Opinião
Corporate procura start-up para relacionamento sério
Ao longo de décadas, a dimensão, a estrutura ou a escala funcionaram como barreiras protetoras das grandes empresas. O mercado e os concorrentes eram conhecidos e as mudanças, por lentas, facilmente antecipáveis.
Mas os ventos que sopravam de feição aos incumbentes e às inovações de longa data, mudaram. A transformação digital a que assistimos derrubou as barreiras da estrutura e da escala, democratizou o acesso aos mercados e abalou os tradicionais equilíbrios de poder.
Qualquer start-up pode ambicionar nascer global e desafiar uma grande empresa – ou ameaçar uma indústria –, forçando-a a sair da sua zona de conforto e a competir, de igual para igual, com os seus novos, ágeis, focados e inovadores challengers.
A primeira reação passa normalmente por promover uma cultura de inovação interna. Iniciativa meritória, mas de sucesso limitado. A organização é dominada pelas unidades de negócio, focadas no seu “pão com manteiga”, nos seus clientes, produtos e serviços de sempre, na pressão dos resultados. Qualquer inovação, a existir, tende a ser meramente incremental.
O desafio não é tanto cultural, antes dirigido à própria organização. Na era digital, competir com uma start-up exige pensar, inovar e agir como uma start-up. E se uma grande estrutura não está preparada para isso, então a solução poderá passar pela criação de uma nova estrutura dentro da estrutura: por criar uma start-up dentro da empresa.
Como bem refere Trevor Owens, no seu The Lean Enterprise, a inovação associada ao empreendedorismo, até há pouco tempo considerada como fruto de arte e talento, está a tornar-se numa ciência, possibilitando às empresas a criação de estruturas que inovem não por sorte ou acaso, mas de forma planeada.
A repetida experimentação é a base desta inovação.Tal como um mantra, envolve o bom conhecimento do mercado e das suas tendências, a identificação do problema sentido pelo cliente, a construção mínima de uma solução para testar, o estabelecimento de critérios e métricas de sucesso, a validação do produto no mercado com clientes potenciais, a análise dos resultados e das variáveis críticas dessa interação e a decisão de continuar a desenvolver o projeto ou de recomeçar todo este processo.
Mas, tão importante como o método, é dotar a nova estrutura de condições semelhantes àquelas em que florescem as verdadeiras start-ups. Desde logo, a autonomia na atuação (dentro de um âmbito previamente definido e garantindo o acesso às outras áreas da empresa), nas instalações físicas e uma identidade própria; depois, equipas pequenas, multidisciplinares e empreendedoras, ágeis e flexíveis; por último, escassez de capital, tempo e recursos, para manter o foco e a pressão na obtenção de resultados.
Por isso, substituímos a habitual proposta deste espaço, por um “do-or-die”. Ou o universo empresarial se articula com as start-ups ou aprende a inovar com elas. O presente (ainda) pode passar pela inovação incremental e sustentada. Mas o futuro – ou a falta dele – assenta numa permanente inovação disruptiva, “customer-driven” e focada no lançamento de novos negócios. O risco do “do” parece compensar a inércia que conduz ao “die”.
Carlos Sá Carneiro é consultor de empresas, professor convidado da Porto Business School e Advisor da United Nations University – Operating Unit on Policy-Driven Electronic Governance. Foi, nos últimos dois anos, diretor de New Business da PT/Altice, tendo a seu cargo os departamentos de desenvolvimento de novos negócios, de smart cities e de empreendedorismo e start-ups. Nesse âmbito, foi responsável pelo lançamento do programa ENTER e da incubadora de empresas do Grupo.Estudou Direito, área em que se licenciou e na qual concluiu a parte curricular do doutoramento. Completou o Programa Avançado de Gestão da Porto Business School e possui pós-graduações em Direito Fiscal e em Contratos em Especial. Ao longo da sua vida profissional, foi fundador da Uppertech Consulting, assessor do Primeiro-Ministro (2011-2015), sócio da Cruz Bernardino, Sá Carneiro e Associados e da Gil Moreira dos Santos, Caldeira, Cernadas e Associados – Sociedade de Advogados, consultor da Aderta (Madrid), co-director executivo da pós-graduação em Fiscalidade da UIFF/PwC e administrador da Antab, S.A. Complementarmente, participou e participa, como organizador e/ou orador, em conferências e congressos nas áreas da transformação digital, empreendedorismo e e-Gov.
*Equipa de Coordenação – Plataforma Portugal Agora