Entrevista/ “Fizemos 80 mil dólares em pré-vendas num único dia”

João Oliveira, cofundador da Lapa

4 mil euros de autoinvestimento e uma bem-sucedida campanha de crowdfunding bastaram para ajudar a Lapa a nascer, uma espécie de “rede social de perdidos e achados”, como define João Oliveira.

Foi a pensar no tempo e no esforço despendido na procura de objetos cujo paradeiro desconhecemos que nasceu a Lapa pela mão de um engenheiro eletrotécnico e de um engenheiro informático.

A sua primeira campanha de crowdfunding foi em 2014, a maior do género em Portugal, com 100 mil dólares (86 mil euros) angariados, valor que superaram com a segunda versão do produto, que ascendeu aos 340 mil dólares (292 mil dólares).

Uma das cinco start-ups portuguesas selecionadas para o TechMatch Global, que juntou 60 start-ups em Bratislava, a Lapa já vendeu mais de 80 mil unidades, contando com uma faturação acima do milhão de euros.

Falámos com João Oliveira, cofundador da Lapa, sobre a ideia, o percurso, os pontos altos e baixos da start-up e o que está na calha para o futuro próximo.

Um engenheiro eletrotécnico e um engenheiro informático, ambos alunos de doutoramento de engenharia informática, criaram a Lapa. Como surgiu a ideia de criar a empresa e o que vos levou a avançarem por este caminho do empreendedorismo?
A Lapa surgiu como consequência de uma necessidade, em meados de 2013. Ao procurarem objetos “perdidos”, um grupo de amigos – proveniente de áreas multidisciplinares como a Robótica, Eletrónica ou Engenharia Informática – percebeu que poderia oferecer uma solução a uma celeuma mundial. Na verdade, era um problema que nos acontecia, mas o breaking point surgiu quando nos apercebemos da dimensão do problema, que é realmente global e transversal a todas as culturas. Foi aí que surgiu a ideia de dar um toque às nossas coisas, tal e qual como fazemos com o telemóvel.

Qual o pior e o melhor momento vivido nesta senda empreendedora até hoje?
O melhor momento ocorreu durante a segunda campanha de crowdfunding, quando chegámos a fazer 80 mil dólares (cerca de 69 mil euros) em pré-vendas num único dia, para mais de mil clientes. O pior momento terá decorrido dos primeiros lotes de produção da primeira Lapa, que não garantiam os níveis de qualidade prevista, nomeadamente na qualidade dos plásticos do produto. Este obrigou-nos a tirar todos os plásticos e unidades produzidas uma a uma para garantirmos a melhor qualidade do produto.

Referem a Lapa como uma “autêntica rede social de perdidos e achados”. De que forma funciona esta rede e com que fins?
A Lapa funciona como uma rede social de perdidos e achados, na medida em que todos os utilizadores se interajudam na procura de objetos perdidos. Todos os telemóveis que correm a aplicação Lapa funcionam como sensores que detetam qualquer Lapa que se encontre no raio de alcance do smartphone, enviando a sua posição GPS para a cloud. É ainda possível notificar algum utilizador que passe perto do objeto, animal ou criança perdidos, partilhando os dados de contato do dono para que possam devolver os mesmos.

Foram uma das cinco start-ups portuguesas selecionadas para o TechMatch Global, que juntou 60 start-ups em Bratislava. Quais as lições aprendidas?
Foi um evento importante que nos permitiu partilhar experiências e entrar em contato com as melhores start-ups de diferentes países, assim como ter acesso a mentores de topo e conhecer grande investidores tecnológicos a nível global.

Recorreram ao crowdfunding. Qual o montante angariado e feedback que dão deste processo de financiamento?
Tratando-se de um produto físico, faz sentido validar o mesmo antes de o desenvolver. Portanto, o crowdfunding traz-nos não só o financiamento, mas também essa validação do mercado e dos clientes, bem como a referida validação do produto e também todo o marketing e visibilidade que lhe estão associados.

Na primeira campanha de crowdfunding, foram angariados 100 mil dólares (86 mil euros), naquela que foi, à data (2014), a maior campanha do género em Portugal. Em 2015, decidimos lançar uma segunda campanha de crowdfunding, com o intuito de desenvolver a segunda versão do nosso produto, a Lapa 2. Aí, conseguimos angariar 340 mil dólares (292 mil dólares).

Têm outros tipos de financiamento para além do crowdfunding?
Sim. Além dos 2 mil euros base de investimento pessoal dos fundadores, recebemos uma ronda de investimento seed de 350 mil euros, em 2015. Já em 2016, o Portugal 2020 atribuiu-nos três incentivos com um total de 1,3 milhões de euros para projetos de internacionalização, qualificação e investigação.

Quantas unidades venderam até hoje?
Já vendemos mais de 80 mil unidades, tendo mais 1 milhão de euros em faturação.

Em que países é comercializada a Lapa?
Atualmente já vendemos para mais de 80 países (dos Estados Unidos e Austrália, Chile, a todos os países da União Europeia, até ao Japão, apenas para citar alguns exemplos) e dispomos de 15 distribuidores mundiais para o retalho.

Em Portugal como trabalham a distribuição e fazem chegar a Lapa ao consumidor final?
Em Portugal a nossa distribuição é assegurada pela jp.di. Estamos presentes, a título de exemplo, em algumas lojas Worten, em lojas especializadas do setor tecnológico em todo o país e nas lojas CTT. O consumidor final português está, no entanto, já familiarizado com o nosso site findlapa.com, no qual pode encomendar o produto e desfrutar de campanhas exclusivas.

Como pensam inovar nos produtos que já comercializam?
Estamos focados em fazer crescer a rede Lapa, que trará valor acrescido a todos os produtos Lapa. Temos igualmente alguns novos produtos na manga, os quais não podemos, para já, revelar.

Que dicas partilha com as start-ups que estão hoje nos seus primeiros dias de vida?
Penso que Samuel Beckett tem o conselho ideal para todos nós: “Ever tried. Ever failed. No matter. Try Again. Fail again. Fail better.”

Quais os objetivos de vendas para este ano?
Este ano pretendemos vender 100 mil unidades, duplicando a faturação de 650 mil euros do ano passado. Pretendemos também consolidar a nossa rede de distribuição, com enfoque no mercado europeu.

O que vos falta realizar?
Para este ano, pretendemos levantar uma Series A de investimento, que nos permita escalar significativamente o negócio e, dessa forma, expandi-lo para a Europa.

Como vê a Lapa daqui a cinco anos?
Daqui a cinco anos esperamos ver a Lapa como uma empresa consolidada no mercado da Internet das Coisas (IoT), focada em soluções de geo-localização acessíveis a todos os consumidores, para que nunca mais se perca nada.

Respostas rápidas:
O maior risco:  Executar um produto da complexidade da Lapa sem investimento suficiente para constituir à partida uma equipa A+, que permita aos cofundadores focarem-se no desenvolvimento e escala do negócio. Trabalhar com fornecedores pouco reconhecidos que nos comprometeram a qualidade e tempos de entrega do primeiro produto Lapa.
O maior erro:  Ter começado a start-up no café, recorrendo ao trabalho exclusivo dos dois fundadores para desenvolver todo o produto e a empresa, desde o hardware ao firmware, apps Android e iOS, design de produto, website, marketing e vendas, durante 2 anos.
Fez-nos perder demasiado tempo e deixou-nos financeiramente vulneráveis à concorrência.
A melhor ideia: Recorrer ao crowdfunding para o financiamento inicial dos nossos produtos e validação dos mesmos.
A maior lição:  A maior lição advém do maior erro. A melhor solução para criar uma start-up com sucesso será começar por consolidar uma ideia, desenvolver uma prova de conceito preliminar e juntarem-se a um programa de aceleração. Esta permitirá obter a mentoria necessária e ter acesso a uma rede de investidores que permita criar uma equipa A+, que execute o desenvolvimento do produto enquanto os fundadores se deverão focar na gestão da equipa e desenvolvimento do negócio, fundamental para levantar nova ronda de investimento.
A maior conquista: Conseguir criar um produto eletrónico de consumo de raiz e fazê-lo chegar ao consumidor final, quer através da venda online quer através do retalho. Perceber o impacto que o nosso produto tem na vida das pessoas.

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