Europa “perdeu o barco da revolução tecnológica”, diz relatório

A Europa será vulnerável em todos os setores em termos de crescimento e competitividade, a menos que alcance outras grandes regiões em tecnologias-chave, de acordo com o último relatório da McKinsey. Portugal segue a tendência: entre 2014 e 2019, o crescimento das receitas das empresas portuguesas ficou 52% abaixo das empresas americanas, com um fraco investimento em I&D.

A Europa tem vindo a perder competitividade tecnológica para outras regiões, fazendo emergir consequências como um crescimento económico mais lento e rendimentos mais baixos. Inverter esta tendência poderá vir a gerar um benefício de entre dois a quatro biliões de euros anuais às empresas até 2040, o equivalente a 90% de todas as despesas sociais europeias atuais ou a seis vezes o investimento bruto necessário para serem atingidas as metas verdes até 2050, aponta o estudo “Securing Europe’s competitiveness: Addressing its technology gap”, do McKinsey Global Institute.

De acordo com o estudo, a Europa está a ficar para trás em oito de dez tecnologias transversais, que estão a permear praticamente todas as indústrias. É o caso da digitalização, computação quântica e inteligência artificial. Em 5G, a Europa tem fornecedores fortes, mas está atrasada na sua implementação, e deveria investir na produção das clean tech.  Estes resultados refletem “em grande parte o facto de que a Europa perdeu o barco na última revolução tecnológica, ficando para trás em valor e crescimento nas Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e outras inovações disruptivas”, pode ler-se no relatório.

À medida que a tecnologia penetra nos vários setores, determinando, cada vez mais, a dinâmica competitiva, os intervenientes europeus parecem mais vulneráveis, mesmo nos bastiões tradicionais como o setor automóvel. Entre 2014 e 2019, as grandes empresas europeias aumentaram as receitas a um ritmo 40% mais lento do que as suas congéneres nos Estados Unidos, investiram 8% menos (despesas de capital em relação ao stock de capital investido), e gastaram 40% menos em I&D do que as empresas americanas da amostra.

“A Europa encontra-se numa crise energética que se incubou durante décadas. É necessário trabalhar arduamente para não enfrentar uma situação semelhante na tecnologia, daqui a uma ou duas décadas. Felizmente, existe uma grande dinâmica entre os líderes europeus para tomar medidas decisivas, que se devem estender da energia às capacidades tecnológicas”, afirma Sven Smit, presidente do McKinsey Global Institute, citado em comunicado enviado às redações.

As tecnologias de informação e comunicação (TIC) e o setor farmacêutico são responsáveis por mais de 90% da lacuna na rentabilidade dos capitais próprios, por mais de 60% da lacuna de crescimento e por mais de 70% lacuna no investimento em I&D. Se não for resolvida, esta crise irá prejudicar a Europa em muitas dimensões, incluindo o crescimento, inclusão e sustentabilidade, e a sua autonomia estratégica e voz no mundo, aponta o reslatório.

Neste cenário, Portugal segue a tendência da Europa, com uma maior aposta na sustentabilidade e na inclusão, mas registando um pior desempenho nas métricas referentes ao investimento, crescimento e prosperidade. O nosso país ocupa uma posição favorável no que respeita à métrica que valia as emissões de CO2 per capita, que são muito inferiores à média dos países da Europa-30 considerados no estudo, China e Estados Unidos.

Também no consumo de energia fóssil, Portugal encontra-se no bom caminho ao lado da Europa, enquanto os Estados Unidos apresentam uma maior dependência destes combustíveis. Já no tema da inclusão, que abrange o índice de Gini (desigualdade de rendimento), índice de pobreza, mobilidade social e esperança média de vida, Portugal surge atrás da Europa, ficando para o fim no índice de felicidade.

O estudo desenvolvido mostra ainda que as grandes empresas portuguesas estão atrasadas face às suas congéneres americanas e mesmo europeias. Entre 2014 e 2019, Portugal investiu menos 20% face aos Estados Unidos da América, obtendo um Retorno Sobre o Capital Investido (ROIC) 56% inferior ao americano. O crescimento das receitas ficou 52% abaixo das empresas americanas, com um fraco investimento em I&D.

“Os CEO estão atualmente preocupados com o desafio dos preços da energia em alta, e com o facto de os seus concorrentes tecnológicos de maior escala os estarem a ultrapassar”, afirma Duarte Braga, Sócio sénior e colíder global da Prática de Green Business Building na McKinsey, reforçando que “a Europa, e também Portugal, têm muitos pontos fortes sobre os quais podem construir e, embora não possam aspirar à liderança em todas as tecnologias de ponta, devem manter a confiança necessária para aspirar à liderança em algumas delas”.

O McKinsey Global Institute aponta algumas ideias para os decisores públicos que poderiam ajudar neste sentido. Uma delas seria passar para as aquisições conjuntas em áreas relacionadas com a inovação, a defesa e os cuidados de saúde. “Hoje em dia, a Europa reúne apenas 0,2% do total das suas aquisições públicas a nível europeu, em comparação com 45% a nível federal dos EUA. Além disso, poderia desenvolver um livro de regras comuns às empresas europeias ou 28.ª entidade reguladora, que permita às empresas de elevado crescimento operar sem problemas à escala continental. Poderia ainda considerar o desenvolvimento de processos acelerados de aprovação e de tomada de decisão, como aconteceu no caso da aprovação da vacina do Covid-19”, refere.

“Os líderes empresariais também podem apoiar, assumindo mais riscos e aumentando a competitividade, por exemplo, estabelecendo objetivos de longo prazo, ajustando incentivos e alavancando programas de fusões e aquisições e alianças para construir escala e capacidade”, sugere ainda o McKinsey Global Institute.

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