber o papel do ser humano nesse mundo de abundância, onde a tecnologia conseguirá dar a todos aquilo que cada um de nós deve ter, ao contrário do mundo de desigualdades em que vivemos hoje.
Em relação à Nova SBE. Que oportunidades é que vão surgir para o concelho com a entrada da universidade em Carcavelos?
É difícil de antever, mas a Nova SBE é uma das melhores business schools da Europa, seguramente a melhor a nível nacional – com uma média de entrada elevadíssima – e, portanto, o melhor talento nacional está a chegar todos os anos à Nova SBE. Mas mais importante ainda é que 50% dos seus alunos são estrangeiros. O que significa que está a trazer para Cascais talento e massa cinzenta capaz de transformar o mundo. A partir do momento em que juntamos no mesmo espaço um edifício absolutamente icónico, uma vista deslumbrante, um mar como o de Cascais, as pessoas – que recebem bem – e um concelho que quer também estar a liderar em termos futuros, acho que temos todos os ingredientes necessários e suficientes para termos surpresas muito agradáveis no futuro. Eu não consigo ser futurista e antever, mas vejo muitas possibilidades em curto, médio e longo prazo.
A estratégia de Cascais não passa por se tornar um business center. Por isso é que apostamos em ser o melhor sítio para viver.
Quando olhamos para Oeiras apercebemo-nos que há centros para empresas, como o Tagus Park, o Lagoas Park e, agora, a possibilidade de entrar a Google. O que é que ainda está a impedir Cascais de se tornar um business center?
Não é essa a nossa estratégia. A estratégia de Cascais não passa por se tornar um business center. Por isso é que apostamos em ser o melhor sítio para viver. Apostamos muito em universidades, conhecimento e talento e hoje lideramos nessa fase, com a Nova, a melhor escola de hotelaria do país [ESHTE], a Escola Superior de Saúde do Alcoitão. Estamos a captar mais saber e conhecimento e temos a sede da Brisa e a Logoplaste. No entanto, esse não é o nosso negócio nem posicionamento, mas sim o de Oeiras. Cada município tem o seu posicionamento e a sua vocação e o de Cascais é de ser o melhor sítio do mundo para se viver.