Opinião
A minha jornada de uma década rumo ao empoderamento criativo
Numa indústria frequentemente dominada por grandes empresas onde o mainstream é rei e as formas convencionais de pensar ditam o caminho, nasceu o THU. Não foi criado para se misturar com as massas, embora soubéssemos que essa seria a maneira mais fácil de alcançar o sucesso.
Conhecemos as regras e sabemos como a indústria funciona. Por que não tentar encaixar? Simples: porque esse não é o nosso propósito e porque reconhecemos uma lacuna que queríamos preencher. Esta é uma indústria altamente segmentada, sem um espaço seguro onde pessoas de todas as áreas se possam conectar, desenvolver competências e melhorar as suas carreiras e vidas. Cada área contava com iniciativas e programas específicos, mas não havia um sistema holístico e ninguém tentava criar pontes entre todas as diferentes partes. Determinados a preencher este vazio e completar este puzzle, criamos algo único: o Trojan Horse was a Unicorn (THU).
Conseguimos completar este puzzle? Ainda não, mas estamos orgulhosos do progresso. Passaram-se 10 anos e ainda estamos a colecionar diferentes peças, em que cada uma delas faz toda a diferença. Para ser honesto, não acredito que algum dia vá olhar para este puzzle e sentir que está 100% completo. Temos trabalhado incansavelmente para construir o que alcançamos até agora e sabemos que ainda existe um longo caminho a percorrer.
Em primeiro lugar, a prioridade foi mapear toda a indústria e os seus diferentes contextos, identificar os principais intervenientes e ouvir o que as pessoas de todos os níveis da indústria tinham a dizer (algo que fazemos até hoje). Este trabalho permitiu-nos analisar todas as dinâmicas que estavam a causar dano e a prejudicar a indústria de alguma forma. Depois de compreender os problemas, pusemos as mãos na massa para criar soluções, que assumiram a forma de eventos e projetos dirigidos a diferentes públicos. Criámos iniciativas inovadoras que incluíram mentorias, networking, palestras, workshops, sessões de recrutamento e revisão de portfólios, entre muitas outras oportunidades para realmente conectar os diferentes lados da indústria de entretenimento digital.
Voltemos às origens, recuando no tempo até 2013. Nesse ano, o THU começou como um pequeno evento com grandes sonhos em Tróia, Portugal. Depois dessa primeira aventura, queríamos criar uma forma de ajudar mais pessoas talentosas a virem ao evento mesmo que não tivessem meios para isso, então criámos um desafio onde artistas podiam submeter a sua arte e ganhar um bilhete com tudo incluído (o Golden Ticket, que ainda existe em colaboração com a Mercedes-Benz, com uma dimensão temática que promove a sustentabilidade).
Também começámos a ter vontade de alcançar mais pessoas de todo o mundo e ligá-las, então criámos os Gatherings, pequenos eventos que nos permitiram conhecer a atmosfera criativa local de diferentes cidades. Depois disso, ainda mudámos o Main Event para Malta durante dois anos, fomos convidados a voltar às origens (Portugal), criámos mais programas digitais para acelerar ideias e encorajar talentos (Talent League), criámos um novo conceito de evento focado em Storytelling em Kaga City (THU Japão) – e depois outro focado no empreendedorismo para apoiar criadores e ajudá-los a dar o salto para o mundo dos negócios (Creators Circle, em Barcelona). Desde cedo, também nos aventuramos pelo mundo da criação de conteúdos, criando o nosso próprio canal, chamado THUTV. Esta revelou-se uma ideia pouco lucrativa, mas estou gratos pelas lições e pelo conteúdo que ainda inspira pessoas até hoje, incluindo a série The Sketchbook Series, que conta com milhões de visualizações no YouTube.
Olhando para trás nesta jornada, a importância dos anos da pandemia torna-se clara. Toda a gente achava que “THU” era sinónimo de “eventos físicos”, que de repente não eram uma possibilidade, já que todo o mundo estava em isolamento. Podia ter encarado a impossibilidade de realizar um evento como algo negativo, mas fiquei feliz pela oportunidade de focar na dimensão digital e perceber como resolver os problemas da indústria fora do contexto de evento. Isto pode ser uma surpresa para quem está a ler, mas o nosso Main Event não andava propriamente de mãos dadas com um grande lucro, já que a maioria das empresas prefere investir naqueles que atraem massas de milhares de pessoas, priorizando grandes números em detrimento de verdadeiro impacto.
Sabíamos que o Covid era um momento de dificuldade para empresas e pessoas, então quisemos dar o nosso melhor para ajudar à distância. Durante este tempo, as empresas começaram a perceber que a nossa comunidade era muito ativa fora dos eventos, e que oferecemos muito mais do que isso. O Career Camp, o nosso evento online gratuito focado no desenvolvimento de carreira, também nasceu das necessidades da comunidade durante a pandemia, e ainda existe até hoje, com o crescimento e transformação necessários.
Estes são apenas alguns exemplos do nosso crescimento e percurso ao longo dos últimos dez anos, que foram passados a construir uma estrutura para nos tornarmos uma potência para a mudança criativa e um catalisador para o crescimento económico e bem-estar social. Damos o nosso melhor mas, ainda assim, continuamos a lutar contra a ideia errada de que somos apenas um festival, um evento, um programa de software ou uma empresa de jogos. Como sabem, não somos nenhuma dessas coisas.
Somos uma organização global para criadores, pensadores e agentes de mudança que têm o poder de transformar o mundo num lugar melhor. Fazer parte das indústrias criativas significa que estamos num dos setores de mais rápido crescimento no mundo. As indústrias da economia criativa geram quase 50 milhões de empregos em todo o mundo e há previsões de um crescimento de 40% até 2030, adicionando mais de 8 milhões de empregos adicionais. É seguro dizer que esta indústria tem um impacto tremendo e muitas oportunidades no seu horizonte.
No entanto, é fácil ficar preso nas engrenagens desta máquina e é por isso que existimos: para apoiar uma comunidade de mais de 30.000 pessoas de 180 países. A nossa comunidade – a Tribo, como a chamamos – tem diferentes origens e vem de várias trajetórias de vida. No entanto, todos têm uma coisa em comum: acreditam em proteger um lugar onde nos podemos apoiar mutuamente. Este é um lugar onde pessoas, empresas e parceiros governamentais trocam conhecimento, inspiração e oportunidades, melhorando a sociedade através do desenvolvimento da economia criativa. Estamos unidos contra o lado egoísta desta indústria e tentamos torná-la num lugar justo onde todos podem crescer e prosperar.
Desde o início, estamos alicerçados em valores que podem ser difíceis de entender para os recém-chegados. O que fazemos reflete a mudança que queremos ver na sociedade. Desde o começo, estabelecemos as nossas próprias regras, que continuamente nos esforçamos para incorporar e reforçar. Há muitos hábitos enraizados para desconstruir, e é sempre um processo. Se fazes parte da nossa Tribo, isto significa que:
● Reconheces o valor do trabalho criativo e colocas isso em primeiro lugar
● Acreditas em retribuir à comunidade
● Lutas contra a discriminação e exclusão
● Acreditas na colaboração entre vários campos profissionais
Tenho orgulho de contar com uma Tribo de pessoas com os pés no chão que partilham uma paixão genuína pela criatividade. Nesta indústria, todos os nossos caminhos estão interligados e podemos ir muito mais longe se trabalharmos juntos.
André Luís é o cofundador de Trojan Horse was a Unicorn (THU), um dos projetos mais relevantes do setor do entretenimento digital e interativo, à escala global. Licenciou-se em Design Industrial e tem uma pós-graduação em Gestão de Marketing. A ideia de criar o THU surgiu em 2013 em resposta ao desejo de fazer diferente, ser útil para a sociedade e ter um impacto positivo na vida das pessoas. Atualmente, o THU é uma marca internacional de renome na indústria, promovendo diversos eventos e projetos por todo o mundo e afirmando-se como um ecossistema de networking criado para partilhar conhecimentos e inspirar criadores.