Opinião
Educar para a Paz
No meu trabalho com jovens sou diariamente confrontada com algumas questões e realidades que nem sempre são fáceis de endereçar.
Após dois anos de pandemia, vemo-nos a braços com uma Guerra que tem o potencial de mobilizar o mundo. Para eles, e para grande parte de nós, a Guerra era algo que se falava nas aulas de História ou nas notícias sobre lugares, mais ou menos, desconhecidos, e que estava muito longe da vida como a conhecemos hoje.
Relembro os meus 15 anos com alegria e nostalgia, onde as conversas se tinham frente a frente e onde a televisão ocupava apenas um pouco do nosso tempo. As férias eram passadas na praia, onde as conversas pareciam nunca acabar. Se queríamos saber de alguém, tínhamos que garantir que nos encontrávamos, dado não existirem telemóveis e, muito menos, redes sociais.
Ao falar com adolescentes que têm hoje 15 anos, sinto-os mais preocupados e apreensivos. Aquela leveza da adolescência foi posta em causa. Estão assustados e, se o facto de terem de tomar decisões que impactam no seu futuro, já era um processo complexo, tudo se complicou ainda mais. Neste momento, a questão material começa a ter um peso maior do que teve em gerações anteriores. Muitos deles viram a pandemia tirar-lhes vidas confortáveis, ao mesmo tempo que lhes tirava a liberdade.
Com tudo isto a saúde mental deteriora-se. O estudo “Os jovens em Portugal, hoje: quem são, o que pensam e o que sentem”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, publicado em novembro passado, dava conta que 23% dos jovens já tiveram pensamentos ou atos suicidas e 26% toma ou já tomou antidepressivos.
Entre um mundo exterior que continua a enviar sinais de que tudo pode mudar quando menos se espera, e um mundo interior que se baralha, como podem os nossos filhos perceber quais vão ser as competências mais relevantes no futuro?
E sim, é verdade. Esta geração é bastante diferente da anterior. Talvez sejam menos idealistas e mais pragmáticos. Talvez mais conscientes do impacto das suas escolhas e comportamentos. Talvez com maior necessidade de desenvolverem espírito crítico para conseguirem distinguir o verdadeiro do falso.
E é exatamente nesta linha que, quando trabalho com os jovens, os inspiro a desenvolverem competências pessoais, que serão úteis quer sejam eles médicos, cientistas, gestores ou engenheiros.
E se há algo que podemos fazer verdadeiramente pelos nossos filhos é estimulá-los a desenvolverem as suas competências pessoais.
Neste momento, não nos faltam oportunidades para desenvolvermos a empatia. De uma forma ou de outra, muitos de nós convivemos, ou conhecemos, ucranianos que necessitam da nossa ajuda. E não só da nossa ajuda monetária. Muitos deles necessitam apenas de um ombro amigo onde possam chorar.
Devemos também estimulá-los a desenvolverem o sentido crítico. Não acreditarem em tudo o que ouvem e veem. Verificarem as fontes, ouvirem, lerem ou verem notícias em mais do que um sítio.
Serem flexíveis e resilientes, desenvolverem a capacidade de se adaptar à mudança e não perderem as diferentes oportunidades que lhes surgem, para aprender. Eu diria que esta é uma competência que acabou por lhes ser imposta durante a pandemia, mas que deve continuar a ser cultivada.
Manterem-se curiosos e criativos. É importante que os incentivemos a conhecer a História sob um ponto de vista mais pragmático, que vai muito para além de decorar datas ou dinastias. Explicar-lhes como é que a tecnologia pode ser utilizada para o bem, mas também clarificar as consequências devastadoras do uso da tecnologia com vista à destruição de valores como a liberdade, a democracia e a paz.
Na realidade, hoje como nunca e pelas piores razões, o mundo parece oferecer-nos uma oportunidade única de educarmos os nossos filhos como seres mais completos. Que tenham a capacidade de ver para além do óbvio, e que aprendam a minimizar os seus pequenos dramas. Que consigam ser melhores seres humanos e possam contribuir para um mundo mais feliz.