Opinião
Livros brancos, tecnologias e pudores

Atualmente, é necessário que as indústrias culturais e criativas se adaptem aos novos requisitos dos consumidores. No entanto, para isso acontecer, o tecido empresarial deve estar capacitado para responder à implementação das intituladas tecnologias emergentes, seja pelo lado da velocidade estonteante da inovação, seja pelo lado da captação, atração e retenção de talento.
A ANETIE – Associação Nacional das Empresas das Tecnologias de Informação e Eletrónica, acaba de apresentar publicamente dois Livros Brancos. Um primeiro dedicado às Tecnologias de Produção, documento, esse, em que foram visadas as indústrias têxtil, vestuário e calçado, os setores das máquinas, produtos metálicos e equipamentos de transporte, e a área alimentar. O segundo estudo debruça-se sobre as indústrias Culturais e Criativas, abrangendo uma miríade de atividades que incluem arquitetura, design, publicidade, artes performativas, criação literária, património histórico, música, cinema, vídeo, televisão e rádio, entre outros ofícios, serviços e negócios.
Ambos os ensaios resultam do projeto xTIE, programa, esse, que pretende aumentar a notoriedade de Portugal enquanto produtor industrial, criador de soluções inovadoras e exportador de tecnologia. Ora, confesso a minha hesitação inicial em trazer o assunto para tema deste artigo de opinião. Isto fruto do cargo que ocupo na mais representativa associação do setor das TICE, mas logo as inquietantes conclusões dos trabalhos dissiparam quaisquer pudores pois interesses superiores em benefício do mercado, do território e da economia sobrepuseram-se a quaisquer acanhamentos.
Na verdade, o nosso país, e em particular a região Norte, é caracterizado por um modesto nível de digitalização. Tendo como referência o Índice de Digitabilidade da Economia e da Sociedade (IDES), Portugal ocupa em 2019 a 19.ª posição entre os 28 países da União Europeia (UE) com um valor de 49,2 pontos, uma marca ligeiramente inferior à média europeia (52,5 pontos). A perder terreno pelo segundo ano consecutivo entre as nações com maior implementação de serviços públicos digitais, penetração de internet ou digitalização de empresas, a situação agrava-se quando recordamos as assimetrias regionais que colocam a região Norte numa posição ainda mais débil relativamente à inovação baseada em TICE.
Auscultados especialistas, académicos, empreendedores, empresários e gestores, levado a cabo o diagnóstico e tirada a radiografia, os Livros Brancos de imediato apontam para estratégias, mecanismos e metodologias de trabalho. A promoção de ações de sensibilização focadas quer em tecnologias estabelecidas quer em tecnologias emergentes, o fomento de espaços de reflexão sobre tecnologias disruptivas, e o estímulo à colaboração entre as instituições do sistema de ciência & tecnologia, as universidades e as associações e as empresas surgem, então, como algumas das medidas enunciadas no tronco comum dos dois documentos. Mas também o impulso de políticas públicas favoráveis à sociedade de informação, o incentivo à partilha de boas práticas empresariais relacionadas com as TICE, a comunicação e os recursos especializados, e o incremento da literacia digital da população.
Agregado de propostas que visa o estabelecimento de uma cultura de inovação com impacto direto no emprego, competitividade e internacionalização. Maximizando, de resto, as inúmeras possibilidades oferecidas pelo atual ambiente tecnológico: novos requisitos dos consumidores; a sua orientação para as tecnologias digitais; e as correntes formas de comunicação negócio-cliente. Todavia, será necessário que o tecido empresarial esteja capacitado para responder à implementação das intituladas tecnologias emergentes. Seja pelo lado da velocidade estonteante da mudança. Seja pelo lado da captação, atração e retenção de talento.
*Associação Nacional das Empresas das Tecnologias de Informação e Eletrónica