Opinião
Inteligência Emocional: o melhor piloto da Fórmula GPT

Nesta fase parece-me que já ninguém tem dúvidas do potencial da Inteligência Artificial. Diria até que olhamos para tudo isto, em tão pouco tempo, como um Fórmula 1 a acelerar ao lado de um trator. Tal como nem todos os pilotos têm “mãos” para um F1, qual o melhor piloto para o Fórmula GPT? A Inteligência Emocional.
Tal como tantas outras pessoas, admito que estou absolutamente fascinado com o fenómeno inteligência artificial. Para além do que isto tudo significa e as suas potencialidades, e já lá iremos, é verdadeiramente incrível a velocidade exponencial a que isto tudo se tem sucedido. Se me mostrassem tudo aquilo que surgiu após o lançamento do Chat GPT (que foi o “trigger”) e a seguir me tivessem dito que apenas tinham passado seis meses, eu não acreditaria.
Mas aconteceu. Foi lançado no dia 30 de novembro de 2022, e com isso tanta coisa já mudou, e ainda mais vai mudar. Tenho a sensação que é como se de repente cada um de nós tivesse um Fórmula 1 à disposição, sem sabermos exatamente como o conduzir, pelo menos não em condições de fazer “flying laps” (voltas muito rápidas na gíria da F1).
Se vai mudar muita coisa? Sem dúvida. Vão mudar e adaptar-se muitas empresas, vão mudar (ainda mais) os perfis procurados e as skills valorizadas, vão mudar as formas e critérios de recrutamento, vão mudar as pessoas, vão provavelmente ter de mudar os métodos de ensino, particularmente nas universidades, e vão inclusivamente mudar muitas questões de cariz mais social.
Se vai mudar tudo? Não, até porque nem tudo pode (nem deve) ser automatizado ou “artificializado”. Se na minha opinião a inteligência emocional já era provavelmente uma das características profissionais e pessoais mais importantes (ou mesmo a mais importante), neste momento adquire uma importância extrema, uma vez que será provavelmente distintiva entre profissionais que vão ter cada vez mais facilidade em aprender hard skills através de ferramentas mais sofisticadas e de acesso imediato, e continuará a ser aquilo que nos permite aprender com base em sensações e emoções, em experiências, e a tomar decisões tendo em consideração múltiplas variáveis intangíveis de circunstância, passado, presente e futuro.
Em primeiro lugar vão então mudar (e muito) as empresas, automatizando muitas funções de cariz mais repetitivo e reduzindo o tamanho das equipas, potenciado por ganhos de produtividade exponenciais trazidos pela inteligência artificial, e transferindo os colaboradores para outras funções. Ao mesmo tempo, será muito mais fácil permitir rotações internas, fruto do acesso imediato à informação e aprendizagem, diminuindo as assimetrias de hard skills, e havendo uma ainda mais premente diferenciação ao nível das soft skills como a criatividade, pensamento crítico, empatia, resolução de conflitos e acima de tudo capacidade de adaptação à mudança. No entanto, grande parte das empresas (e das pessoas) não está ainda preparada para fazer esse “shift” – um estudo recente do LinkedIn apontou precisamente a inteligência emocional (que está relacionada com estas soft skills) com uma dos cinco skills que as empresas mais sentem a falta nas suas forças de trabalho.
Como consequência, a forma e o tipo de recrutamento vai também mudar. As empresas vão (ou pelo menos deviam), privilegiar cada vez mais (o que já era uma tendência) as tais soft skills em detrimento dos puros hard skills, que são agora cada vez mais fáceis de adquirir e quase à distância de um “prompt”. Os candidatos serão ainda mais valorizados e procurados por aquilo que já viveram, pela multiplicidade de experiências relevantes e de valor acrescentado que colecionaram (profissionais e pessoais), pelas atividades extracurriculares, pelo seu fit pessoal com a cultura de empresa, pela sua capacidade de adaptação, liderança na mudança, e potencial futuro, independentemente da sua formação académica e background em termos de funções ou setores. Mais uma vez, a inteligência emocional será fundamental num contexto de inteligência artificial.
Finalmente, vão provavelmente ter que mudar e adaptar-se muitos cursos superiores, para precisamente formarem melhores e mais completos indivíduos, fomentando e desenvolvendo não só os seus hard skills (principalmente aprendendo a potenciar as ferramentas que têm à disposição) mas acima de tudo os seus softs skills, a capacidade de liderança e trabalho com os outros, e promovendo uma coleção de experiências pessoais e profissionais que lhes traga maturidade e “mundo”. Se antes do boom da inteligência artificial já eram normalmente os alunos mais completos (e não necessariamente só os com melhores notas), que vingavam mais no longo prazo, num futuro próximo essa tendência acelerará significativamente.
No entanto, e para pôr alguma água na fervura, todo este progresso vertiginoso também traz desafios significativos. Recentemente uma fotografia produzida por inteligência artificial ganhou um importante concurso. Não se trata só de AI ser capaz de fazer igual ao melhor a um humano, mas sim de ser muito difícil de distinguir realidades. Perigoso? Talvez, como qualquer ferramenta com potencial infinito que ainda não conhecemos ou controlamos a 100%. Tal como na F1, será preciso testar, provavelmente até “despistar” um par de vezes, para se afinar o carro e estar mais à medida do piloto. E cavalgando na mesma metáfora, é necessário também que se definam regras para que as ferramentas sejam sempre instrumentos para fazer o bem e para não pôr em risco a segurança do(s) piloto(s).
No final do dia, na Fórmula 1 ter um melhor carro nem sempre é sinal de vitória, e um bom piloto num carro mais fraco nem sempre consegue fazer maravilhas. Também na Fórmula GPT, da Inteligência Artificial, para bem suceder neste circuito complexo que é a vida profissional e pessoal, não basta um carro potente, são precisos bons pilotos (desculpem, profissionais), plenos de Inteligência emocional. De que valem as ferramentas se não as soubermos usar (corretamente)?