Opinião

Fábricas de líderes?

Luís Paulo Salvado, CEO da Novabase e presidente da Mesa da Assembleia-Geral do Portugal Agora

Cada vez mais organizações investem em programas ambiciosos de desenvolvimento de liderança com o objetivo de melhorar as suas práticas de gestão e, assim, alcançar melhores resultados. Os líderes têm a capacidade de potenciar o trabalho das suas equipas, sendo o seu contributo crucial para o desempenho coletivo.

Contudo, muitas destas iniciativas não atingem os resultados esperados, sendo frequentemente canceladas ou abandonadas. As razões variam de acordo com o contexto, mas é possível identificar alguns padrões nestes insucessos.

Tipicamente, estes programas começam com uma avaliação 360º de cada participante, identificando pontos fortes e oportunidades de melhoria (um eufemismo, segundo alguns, para pontos fracos). A seguir, há uma combinação de trabalho em equipa (workshops, formação, etc.) com apoio personalizado (coaching, feedback contínuo, entre outros).

Um dos erros mais comuns é a crença de que se podem trabalhar as oportunidades de melhoria de forma eficaz. A experiência mostra que mudanças palpáveis e duradouras só ocorrem em circunstâncias muito específicas, e apenas quando o indivíduo tem uma forte vontade e necessidade de mudar. Muitas vezes, esses requisitos não estão presentes, e os programas são incapazes de os criar.

Curiosamente, o mérito desta intenção pode até ser questionado. Os pontos fortes e as oportunidades de melhoria são duas faces da mesma moeda, dependendo sempre do contexto em que são aplicados. Por exemplo, o que para uns pode ser teimosia, para outros é determinação. O mesmo princípio pode ser aplicado a quase todas as nossas características (embora alguns casos sejam mais complexos de avaliar).

Seguindo este raciocínio, pode-se argumentar que trabalhar nas oportunidades de melhoria sem perceber o seu impacto sobre os pontos fortes pode ser contraproducente. Como não existem “super” pessoas, mas sim “super” equipas – compostas por uma habilidosa combinação dos pontos fortes dos seus membros – estaríamos a comprometer o mais importante: o desempenho do coletivo.

Isso leva-nos a perceber que estas questões são mais complexas do que parecem e que a melhor abordagem é trabalhar num outro nível: no desenvolvimento da consciência dos líderes. Esta maior consciência é essencial para compreender claramente cada contexto e escolher o conjunto adequado de opções e respostas para cada desafio. O líder (mais) consciente sabe que precisa dominar vários estilos de liderança – mesmo os mais básicos, alguns até associados aos tais pontos “fracos” – e que a verdadeira diferença está em saber aplicá-los conforme a situação exige.

Para quem quiser explorar mais estes temas, há uma vasta e interessantíssima literatura disponível, com autores que vão desde o psicólogo Robert Kegan, até ao conceito de “Spiral Dynamics” dos sociólogos Clare Graves, Don Beck e Christopher Cowan, passando pelo integralismo mais esotérico de Ken Wilber.

“Nós não vemos o mundo como ele é, mas como nós somos” e “Tudo o que precisamos está sempre à nossa frente a convidar-nos a crescer, temos é que descobrir porquê”, são bons aperitivos para estas leituras…

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