Opinião

Numa altura em que uns choram e outros celebram a saída de Ruben Amorim para um novo clube, a verdade é que não só ele parece não ser indiferente a ninguém, como todos lhe reconhecem valor. O que o distingue e que ensinamentos podemos trazer para a liderança de equipas na nossa vida pessoal e profissional?

Estou à vontade para escrever este texto uma vez que não sou adepto do clube que o Ruben Amorim acaba de deixar (e tão melhor do que quando chegou). E não, este não é um texto sobre futebol, sobre clubes ou sobre desporto, mas sim sobre liderança e sobre equipas (e exploro este exemplo não porque seja único, mas acima de tudo porque é muito atual). Se tantas vezes criticamos o futebol e a forma como muitas vezes é vivido e conduzido, também devemos ter a presença de espírito para admirar os bons exemplos (se calhar poucos) que vão surgindo, e extrair ensinamentos para outras realidades onde os objetos, as circunstâncias e os skills técnicos são diferentes, mas as competências de liderança, gestão de pessoas e de equipas são bastante transversais.

De forma muito simplificada, e também para dar contexto a quem possa não o ter tão presente, falamos de um ex-jogador, agora treinador, adepto do clube rival, com pouca experiência, que pegou numa equipa que pouco tinha ganho nas últimas duas décadas, e que em poucos anos não só ganhou títulos, mas acima de tudo trouxe os adeptos de volta ao estádio, criou uma equipa competitiva a nível nacional e internacional, lançou novos talentos e elevou o clube para um patamar superior ao que tinha. E que agora vai para um dos maiores clubes do mundo.

Alguma sorte? Também eventualmente, mas a sorte dá muito trabalho. Bom treinador? Parece-me que ninguém tem dúvidas. Mas acima de tudo excelente líder de pessoas. Que ensinamentos podemos trazer para a liderança de equipas na nossa vida pessoal e profissional?

. Filosofia e visão clara – nem sempre certo, nem sempre errado, mas sempre com uma filosofia e uma visão clara, não oscilante. Foi assim que Ruben Amorim sempre se apresentou. Um dos principais papeis de um líder é indicar o caminho às suas equipas, é ter uma visão clara de “para onde queremos ir” e “por onde devemos ir”, e saber explicá-lo de forma simples e clara, de modo a alinhar todos em volta dos mesmos objetivos, prioridades e formas de trabalhar. Em particular nas empresas isso parece-me fundamental, tanto a um nível macro como ao nível de cada equipa.

. Confiança e otimismo – a já amplamente repetida frase “e se corre bem?” (quando lhe perguntaram se as coisas não podiam correr mal), que acabou por marcar também o seu trajeto, é representativa de um traço de personalidade que me parece fundamental para um líder (e já agora para qualquer bom profissional, ou para qualquer desafio pessoal). Ao olharmos sempre para o copo meio cheio em vez de olharmos para o copo meio vazio, estamos imediatamente mais próximos e predispostos a encarar os desafios de forma positiva, a procurar soluções em vez de problemas. Esse é o tipo de liderança e o tipo de líderes que as equipas gostam de seguir, que inspira confiança, que lhes dá moral mesmo nos momentos mais difíceis, e que as faz acreditar mesmo quando as coisas não correm bem.

. Comunicação clara e transparente – Se há coisa que podemos destacar no Ruben Amorim, é a sua comunicação clara e transparente (por vezes até demasiado transparente, o que não deixa de ser “refrescante”). Na liderança, muitas vezes (diria até quase sempre) mais do que o que se diz ou a mensagem que se transmite, o que realmente faz diferença é a forma como o fazemos. Seja em fóruns mais alargados ou em conversas de um para um, seja numa apresentação formal ou numa sessão de feedback, comunicar de forma clara e transparente é fundamental para alinhar equipas, para gerir expectativas, para motivar e desenvolver colaboradores, para passar ideias e para construir relacionamentos sólidos e duradouros – tanto na vida profissional como pessoal. Tal como diz a frase do Simon Sinek, “A liderança é uma forma de pensar, uma forma de agir, mas acima de tudo uma forma de comunicar”.

. Desenvolvimento e valorização de talento – também aqui o Ruben Amorim acabou por se destacar ao recuperar alguns jogadores que não estavam a atingir o seu potencial, ao identificar novo talento e não ter medo de o “explorar” e “lançar”, ao trabalhar no desenvolvimento da sua equipa. Nas organizações essa valorização de talentos é igualmente vital. Investir no desenvolvimento dos colaboradores – através de formação, mentoria ou projetos desafiantes – não só aumenta a sua motivação, como também melhora os resultados a longo prazo. Além disso, promover um ambiente meritocrático em que o talento seja reconhecido e recompensado gera uma cultura de excelência. A capacidade de saber maximizar as virtudes e trabalhar as áreas de desenvolvimento é uma das principais características que distinguem um bom de um mau líder. E um ótimo líder é aquele que desenvolve novos líderes. No final do dia, “[…] quando se é um líder, o sucesso passa a ser o desenvolvimento e o crescimento dos outros” (Jack Welch).

. Espírito de equipa – o coletivo acima do individual, onde todos se sentem parte integrante do sucesso (os que jogam mais, e os que jogam menos). Nas empresas, cultivar o espírito de equipa é fundamental para criar um ambiente de colaboração. Líderes que promovem a cooperação e celebram as conquistas em conjunto conseguem construir equipas mais resilientes e dedicadas, mais preparadas para enfrentar desafios e mais predispostas a ajudarem-se entre si e aos outros.

. Resiliência e adaptabilidade – tal como aconteceu e acontece no futebol, os maus momentos aparecem (e apareceram ao Ruben Amorim e à equipa). A forma como se lida com esses momentos adversos é o que distingue os bons líderes. Também no mundo corporativo, as crises são inevitáveis. Um bom líder precisa de encarar estas situações como oportunidades para aprender, crescer e inovar. A resiliência para enfrentar desafios e a criatividade para se adaptar às mudanças são competências indispensáveis para quem deseja liderar com sucesso.

. Empatia e ambiente/cultura positiva – por fim, Ruben Amorim teve sempre uma capacidade acima da média de criar empatia e gerir relações com diferentes stakeholders – jogadores, adeptos, imprensa e direção – mantendo sempre um ambiente e uma cultura positiva, mesmo em situações de pressão. Nas empresas (e já agora a nível pessoal), esta habilidade é igualmente fundamental. “Criar pontes” e manter uma relação saudável com as diferentes equipas e stakeholders (colaboradores, clientes, parceiros, etc), não só garante confiança e continuidade, como cria um ambiente e uma cultura positiva que fortalece laços e alianças, aumenta a satisfação de todos os envolvidos e maximiza o trabalho conjunto.

Um survey feito pelo Linkedin nos Estados Unidos (e há outros estudos com o mesmo resultado) indica que 7 em 10 pessoas se despediriam por causa de um mau chefe/líder. Numa altura em que precisamos tanto de bons líderes, olharmos para bons exemplos (como o Ruben Amorim) – mesmo que de diferentes esferas da sociedade – e trazermos alguns dos ensinamentos para as nossas vidas profissionais e pessoais, à partida mal não correrá. Aliás, “e se corre bem”?

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Tomás Loureiro

Tomás Loureiro

Tomás Loureiro é Director of Global Intel & Strategic Projects na EDP. Anteriormente, ocupou o cargo de Head of Innovation Intel, sendo responsável por apoiar o CEO da EDP Inovação na definição da estratégia global de inovação e das apostas futuras do Grupo EDP. Também foi Chief of Staff to CEO / Advisor do Board no Grupo Media Capital, responsável por acelerar a implementação da visão estratégica e transformação do grupo, acompanhando também os temas ligados à inovação e customer... Ler Mais..

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