Opinião

Tema super importante. Hiper atual. Mas sempre foi. Há é um certo receio de se falar no tema. Porquê? Porque há líderes que mentem, sempre mentiram e continuam a mentir por várias razões: 1) para alcançarem objetivos (valendo os fins e independentemente da justiça dos meios); 2) para ocultarem fraquezas; 3) para acreditarem mais em si mesmos.

Mas há muitas mais razões. Estas três irão chegar para este textinho. Marcel Schawantes escreveu este mês sobre o tema na Fast Company. Mas a sua abordagem é bem diferente. Vamos por partes e desagreguem-se as três razões, na minha opinião:

  • Mentir para alcançar objetivos

São o tipo de mentiras sobre pseudo trabalhos que fizeste, colocando-te em bicos dos pés, sobre resultados que alcançaste, idem, envolvendo tantas vezes trabalho de terceiros de que te aproprias e tornas teu. Sim, há quem minta por tudo e nada e não tenha uma postura consistente, quem não assuma erros, quem se endeuse para procurar perpetuar e/ou inventar resultados. E há os que de tanto mentirem acreditam na sua própria narrativa. Narrativa errada. E, ainda, quem revisite a história quando, esporadicamente, teve resultados para demonstrar que continua a ter resultados.

Nada, pois, como conferir consistentemente resultados. E há muitos resultados auditáveis, muitos que resultam de performance operacional e de performance financeira, ano após ano. Esses, porque envolvem quantificação, são bastante menos suscetíveis de serem manipulados e alvo de narrativas de umbigo.

Ainda assim…A postura vertical, o evitar a mentira, a frontalidade e a honestidade intelectual estão em desuso. É pena. Porque se diz por aí que precisamos de líderes mais humanos, mais autênticos, mas, quem mente para conseguir resultados sem olhar a meios, de humano tem pouco. Tem mais de maquiavélico, de usurpador, de encenador de mau teatro.

  • Mentir para ocultar fraquezas

Já te perguntaste se já mentiste a ti próprio, para te auto convenceres de que um hábito prejudicial ou algo contraproducente ou desaconselhável poderá, afinal, ser aceitável? Nem todos gostam de admitir, mas às vezes o ego conduz a lugares onde realmente não deverias ter ido.

Pensa num momento em que sabias que estavas errado, e talvez até todos ao teu redor soubessem disso mesmo. Sussurrava, e tu sentias, aquela voz interna que, por um lado, te alertava para o erro, mas, por outro e com mais força, te incentivava a continuar – mesmo quando era obviamente uma má ideia e, bem… uma mentira. Isso mesmo induz auto deceção e pode causar-te grandes problemas enquanto líder.

Normalmente, isto acontece assim: perdes-te um pouco nas tuas próprias ideias, convences-te de que aquele teu caminho é o único caminho a seguir, começas a culpar outros pelo que não está a funcionar, tentas controlar e manipular pessoas ou situações para se adequarem à tua narrativa e evitas enfrentar o teu papel na situação.

Isto acontece, em particular, quando estás no topo de uma organização ou geres uma equipa, onde o tamanho do ego vai ditando o rumo de todos. O teu rumo e o rumo de todos. Porquê? Porque a auto deceção – a mentira que continuas a contar a ti próprio – antecipa um desastre qualquer.

  • Mentir para acreditar mais em si próprio

Esta parte radica essencialmente num mau exercício de autoconhecimento. A má exploração dos pontos positivos e a deceção permanente com as fragilidades leva-te à mentira para ocultares falta de confiança. É trabalhável, deve ser, mas furtares-te a trabalhar o autoconhecimento é o primeiro passo para a mentira. Sem autoconhecimento será virtualmente impossível acreditares mais em ti próprio porque desconheces os teus super-poderes e as características que te podem levar a um lugar de liderança eficaz.

Não te iludas. Uma mentalidade de crescimento abre portas às tuas habilidades básicas que, se bem desenvolvidas através de dedicação e de trabalho árduo, podem trazer enormes benefícios. Cérebro e talento são apenas o ponto de partida. Esta visão construtivista acabará por criar um amor pela aprendizagem e uma resiliência que são essenciais para grandes realizações.

Uma mentalidade voltada para o exterior enfatiza a comunicação aberta e mais autêntica, criando espaços onde os membros da equipa e da organização possam compartilhar as suas preocupações de maneira mais serena. Quando operas com uma mentalidade de crescimento, ouves mais uns e outros sem grandes julgamentos e focas-te na procura de soluções em vez de te atirares aos culpados.

Esta mentalidade de crescimento cria, assim, um efeito de autoconhecimento que acaba por desmantelar a auto deceção e estabelecer o ambiente para um trabalho mais produtivo e satisfatório para todos.

Pensa, pois, em fazeres o que tens a fazer sem mentiras. Ganhas tu. Ganham todos. E se perderes, faz parte da vida. Uma coisa é certa: perdes sempre mais a mentir do que a dizer a verdade.

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José Crespo de Carvalho

José Crespo de Carvalho

Licenciado em Engenharia (Instituto Superior Técnico), MBA e PhD em Gestão (ISCTE-IUL), José Crespo de Carvalho tem formação em gestão, complementar, no INSEAD (França), no MIT (USA), na Stanford University (USA), na Cranfield University (UK), na RSM (HOL), na AIF (HOL) e no IE (SP). É professor catedrático do ISCTE-IUL, presidente da Comissão Executiva do ISCTE Executive Education e administrador da NEXPONOR. Foi diretor e administrador da formação de executivos da Nova SBE e professor catedrático da Nova SBE (Operations... Ler Mais..

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