Opinião

A “dança” entre promessas e medos: liderar na era da inteligência artificial

Sandra Silva, diretora-geral da Mary Kay Portugal

Há momentos na história da humanidade verdadeiramente transformadores. Vivemos um desses momentos com a inteligência artificial. Assim como os computadores, os telemóveis e a internet transformaram tudo. Como trabalhamos, estudamos, interagimos socialmente e vivemos o dia a dia, agora chegou a vez da inteligência artificial voltar a baralhar e mudar tudo.

É sempre muito interessante viver e observar os pontos de viragem e transformação. Desde os early adopters, que veem a inovação como um messias, passando pelos negacionistas que tentam resistir à evolução como se pudessem travar uma avalanche, até aos inconscientes que seguem alheios ao impacto do que acontece à sua volta.

Mas ela está aí e veio para ficar. Em todos os países. Em todas as indústrias.

Um relatório do Fórum Económico Mundial prevê que, nos próximos cinco anos, 40% das horas trabalhadas serão redesenhadas, e que a produtividade gerada pela IA adicionará triliões de dólares à economia global na próxima década. Estes números devem motivar os líderes a refletir sobre o seu papel neste contexto: como apoiar as suas equipas e redesenhar as organizações para o futuro?

O líder inspira equipas, lidera transformações e redefine o futuro da organização, sempre alinhado com o propósito e a missão. Futuro, visão e propósito são palavras-chave.

Hoje, isso exige uma abordagem estratégica em relação à IA, considerando o seu potencial, as oportunidades que oferece e os riscos que impõe. Ignorar esta realidade equivale a ficar para trás, com consequências que, no longo prazo, podem ser fatais para muitas empresas.

Porém, abraçar a IA é tanto excitante quanto assustador. As promessas andam de mãos dadas com os medos e barreiras.

A tecnologia, ainda nos seus primórdios, promete transformar tarefas, melhorar a produtividade e elevar as competências humanas. Contudo, também levanta questões éticas, como a proteção de dados, o impacto no emprego e o receio de que as máquinas ultrapassem o controlo humano. Aqui, o líder desempenha um papel crucial para gerir esta “dança” entre promessas e medos, inspirando confiança e direcionando a revolução tecnológica.

As promessas da IA são amplas, com a automação de tarefas que liberta colaboradores de tarefas repetitivas para se concentrarem em atividades criativas e estratégicas, à capacidade de processar grandes volumes de informação com rapidez e precisão até à melhoria de produtos e serviços. Com efeito a IA pode revolucionar modelos de negócio e criar ofertas mais personalizadas.

No entanto, os medos também são significativos. Da substituição de funções por máquinas potencialmente geradora de desemprego em larga escala, às violações de privacidade e ética relacionada com o uso indevido de dados, autoria de conteúdos gerados por IA até ao futuro incerto: quem dominará a sociedade – o homem ou a máquina?

Para liderar na era da IA, é essencial começar pelo fim: a visão. Como a IA pode contribuir para a visão estratégica da organização? Qual é o alinhamento com a missão e os princípios da empresa? O líder deve definir o que é inegociável neste processo.

Depois, é importante fomentar uma cultura de transparência geradora de confiança essencial em qualquer processo de transformação, alicerçada em forte experimentação. Há que por as pessoas nas empresas a “brincar”.

A IA está numa fase inicial, com casos de uso ainda limitados e um ROI que muitos líderes consideram incerto. Assim, é necessário “brincar” com a tecnologia: testar, falhar, aprender e evoluir. Brincar muito, brincar depressa, falhar e avançar para chegar a casos de uso que podem ser escalados. Esta abordagem exige agilidade, resiliência e uma mentalidade inovadora.

Simultaneamente, deve-se investir no upskilling e reskilling das equipas. Muitos colaboradores temem que a IA sirva apenas para gerar eficiências que destruam postos de trabalho. Capacitar pessoas para trabalhar com IA, adotando novas competências, é a chave para enfrentar o futuro.

Apesar de assustadora, esta revolução é também uma das mais emocionantes da história. Podemos ser os arquitetos de um futuro mais justo e inovador, moldando a forma como trabalhamos, vivemos e lideramos, deixando um impacto positivo duradouro na sociedade.

Não podemos perder de vista o essencial: o ser humano no centro, com a IA ao serviço das pessoas e da sociedade, e nunca o contrário. Lideranças visionárias e éticas, capazes de construir confiança e promover a co-construção, serão determinantes para o impacto positivo da tecnologia.

Como dizia Peter Drucker: “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”. É tempo de agir, com o ser humano no centro de tudo. Vamos a isso!

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Sandra Silva

Sandra Silva

Sandra Silva é a diretora-geral da Mary Kay Portugal desde 2009, ano em que entrou para a companhia. Desempenhou um papel importante e fundamental tendo sido responsável pelo turnaround da empresa em Portugal. Liderou a importante renovação da estratégia de negócio implementada em todos os departamentos. Também é membro da Plataforma Portugal Agora. Antes de chegar à Mary Kay a experiência profissional de Sandra Silva centrou-se nas áreas das Vendas e Marketing em multinacionais de grande consumo. Começou na Johnson&Johnson,... Ler Mais..

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