Opinião

Ansiedade financeira – uma questão de recursos

Belén de Vicente e Regina Afonso, da Stuward Health*

Quem é que nos últimos meses não se cruzou com artigos relacionados com a ansiedade financeira?

No atual contexto económico-social, este é um tema fraturante. Têm sido publicados inúmeros artigos sobre o tema dirigidos ao indivíduo abordando o conceito, os seus sintomas, dicas para combatê-la, etc… Contudo, é relevante analisar a questão do ponto de vista dos gestores e das organizações. Porque têm as organizações que se preocupar com a ansiedade financeira dos seus colaboradores?

É um facto que a perda de produtividade dos colaboradores é baseada entre outros, no absentismo e no presentismo (perda de produtividade que ocorre quando os colaboradores vão para o seu local de trabalho, mas funcionam abaixo das suas capacidades devido a doença física ou mental – adaptado de Johns, 2010).
O primeiro é fácil de medir, o segundo bastante mais difícil. É, assim, mandatório inferir e compreender os motivos subjacentes, que nem sempre são de fácil perceção quer pelos próprios quer pela organização.

Sendo a ansiedade e o stresse dois dos problemas de Saúde Psicológica mais comuns em Portugal (dois em cinco trabalhadores, superior à média da União Europeia 27%) e, face à crise socioeconómica que atravessamos e respetiva instabilidade financeira, muitos poderão ser os fatores precipitantes dos mesmos, sendo a angústia financeira um deles – gerador de por exemplo ansiedade financeira – o medo de perder o seu emprego; a diminuição ou perda da sua remuneração; alterações contratuais; o medo do “desconhecido”; etc… que poderão levar a situações futuras de incumprimento de compromissos vitais para o seu bem-estar bem como para o de toda a família.

O termo “bem-estar financeiro” é utilizado para descrever o estado financeiro atual percecionado pelo próprio. Inclui, principalmente, a capacidade para controlar as finanças no dia a dia e mensalmente, o nível de stresse financeiro a que está submetido, o nível de endividamento e a capacidade para absorver um imprevisto financeiro.

É, para nós, consensual que na nossa cultura os colaboradores não se sentem confortáveis na partilha desta informação com a sua organização. Um estudo recente da Mercer (com dados dos Estados Unidos) corrobora esta ideia, os colaboradores não querem a empresa diretamente envolvida nas suas finanças. Como pode, então, a organização agir se não sabe quem precisa de ajuda e do que precisa?

Esta questão já se colocou noutros âmbitos como no da saúde mental e, a resposta foi simples – a organização deve disponibilizar os recursos necessários para que quem precise os possa utilizar quando necessitar ou quiser. E também, à semelhança dos projetos de saúde mental que temos vindo a realizar nas organizações nos últimos anos, a empresa não tem de saber que colaboradores utilizam os recursos, com que frequência e nem os motivos subjacentes. É um benefício que é facultado de forma livre e segura. E, funciona!

Assim, as organizações podem disponibilizar dois tipos de recursos para ajudar a combater a ansiedade financeira dos seus colaboradores.

Em primeiro lugar, proporcionar informação sobre o tema, de fonte credível, de acesso fácil e em formato atrativo. Sabendo que a literacia financeira dos portugueses está em último lugar, entre os 19 países da zona euro, segundo o ranking de 2020 do Banco Central Europeu (BCE), esta ação seria bastante relevante em geral e não apenas para quem sofre de ansiedade financeira.

Em segundo lugar, consultoria e assessoria sobre finanças pessoais através do acesso a um especialista externo que possa ser consultado pelo colaborador para o seu caso específico. Os colaboradores poderão, desta forma, aceder a este recurso por recomendação e encaminhamento do psicólogo afeto à organização que diagnosticou o motivo da ansiedade ou diretamente através de uma plataforma que garanta a confidencialidade na marcação e respetivo aconselhamento.

Os psicólogos que fazem um trabalho robusto e sustentável em prol da saúde psicológica dos colaboradores, trabalham com base na promoção, prevenção e intervenção. Se acrescentarmos as ferramentas necessárias, os indicadores adequados e as equipas multidisciplinares de suporte, as organizações podem trabalhar com sucesso este tema da ansiedade financeira.

Após confirmação do diagnóstico de ansiedade e tendo esta por base preocupações de índole económico-financeira, pode o psicólogo, juntamente com um técnico especializado em literacia financeira, agilizar um plano de intervenção para o colaborador, no sentido de diminuir os níveis de ansiedade e dotar o mesmo de informação e de estratégias concretas para que consiga compreender e promover alterações nos seus comportamentos, tais como por exemplo gestão do orçamento pessoal (rendimento, despesas, endividamento e poupança).

Conclusão
Em suma, e segundo o mais recente relatório de Prosperidade e Sustentabilidade das Organizações, da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), promover a saúde psicológica e o bem-estar dos colaboradores e das organizações passará por envolver, cada vez mais, psicólogos e, na nossa opinião, outros técnicos de suporte, em áreas especializadas, que de forma alinhada e integrada suportem e guiem os colaboradores. Segundo a OPP, investigações sobre intervenções “custo efetivas”, que promovam a saúde psicológica no trabalho, sugerem um retorno do investimento de mais de 9€ por cada 1€ investido. A refletir!

*Belén de Vicente, CEO da Medical Port e fundadora da Stuward Health, e Regina Afonso, psicóloga na Stuward Health

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Belén de Vicente

Belén de Vicente

Belén de Vicente é fundadora e diretora geral da Medical Port, a porta de entrada para cuidados médicos em Portugal, para quem vem de outros países. É também fundadora da Stuward Health. Foi diretora do MBA Lisbon, contando com mais de 20 anos de experiência em consultoria de gestão na Península Ibérica e na gestão de parcerias internacionais nos setores do Ensino Superior e da Saúde. É apaixonada por projetos desafiantes que envolvam transformações com pessoas e para pessoas.

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