Entrevista/ “A fertilidade não deve ser um privilégio, mas um direito de saúde reprodutiva”
“A sociedade portuguesa evoluiu e a ciência também. Os tratamentos tornaram-se mais eficazes, menos invasivos e mais personalizados. Assistimos a uma verdadeira democratização do acesso à medicina reprodutiva, com uma maior sensibilidade social e legal para os diferentes modelos de família”, afirma José Cunha, diretor clínico na AVA Clinic Lisboa.
A AVA Clinic celebra 25 anos de dedicação à medicina da reprodução, um percurso marcado por inovação, crescimento e atenção humana aos pacientes. Desde a sua fundação, a clínica viu nascer cerca de 3.000 bebés graças ao seu trabalho, evoluindo de uma equipa de oito profissionais para 41 colaboradores em 2024, ano em que acompanhou mais de 800 pacientes.
Para assinalar este marco, a AVA Clinic reabriu recentemente as suas portas com um espaço remodelado, pensado para oferecer um ambiente sereno e acolhedor.
Em entrevista ao Link to Leaders, José Cunha, diretor clínico, médico especialista em Ginecologia e Obstetrícia e sub-especialista em Medicina da Reprodução da AVA Clinic, fala sobre a evolução da medicina da reprodução em Portugal, os desafios do setor e a visão da clínica para o futuro, onde tecnologia e a humanização caminham lado a lado.
A AVA Clinic celebra 25 anos de atividade. Que balanço faz deste percurso e que fatores considera fundamentais para terem chegado até aqui?
Estes 25 anos representam um percurso de compromisso, resiliência e inovação constante. A AVA Clinic nasceu de um sonho: oferecer às famílias portuguesas um espaço de excelência científica e humana na área da medicina da reprodução. O balanço é profundamente positivo. Acreditamos que o nosso sucesso se deve à combinação entre rigor médico, ética profissional e um profundo respeito pelas pessoas que confiam em nós. Ter chegado até aqui é o resultado do trabalho de uma equipa dedicada e da confiança dos nossos pacientes, que nos inspiram diariamente.
“Há 25 anos, a infertilidade era ainda um tema envolto em silêncio e estigma. Hoje, felizmente, fala-se de fertilidade com mais naturalidade e consciência”.
O que mudou na forma como se olha para a fertilidade e os tratamentos de reprodução assistida em Portugal desde que a clínica foi fundada?
Mudou quase tudo. Há 25 anos, a infertilidade era ainda um tema envolto em silêncio e estigma. Hoje, felizmente, fala-se de fertilidade com mais naturalidade e consciência. A sociedade portuguesa evoluiu e a ciência também. Os tratamentos tornaram-se mais eficazes, menos invasivos e mais personalizados. Assistimos a uma verdadeira democratização do acesso à medicina reprodutiva, com uma maior sensibilidade social e legal para os diferentes modelos de família.
A AVA Clinic passou de 8 colaboradores no primeiro ano para 41 em 2024, acompanhando mais de 800 pacientes nesse mesmo ano. Que princípios de gestão e de equipa sustentaram este crescimento?
O crescimento da AVA Clinic assentou sempre em quatro princípios: qualidade, foco no cliente, cooperação e confiança. Procurámos construir uma equipa multidisciplinar sólida, composta por pessoas de elevada competência e com capacidade para prestar cuidados de forma autónoma, onde cada profissional se senta valorizado e motivado a contribuir para um projeto comum. Por muito bons que sejam os princípios de gestão, estes só funcionam se trabalharmos com a máxima qualidade, permitindo aos nossos pacientes o acesso a serviços que realmente os ajudem a engravidar.
Tudo o que fazemos é feito a pensar nos nossos pacientes, ou clientes, se usarmos a linguagem empresarial: tentamos perceber as respectivas preocupações e ansiedades, procuramos responder a todas as questões que nos possam ser colocadas e, acima de tudo, colocamo-nos no lugar daqueles que nos procuram – pois de outra forma nunca conseguiríamos antecipar totalmente todos os desafios, clínicos e não clínicos com que nos deparamos.
Internamente trabalhamos de forma cooperativa, colaborativa e multidisciplinar, sempre com a máxima confiança, quer no que fazemos (porque confiamos uns nos outros), quer na forma como sabemos que estamos a ajudar os nossos doentes.
“A sustentabilidade é inseparável da qualidade. Uma clínica só é viável a longo prazo se for ética, rigorosa e transparente”.
Num setor com forte componente emocional e científica, como se equilibra a excelência médica com a sustentabilidade do negócio?
A sustentabilidade é inseparável da qualidade. Uma clínica só é viável a longo prazo se for ética, rigorosa e transparente. Na AVA Clinic, a gestão está ao serviço da medicina — e não o contrário. As decisões estratégicas são tomadas com base em evidência científica, mas também em valores humanos. Acreditamos que a excelência clínica é o motor do crescimento económico, porque gera confiança e fideliza relações duradouras.
A medicina da reprodução é uma das áreas mais impulsionadas pela inovação tecnológica. Quais têm sido as principais transformações neste domínio?
Vivemos um tempo fascinante. A incorporação de tecnologia na reprodução assistida trouxe avanços extraordinários: desde a inteligência artificial aplicada à seleção embrionária até à melhoria das técnicas de criopreservação. A automação laboratorial e a genética reprodutiva têm permitido diagnósticos mais precisos e tratamentos mais eficientes. Mas a inovação não é apenas tecnológica — é também conceptual, ao colocar o paciente no centro do processo terapêutico. É por essa razão que na AVA Clinic procuramos incorporar os mais recentes desenvolvimentos tecnológicos, mas fazemo-lo de um modo equilibrado, propondo aos doentes apenas técnicas e metodologias que estejam devidamente validadas e nas quais acreditamos.
Que papel desempenham a investigação científica e as colaborações internacionais na estratégia da AVA Clinic?
A investigação faz parte do nosso ADN. Participamos regularmente em projetos científicos e mantemos parcerias com centros de referência internacionais, alguns dos quais fazem parte da Assisted Reproduction Alliance (ARA), grupo de clínicas ao qual pertencemos. Estas colaborações permitem-nos aceder ao que de mais avançado se faz no mundo e, ao mesmo tempo, contribuir com o nosso conhecimento clínico. A ciência é o caminho que nos mantém relevantes e preparados para os desafios do futuro.
“Acreditamos que um ambiente acolhedor e harmonioso reduz a ansiedade e melhora a experiência do tratamento”.
A nova fase da clínica traz também um espaço remodelado. Em que medida o ambiente físico influencia a experiência e os resultados dos pacientes?
O espaço onde cuidamos das pessoas é também um espaço de cura. A remodelação da AVA Clinic foi pensada para proporcionar conforto, serenidade e confiança. Acreditamos que um ambiente acolhedor e harmonioso reduz a ansiedade e melhora a experiência do tratamento. Cada detalhe — da luz à disposição dos espaços — foi concebido para que os nossos pacientes se sintam acompanhados e seguros.
A AVA Clinic sempre se destacou por uma abordagem centrada na pessoa. O que significa, na prática, a humanização dos tratamentos de fertilidade?
Humanizar é reconhecer que cada caso é único, e que por trás de cada diagnóstico existe uma história de vida. Na prática, significa escutar, acompanhar e respeitar o ritmo de cada paciente. Significa comunicar de forma transparente, oferecer apoio psicológico e criar relações de confiança. A tecnologia é indispensável, mas o verdadeiro tratamento começa com a empatia e a capacidade de nos colocarmos no lugar do paciente.
Como se prepara uma equipa médica para lidar não apenas com o diagnóstico e o tratamento, mas também com o impacto emocional da infertilidade?
A formação técnica é fundamental, mas a formação humana é imprescindível. A nossa equipa recebe formação contínua em comunicação empática e gestão emocional. Trabalhamos de forma integrada com psicólogos especializados em fertilidade, garantindo que o acompanhamento é completo. A sensibilidade para o sofrimento dos outros é uma competência clínica tão importante quanto o domínio técnico.
“Clinicamente, continuamos a procurar melhorar as taxas de sucesso e a reduzir a carga física e emocional dos tratamentos”.
Quais são hoje os principais desafios que o setor da medicina da reprodução enfrenta em Portugal — seja do ponto de vista clínico, ético ou regulamentar?
Os desafios são múltiplos. Clinicamente, continuamos a procurar melhorar as taxas de sucesso e a reduzir a carga física e emocional dos tratamentos. Do ponto de vista ético e regulamentar, é essencial que a legislação continue a evoluir de forma equilibrada, acompanhando o progresso científico sem perder de vista os valores humanos. Também enfrentamos o desafio de garantir equidade no acesso — a fertilidade não deve ser um privilégio, mas um direito de saúde reprodutiva.
Que tendências antevê para o futuro — desde a aplicação de inteligência artificial ao diagnóstico genético e à personalização dos tratamentos?
O futuro será da medicina de precisão, em que cada tratamento é desenhado para cada pessoa, com base no seu perfil genético, metabólico e emocional. A inteligência artificial permitirá prever respostas ao tratamento e otimizar a seleção embrionária. A integração entre biologia, dados e tecnologia trará resultados mais rápidos e seguros. Mas acredito que a verdadeira revolução será a união entre ciência e sensibilidade — uma medicina cada vez mais exata e, ao mesmo tempo, mais humana.
Qual é a visão da AVA Clinic para os próximos anos? Há planos de expansão, novos serviços ou parcerias estratégicas em perspetiva?
A nossa visão é continuar a crescer com propósito. Queremos consolidar a AVA Clinic como um centro de referência nacional e internacional, reforçando a nossa vertente científica e formativa. Nos próximos anos, a AVA Clinic deve ampliar o seu arsenal de recursos diagnósticos e terapêuticos, incorporando, o mais possível, técnicas de ponta. A interação e a colaboração com os outros centros do grupo e a eventual parceria com centros de pesquisa e universidades devem ser implementadas, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento científico da clínica. Mais do que expandir fisicamente, queremos expandir o impacto positivo que temos na vida das pessoas.
O Dr. José Cunha está há muitos anos à frente da direção clínica da AVA. Que aprendizagens mais marcaram este percurso de liderança?
Aprendi que liderar é servir. É criar condições para que cada membro da equipa dê o melhor de si. Aprendi também que a medicina é uma arte coletiva — nada se constrói sozinho. O maior ensinamento é o valor da confiança: a confiança dos pacientes, da equipa e de nós próprios naquilo que fazemos. Liderar a AVA Clinic tem sido uma escola de humanidade.
Se tivesse de definir o legado da AVA Clinic em três palavras, quais escolheria?
Humanidade. Rigor. Esperança. Três pilares que definem o que fomos, o que somos e o que continuaremos a ser.
Respostas rápidas:
Maior risco: Deixar que o frenesim do dia a dia e o volume cada vez maior de trabalho nos afaste da nossa essência, que é a preocupação com o problema específico daquela pessoa concreta que nos escolheu para ser tratada.
Maior erro: Deixar que algumas decisões clínicas sejam condicionadas pela ansiedade dos doentes e não tanto pela objetividade médica.
Maior lição: Algumas histórias de vida com as quais lido diariamente, e que me fazem respeitar enormemente a luta e o sofrimento de certos pacientes.
Maior conquista: A forma pujante e humana como a AVA Clinic chegou ao fim destes 25 anos – é um orgulho liderar esta equipa!








