Opinião

Ciclo de vida organizacional. Parte I-Envelhecimento

Carlos Rocha, administrador do Banco de Cabo Verde

As organizações, fazendo uma analogia com o corpo humano, nascem, desenvolvem-se, sofrem crises ou doenças, e muitas acabam por morrer. Podemos, então, falar no ciclo de vida das organizações, ou seja, as empresas morrem. A última e a mais conhecida for o centenária Thomas Cook UK.

Segundo um estudo da consultora INNOSIGHT de 2018, a longevidade das maiores empresas do índice S&P 500 tem decrescido constantemente, passando, em termos médios, de 33 anos, em 1964, para 24, em 2016, e projeta-se que seja de 12 anos em 2027. Mas dessa “morte prematura” de grandes organizações, falaremos numa próxima oportunidade.

Por agora, podemos discorrer sobre o envelhecimento das organizações, um processo que nem sempre é a causa da morte das empresas. A morte de grandes organizações, nestas ultimas três décadas, tem sido provocada, maioritariamente, pelas alterações que tecnologia provoca no seu modelo de negócios e nas preferências dos consumidores.

Envelhecimento nos seres humanos, segundo a definição, é um processo de desgaste do corpo (ou das células), depois de atingida a idade adulta. Nas organizações o processo pode estar relacionado com a incapacidade de perceber o ambiente interno e externo (tecnologia) de modo a se desenvolver políticas, estratégias e procedimentos que permitem à organização adaptar-se, sobreviver e crescer.

Doenças organizacionais

Antes de mais, pedimos desculpas por utilizar essa analogia com graves doenças humanas, mas no fundo, queremos chamar a atenção, também, para as doenças que afetam a todos, mas cuja incidência pode ser amenizada com estilo de vida saudável.

A doença organizacional pode trazer envelhecimento organizacional ou vice-versa. Uma organização doente apresenta um quadro de diagnóstico organizacional em que os sistemas internos (procedimentos, tecnologia, regulamentos, sistema decisórios, valores, recursos) não permitem à organização uma reação atempada às alterações que se verificam no ambiente externo, que pode ser provocada por diversos fatores.

Podemos enumerar algumas doenças organizacionais que se assemelham às doenças do corpo humano;

  • Acidente “vascular” departamental (AVD) – infelizmente, segundo a OMS, o AVC foi a segunda causa de morte das pessoas no mundo em 2016. Chamamos a atenção para comportamentos mais saudáveis que, segundo especialistas, podem reduzir as incidências dessa doença. Também nas organizações ocorrem uma espécie chamada de AVD em que um serviço, unidade, líder ou colaborar que se acha mais importante que outros que é capaz de bloquear o fluxo de informações, de decisões e de comunicação na organização. Nestes casos, qualquer processo que chegue a este serviço é bloqueado, sob vários pretextos, e a organização não consegue responder às demandas. Há uma espécie de asfixia no fluxo normal de funcionamento da organização. Pode ocorrer também que os sistemas de informação e decisão estejam desatualizados face à concorrência, o que impede respostas atempadas.
  • Demência organizacional: graças aos avanços da medicina, a longevidade humana tem aumentado consideravelmente. Ainda segundo a OMS, a doença de Alzheimer e outras demências faziam parte das cinco patologias que mais mataram em 2016. É caracterizada por diminuição da função cognitiva que pode influenciar a memória, orientação, raciocínio, concentração e aprendizagem. Mais uma vez, um completo estilo de vida saudável ajuda a reduzir as probabilidades da doença. Nas organizações também se verifica uma espécie de demência quanto temos lideranças desorientadas, com uma qualidade de gestão não muito boa, que toma decisões ao sabor de alianças táticas de curto prazo, não possui visão de longo prazo e não tem uma linha de orientação. Essa liderança não tem responsabilidade e toma decisões infantilizadas e, por isso, quase inimputável. Por isso os stakeholders devem fazer um monitoramento adequado dos gestores que de alguma forma escolherem para as suas organizações.
  • Perda de agilidade – a vida sedentária que a maior parte das pessoas leva, sentada numa cadeira de escritório ou num sofá da sala, sem prática do exercício físico, pode acelerar uma perda de agilidade. Mais uma vez um estilo de vida saudável e com prática de exercício físico ajudam no combate da patologia. Nas organizações também se verifica uma perda de agilidade às demandas do mercado quando os procedimentos e as burocracias amarram as decisões que deveriam ser tomadas tempestivamente. Esta falta de agilidade pode acontecer a todos os níveis hierárquicos da organização, e pode ser sequela de um AVD em que os processos ficam parados. Ao nível da liderança, uma perda de agilidade gera uma incapacidade de definir estratégias capazes de colocar a organização numa posição de vantagem face à concorrência.
  • Doenças autoimunes – Uma doença autoimune é qualquer condição que tenha origem numa reação imunitária anormal em que o corpo ataca uma parte normal do seu próprio organismo. Nas organizações, não é raro ver esta patologia, quando uma parte da organização, seja ela um departamento, um serviço, líder ou colaborador começa a atacar profissional e pessoalmente os seus colegas a ponto de os querer destruir. As causas podem ser várias, quer por inveja, quer por concorrência interna ou para ter melhor desempenho à custa do outro. Nestes casos, essa patologia leva a que a própria organização deixe de reconhecer quem é o adversário ou concorrente, ou seja os colaboradores esquecem que o adversário que deve ser combatido, está lá fora, seja ele um concorrente, um novo serviço ou produto. Esquecem que devem unir os esforços e em torno do objetivo organizacional.

E como está a saúde da sua organização? É capaz de detetar alguma dessas patologias?

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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