Entrevista/ “O futuro da agência passa por uma DNA mais internacional”

Pedro Loureiro, diretor-geral da DNA Cascais

Falámos com Pedro Loureiro que comanda desde abril passado os destinos da agência de empreendedorismo do município de Cascais e que acredita que o futuro da DNA Cascais passa pelo mercado internacional.

A DNA Cascais celebra este ano uma dezena de anos de vida na promoção, incentivo e desenvolvimento do empreendedorismo jovem e social no concelho.

Com um nicho de empresas em Alcabideche, já apoiou nestes 10 anos a criação de 292 empresas, que potenciaram mais de 1500 novos postos de trabalho, e gerou um volume de negócios de aproximadamente 62 milhões de euros. O seu programa “Escolas Empreendedoras” conta com 10 edições e um total de mais de 18 mil alunos, 50 escolas e duas universidades (ESHTE e ESSA) do concelho de Cascais envolvidas.

Pedro Loureiro, que passou pela Banca de Empresas, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e desenvolveu trabalhos na área da Consultoria para start-ups, em Londres, assumiu em abril passado a direção-geral da DNA Cascais. O responsável acredita que o futuro da agência passa por uma estratégia mais internacional e que esta “é hoje vítima do seu próprio sucesso e precisa de ampliar a sua capacidade de acolhimento”.

Quais os seus objetivos enquanto novo diretor-geral do DNA Cascais?
Bem, o primeiro de todos é cuidar e honrar o legado recebido. Ao longo dos seus 10 anos de existência a DNA realizou um trabalho notável na promoção do empreendedorismo e ganhou um enorme capital de experiência no acompanhamento dos empreendedores nas fases de planeamento, lançamento e crescimento das suas empresas e negócios.

Nestes 10 anos, o ecossistema empreendedor alterou-se profundamente – para melhor, naturalmente -, e por isso temos também nós de manter uma permanente atitude de mudança, mas conservando intacto o core dos nossos valores. A intensificação do relacionamento internacional com congéneres e organizações do ecossistema, a criação das condições para que as empresas apoiadas possam expandir-se para outros mercados, a captação de investimento e financiamento estrangeiro constituem linhas de ação para o objetivo de uma DNA mais internacional. No plano interno, continuar a providenciar às empresas apoiadas e aos empreendedores que nos procuram as condições para que possam fazer vingar os seus negócios. A DNA é hoje vítima do seu próprio sucesso e precisamos de ampliar a capacidade de acolhimento – temos uma lista de espera na incubadora – e o ritmo crescente de solicitações é um permanente desafio.

Que balanço faz do trabalho desenvolvido pelo DNA Cascais desde a sua criação?
Como disse, na última década todo o ecossistema empreendedor se alterou profundamente, em Portugal e no nundo. Quando a DNA foi criada, o empreendedorismo era um tema pouco debatido em Portugal e as estruturas de apoio que então existiam – as incubadoras – estavam circunscritas ao meio universitário, sendo na sua maioria resultado da evolução dos laboratórios de transferência de tecnologia. Estavam dentro do meio académico e pouco acessíveis ao cidadão comum. Criar uma estrutura de apoio ao empreendedorismo, com uma incubadora de empresas de iniciativa local, foi um passo de gigante na altura.

Repare que, em 2006, o iPhone ainda não tinha sido lançado, não havia apps nos telemóveis, o fenómeno dos serviços de geolocalização e o conceito de smartphone estavam a dar os primeiros passos. E é por isso que este percurso da DNA é tão rico: apoiou todo o tipo de empreendedores, desde o negócio tradicional de base local a empresas certificadas pela Agência Espacial Europeia, que desenvolvem tecnologia de ponta para uso global. E nunca perdeu essa abrangência na sua atuação.

Quais os projetos que o DNA Cascais tem previstos para este ano?
Temos uma agenda intensa. A atividade da DNA reparte-se por quatro áreas principais: empreendedorismo jovem e social; apoio ao desenvolvimento do plano de negócios, crescimento e internacionalização; apoio ao financiamento dos projetos, nomeadamente através do Clube de Business Angels de Cascais, que acolhemos e, por último, a incubação física ou virtual, dando suporte operacional ao empreendedor.

No empreendedorismo jovem, desenvolvemos programas que abrangem mais de 7 mil alunos em 43 escolas e que se desenrolam ao todo o ano letivo, culminando nas finais dos concursos DNA Jovens Empreendedores e do Jovens Cientistas, já realizados. Realizámos também a Feira Ilimitada e a Feira DNA-StartIUPI, e vamos ainda realizar o concurso “Faróis” e um bootcamp para jovens com a StartIUPI, no próximo mês de julho.

No apoio ao empreendedorismo, realizámos recentemente a 11ª edição do Concurso de Ideias e Negócios de Cascais, o evento nacional Get In The Ring – uma competição mundial, com presença em 160 países e num modelo original, que permitiu a Portugal estar presente na final global em Singapura, este mês.

Somos também parceiros do Big Smart Cities, organizado pela Vodafone, que terá em Cascais o laboratório da edição deste ano e o bootcamp no próximo mês de julho, e vamos ainda realizar a Global Entrepreneurship Week, em parceria com a Global Entrepreneurship Network.

De que forma o DNA Cascais procura ser um facilitador de contactos e meios financeiros para os empreendedores?
Desde logo porque acolhemos o Clube Business Angels de Cascais, um dos mais antigos no país e com uma base de associados de enorme peso. Também o IAPMEI é um parceiro desde a primeira hora, facilitando a informação e o acesso às linhas de apoio às empresas. E auxiliamos o empreendedor na análise das soluções de financiamento bancário, esclarecendo sobre vantagens, riscos e possíveis alternativas no mix das diferentes fontes de financiamento.

Como avalia as start-ups que estão hoje no DNA Cascais? Quais os setores mais representativos destas start-ups?
Como disse anteriormente, temos desde o negócio tradicional até à tecnologia de ponta. Neste momento temos 60 empresas incubadas, 39 das quais em incubação física e as restantes em incubação virtual. Mas o interessante é que tanto acolhemos conceitos inovadores em setores tradicionais – como o turismo e a restauração, vinhos ou serviços de saúde -, como empresas que desenvolvem tecnologia de materiais para atividades tão diversas como o surf, lançamento e recuperação de satélites, smart mobility e outros serviços assentes em plataformas de geolocalização ou ainda software e hardware para serviços de apoio à gestão ou gamification.

É uma comunidade muito heterogénea e que abrange diversos graus de diferenciação, o que nos proporciona também a nós uma enorme experiência no seu acompanhamento.

Quantas start-ups já apoiaram desde 2006?
Todos os dias recebemos novos projetos para apoiar, mas são já cerca de 315, que resultaram de mais de 3 mil contatos de empreendedores.

Que casos de sucesso saíram do DNA Cascais?
Vou cometer várias injustiças por omissão, mas temos a Medbone, uma das primeiras empresas incubadas e pioneira no fabrico de osso sintético para próteses e usos médicos, exportando para mais de 50 países; a Optimal, que desenvolve e produz componentes compósitos de alta sofisticação; a Clickly, que no software de e-commerce despertou o interesse da gigante Shopify e ganhou asas, entre tantas outras que vingaram com sucesso no mercado e das quais me estou a esquecer agora. E depois temos aquelas que já vingaram no mercado mas ainda estão incubadas, como a Xhapeland, que produz pranchas de surf de referência mundial, a Casca Wines, que desenvolveu um inovador conceito de desenvolvimento de produto no vinho e está a crescer brutalmente no mercado internacional. Felizmente são muitos casos, um orgulho tremendo.

Qual a taxa de sobrevivência das empresas que por aqui passaram?
Considerando apenas as empresas efetivamente encerradas, é de 83%. Se ajustarmos essa taxa com as empresas ainda sobreviventes mas sem atividade, é de 77%. São números francamente acima da média nacional, que de acordo com estudo recente da Dun&Bradstreet é de cerca de 50%, e que muito nos honram.

A formação é outra área de aposta do DNA Cascais. Qual a ligação do DNA Cascais com alunos e docentes do concelho?
Sim. O empreendedorismo jovem e social é um dos nossos pilares de atuação. Levamos a cabo, ao longo do ano letivo, programas de formação em 43 escolas do concelho, que abrangem mais de 7 mil alunos. São projetos que desenvolvemos em parceria com a Câmara Municipal de Cascais e com as próprias escolas, mas também com parceiros como a Universidade Europeia, com a Junior Achievement, com a StartIUPI, ou com a Science4U. É uma área muito gratificante, os projetos desenvolvidos pelos jovens ganham qualidade de ano para ano e impressionam pela maturidade e pela forma como desenvolvem modelos de negócio e produtos com grande viabilidade. Para além das capacidades que evidenciam desde cedo no pitch, na formulação do business plan e na defesa das suas ideias. É notável.

É Cascais um concelho de empreendedores?
Sem margem para dúvida. A DNA comprova-o.

Antes de ingressar na DNA Cascais, o Pedro desenvolveu trabalhos na área da Consultoria para start-ups, em Londres. O que nos pode contar sobre esta sua experiência e ecossistema?
Londres tem um ecossistema muito diferente do português, para o bem e para o mal. Para o bem, porque permite mais networking, maior acesso ao financiamento privado e tem um espírito de abertura a novos conceitos que potencia a inovação. O lado menos bom é que a competição é muito maior, pois concentra projetos e empreendedores de todas as origens que ali procuram vingar (apesar do espírito de comunidade ser forte), e os custos de lançamento e de operação são muito superiores. Em Portugal as start-ups têm acesso a condições que não existem em Londres: custos de estrutura reduzidos, financiamento público (em Londres, apenas benefícios fiscais), recursos humanos qualificados em maior abundância e mais acessíveis, fatores que tornam Portugal tão atrativo para as start-ups estrangeiras. Falta-nos apenas a dimensão do mercado e o risco-país, para que o mix seja perfeito.

Que conselhos partilha com as start-ups que nascem hoje em Portugal?
Escalabilidade é fundamental. E, no caso português, projetar logo desde o início a internacionalização (quando aplicável, obviamente): quando, como e para onde. A base da empresa pode ser nacional, mas o mercado tem de ser maior. O mercado interno é, quanto a mim, a maior limitação às start-ups portuguesas. Temos um pequeno conjunto de empresas que vingaram internacionalmente com enorme sucesso – e todas elas têm a escalabilidade do negócio em comum -, mas não podemos tomar o todo pela parte.

Como vê o DNA Cascais daqui a 5 anos?
Uma DNA mais internacional. O que referi acerca das start-ups também se aplica às incubadoras. Temos de ser mais internacionais, aprofundar e construir redes sólidas que permitam às empresas apoiadas pelas incubadoras portuguesas terem acesso facilitado à internacionalização. Se é difícil para empresas maduras e com negócios estáveis, é hercúleo para a maioria das start-ups. Lá estaremos para as acompanhar.

Respostas rápidas:

O maior risco:  Evitá-lo a todo o custo.
O maior erro: Não o admitir.
A melhor ideia:  Só saberemos depois de a realizarmos.
A maior lição:  A que nos é trazida pela experiência. Quanto mais cedo, melhor.
A maior conquista: Ter um filho. E melhor ainda, ser uma filha.

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