Opinião

A importância de criarmos currículos mais empáticos: É hora do “Klassen Tid”

Teresa Damásio, administradora do Grupo Ensinus

Vivemos um tempo em que muito se discute a relevância de determinadas disciplinas no currículo escolar, nomeadamente a Cidadania. No entanto, hoje quero levantar um ponto que, na minha perspetiva enquanto líder na área da educação, é ainda mais urgente e transformador: a importância de trabalharmos, desde cedo, a empatia de forma transversal no currículo escolar.

Mas afinal, o que significa ser empático? A definição é simples, segundo o Infopédia

  • a empatia é a capacidade de compreender emocionalmente o outro, de se colocar no seu lugar e partilhar sentimentos e motivações. Mas na prática, o impacto dessa competência é verdadeiramente profundo: jovens mais empáticos tornam-se cidadãos mais conscientes e, no futuro — que já é o presente —, tornam-se profissionais mais humanos.

É isto que o mercado de trabalho exige. Empresas com cultura organizacional mais humanizada procuram líderes e colaboradores capazes de criar ambientes colaborativos, de compreender as necessidades das suas equipas e de liderar com sensibilidade. Os estudos mais recentes são claros: a empatia é uma das competências-chave do século XXI. Se assim o é, então temos de nos perguntar: o que estamos a fazer, concretamente, para formá-la? O que estamos a fazer para desenvolver estas competências nos mais jovens?

Se existe a necessidade de rever o currículo escolar, então o momento é agora. A inovação pedagógica que tanto defendemos só será autêntica se o próprio currículo for empático. Ou seja, um currículo centrado no aluno, que reconhece os diferentes ritmos de aprendizagem, que valoriza a individualidade, e que se molda à realidade de quem aprende e não o contrário.

O Projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular (PAFC) foi um avanço extraordinário neste caminho. Mas agora é tempo de dar o passo seguinte. Os Projetos Piloto de Inovação Pedagógica (PPIP) devem consolidar um novo paradigma: o de uma escola mais empática e, consequentemente, mais inclusiva. Estes dois termos na educação, são para mim, concomitantes.

Falar de empatia na educação é, inevitavelmente, falar de inclusão. Uma escola empática é uma escola que respeita as diferenças, que têm em conta a individualidade dos seus alunos, que integra verdadeiramente pais, professores e toda a comunidade educativa. É uma escola que promove o diálogo, que flexibiliza os seus métodos e que coloca o aluno como agente ativo da sua aprendizagem.

É também uma escola que compreende que a aprendizagem se constrói em colaboração. Que só através de projetos interdisciplinares, de vivências partilhadas e de experiências emocionais significativas conseguimos desenvolver verdadeiramente a empatia. E que, para isso, é essencial criar espaços seguros, onde os alunos possam expressar sentimentos, desenvolver inteligência emocional e crescer enquanto pessoas, mas sempre, respeitando os seus ritmos e a sua individualidade.

Trabalhar empatia é trabalharmos para o futuro dos nossos jovens e do nosso país, pois estamos a contribuir para a construção de uma sociedade melhor em todos os seus parâmetros. Quando somos mais empáticos, tornamo-nos inevitavelmente melhores pessoas.

Em países como a Dinamarca, que são tidos como uma referência em termos de bem-estar social, igualdade de género e de qualidade de vida, além dos modelos educativos progressistas, existe uma prática denominada de “Klassen Tid”. Esta prática consiste em que os alunos e professores reúnem-se para falarem sobre o ambiente em contexto de sala de aula, sobre motivações, sobre sentimentos, sobre situações de conflito que possam ter acontecido, ou seja, uma momento que promove a reflexão externa e interna. Os alunos acabam por ser incentivados a expressarem as suas emoções e entenderem o que os colegas possam estar a sentir, através da escuta ativa dos seus sentimentos e dos outros. É parar, ouvir e entender o que os outros possam estar a sentir perante determinada situação ou acontecimento.

Esta prática promove várias competências: a cooperação, o respeito, a tolerância, a inteligência emocional e o senso de estar e viver em comunidade respeitando o outro e entendendo-o na sua plenitude. Mais, esta forma de trabalhar permite aos professores e alunos desenvolverem competências que vão muito além do currículo escolar e que se focam apenas nos conhecimentos técnicos. Esta filosofia nórdica permite criar um espaço acolhedor, seguro e fortalecer as relações entre toda a Comunidade Educativa que resultam, inequivocamente, num melhor desempenho escolar.

É neste contexto que defendo a importância de mantermos e reforçarmos disciplinas que apenas trabalham competências escolares, mas que vêm o aluno como um todo e como um ser individual inserido numa sociedade cada vez mais diversificada e em constante construção. É através deste tipo de práticas que se abrem portas para discutir valores, sentimentos e realidades sociais, muitas vezes ignoradas no ensino tradicional.

A verdadeira inovação pedagógica começa no reconhecimento de que cada aluno é único. E que só um currículo empático permitirá formar cidadãos capazes de contribuir para uma sociedade mais justa, mais solidária, mais consciente, mais igualitária ou seja, uma sociedade melhor. Estaremos a caminhar neste sentido?

 

Bibliografia:

Souza, M. (2022, maio, 10). Empatia e a prática Educativa. Jornal Observador. Disponível em https://observador.pt/opiniao/empatia-e-a-pratica-educativa/

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Teresa Damásio

Teresa Damásio

Teresa Damásio é Administradora do Grupo Ensinus desde julho de 2016, que faz parte do Grupo Lusófona, o maior grupo de ensino de língua portuguesa no mundo. É também Administradora do Real Colégio de Portugal e do Grupo ISLA. Presidente do Conselho de Administração da Universidade Lusófona da Guiné-Bissau e Membro do Conselho de Administração do ISUPE Ekuikui II, em Angola. Presentemente, integra a Direcção da AEEP. Foi fundadora da Internacionalização do Grupo Lusófona, passou pela Assembleia da República como... Ler Mais..

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