Opinião

Discriminação profissional: combater o estereótipo dos 50+

Duarte Fernandes, cofundador e COO da KWAN*

Encontrar o talento certo para os projetos das organizações é um desafio crescente e o envelhecimento das populações ocidentais só o torna ainda mais complexo.

Se, por um lado, é verdade que a inteligência artificial está cada vez mais perto de assumir um conjunto de funções que permitirão contratações mais específicas e em menor volume, estamos ainda distantes de assistir ao real solucionar do problema de crescente falta de mão de obra, transversal à maioria dos setores. O mercado de trabalho é competitivo e as organizações procuram profissionais que, além de terem os conhecimentos e motivação, sejam inovadores e capazes de se adaptar a um ambiente de trabalho dinâmico.

Num mercado de trabalho onde os melhores talentos são um bem escasso, o profissionalismo e a experiência de alguém com mais de 20 anos podem ser uma lufada de ar fresco. Mas a verdade é que se assiste a alguma pressão para que a escolha recaia sobre candidatos mais jovens, com ideias frescas e novas perspetivas.

Perante dois candidatos igualmente válidos para uma determinada função, qual seria a sua escolha? Adaptabilidade e ideias inovadoras vs. experiência e capacidade de resolução de problemas? Jogar pelo seguro ou arriscar-se e lutar por aquilo em que acredita? A sua resposta tem o potencial de moldar não só o futuro do seu departamento, mas também a trajetória de toda a empresa. Vai optar por valorizar a experiência e a diversidade ou vai ceder à pressão e optar pela perceção de “segurança” de manter o status quo? No final de contas, a escolha é sua, e as consequências são significativas.

Enquanto profissional com menos de 40 anos e mais de 10 anos de estabilidade na minha atual empresa, não senti na pele os desafios de um profissional com mais de 50 anos a procurar emprego. Porém, por lidar constantemente com desafios relacionados com gestão de pessoas e a sua contratação – ainda recentemente estivemos a ajustar o plano de contratações do próximo quarter – senti-me inclinado a explorar este tópico na perspetiva de um empregador. É um tema que tem ocupado os meus pensamentos e já o debati em inúmeras ocasiões.

O primeiro pensamento que tenho quando abordo este tema é o crescente envelhecimento e o aumento da esperança de vida das populações ocidentais. Vivemos mais e com maior qualidade. Trata-se de uma tendência positiva, que traz muitos benefícios aos indivíduos, às famílias e às sociedades no seu todo, pelo que as pessoas estão a trabalhar até mais tarde na vida e a adiar a reforma, o que resulta numa nova vaga de profissionais mais velhos que entram e permanecem no mercado de trabalho por mais tempo.

De acordo com o Bureau of Labor Statistics dos EUA, até 2026, projeta-se que 30,2% da mão de obra disponível será composta por trabalhadores com idades entre 65 e 74 anos, e 10,8% dos trabalhadores terão 75 anos ou mais. No entanto, mesmo com esta demografia crescente, ainda há milhões de postos de trabalho por preencher. De acordo com o Statista, em novembro de 2022 abriram mais de 10 milhões de vagas de emprego nos Estados Unidos. A combinação destes factos representa uma oportunidade única para os adultos seniores, que têm experiência e competências valiosas para as organizações.

Quer pretendam enveredar por uma nova carreira ou continuar a trabalhar na mesma área, os trabalhadores com mais idade têm muito para oferecer ao mercado de trabalho, podendo trazer perspetivas únicas às empresas. Além disso, os trabalhadores seniores têm por norma uma forte ética de trabalho, são fiáveis e têm um historial comprovado de obtenção de resultados. Com estes dados parece tornar-se óbvio que as empresas deveriam contratar mais seniores para suprir estas vagas difíceis de preencher, certo?

A verdade é que não é assim tão simples. Apesar de se saber que as pessoas mais velhas trazem experiência, conhecimentos e estabilidade ao mercado de trabalho, muitos profissionais com mais de 50 anos são discriminados por causa da idade na sua procura de emprego.

Um estudo recente da União Europeia concluiu que apenas um em cada três trabalhadores com mais de 50 anos se sente valorizado, e um em cada quatro já foi vítima de discriminação por causa da idade no local de trabalho. De acordo com um relatório da AARP, quase dois terços dos trabalhadores mais velhos enfrentaram discriminação etária nas suas carreiras, com muitos a sentirem a necessidade de esconder a sua idade ou depreciar os seus anos de experiência. Este tipo de discriminação pode assumir muitas formas, desde preconceitos subtis durante a entrevista até ações evidentes, como limitar as oportunidades para os trabalhadores seniores progredirem nas suas carreiras. Estas atitudes negativas e preconceitos podem não só prejudicar os profissionais que enfrentam discriminação, mas também as empresas e organizações que estão a perder os potenciais contributos de uma mão de obra que é talentosa quanto dedicada.

A discriminação etária no processo de contratação pode não só privar as empresas de talentos valiosos, mas também prejudicar a reputação da empresa e a ética percebida pelo público. Não é difícil imaginar as consequências: a longo prazo, compromete o sucesso da organização, como vemos na tendência crescente da “cancel culture”. Falhar na identificação e erradicação destes preconceitos pode criar uma perceção pública negativa e colocar a empresa em risco.

Os profissionais altamente experientes contam com muitos anos de trabalho nas suas áreas e têm um conhecimento profundo da indústria. Além disso, muitos têm uma rede de contactos e relacionamentos construída ao longo dos anos com clientes, fornecedores e outros stakeholders.

Os dados de 2022 do Bureau of Labor Statistics dos EUA também destacam uma diferença acentuada entre trabalhadores mais velhos e mais jovens, no que respeita a compromisso e credibilidade. Estes dados sugerem que os trabalhadores mais seniores tendem a ser mais comprometidos com o seu empregador atual, com 53% dos trabalhadores com idades compreendidas entre os 60 e os 64 anos a terem permanecido pelo menos 10 anos na mesma empresa, em comparação com apenas 9% dos trabalhadores com idades compreendidas entre os 30 e os 34 anos. Assim, há potencial para melhorar a retenção de colaboradores e diminuir os custos de rotatividade, o que pode ter um impacto positivo nos resultados de uma empresa. A sua resiliência e adaptabilidade, forjadas ao longo de anos de superação de desafios nas suas carreiras, permite-lhes lidar com situações difíceis e tomar decisões acertadas, contribuindo, em última análise, para melhores resultados para a organização.

Estes são motivos que mostram ser premente a necessidade de as organizações criarem uma cultura empresarial positiva que valorize e saiba capitalizar as competências dos profissionais 50+. Contratar e valorizar estes profissionais pode ajudar as empresas a criar uma mão de obra dinâmica e intergeracional, que beneficiará tanto os colaboradores como a organização no seu todo. Enquanto leitor, tem a oportunidade única de refletir sobre as suas crenças e valores, e de decidir que tipo de líder quer ser. Qualquer que seja a sua decisão, terá consequências, mas também terá o poder de trazer mudanças positivas e impulsionar o sucesso.

 

* KWAN é uma empresa especializada em outsourcing e nearshoring de perfis tecnológicos.

Nota: Texto escrito ao abrigo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 em vigor desde 2009.

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