Opinião

Uma agenda para as migrações do século XXI

Carlos Sezões, coordenador da Plataforma Portugal Agora

Tal como acontece um pouco por toda a Europa, Portugal é hoje um destino de migrantes que, pelas mais diversas causas e motivações, nos procuram para se estabelecer.

Dados do SEF (Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo – RIFA) apontavam para cerca de 660 mil estrangeiros no nosso país em 2020, o valor mais elevado do Portugal contemporâneo. Brasileiros, britânicos, cabo-verdianos, romenos e ucranianos, ocupavam os lugares cimeiros em termos de número de cidadãos. De destacar, em termos de grandes tendências, nos últimos anos, o aumento crescente de imigrantes oriundos da União Europeia (ex. Itália e França) e da Ásia Meridional (ex. Índia e Nepal). Motivações profissionais e de estudo com as consequentes situações de reagrupamento familiar são as mais relevantes no enquadramento formal das novas entradas.

Com efeito, a globalização, que acentuou a mobilidade humana nos últimos 20 anos, é uma realidade que não voltará atrás. Fatores conjunturais como a pandemia poderão diminuir o ritmo desta tendência. Variáveis políticas-ideológicas (como nacionalismos e populismos) poderão influenciar também a sua progressão. Algo que, em termos históricos e objetivos, tem um sentido e uma lição clara: países abertos, que atraem migrantes e os integram nas suas sociedades, aproveitando o seu capital de conhecimento diversidade, são invariavelmente mais bem-sucedidos que outros que, com base em medos ou preconceitos, se fecham ao mundo.

Efetivamente, temos hoje um novo e vasto movimento de pessoas, as novas migrações económicas, com enfoque na procura de trabalho, segurança e qualidade de vidas, com o qual temos de lidar na Europa. Às quais se juntam refugiados de guerras e perseguições políticas (Síria, Afeganistão ou países do Sahel). Tal requer políticas inovadoras, assentes em princípios intemporais de solidariedade e tolerância e em imperativos de racionalidade, sustentabilidade e eficácia.

O resultado destas políticas pode e deve ser uma simbiose, entre quem procura uma nova vida, e um continente europeu cuja crise demográfica vai requerer um rejuvenescimento, em boa parte trazido pela imigração. Com efeito, a nível nacional, sabendo que teremos sempre movimentos nos dois sentidos (o que é salutar), o objetivo deve ser um saldo migratório positivo. Para além da demografia, numa ótica mais micro teremos os próprios mercados de trabalho a necessitar de imigração. Em Portugal, setores como as tecnologias de informação, a agricultura ou o turismo clamam por profissionais que venham de outras geografias, suprindo necessidades quantitativas e qualitativas.

Naturalmente que uma postura de imigração de “porta aberta”, desordenada, não é um cenário desejável para ninguém. Será mandatória a existência de políticas públicas integradas (com a participação de outros stakeholders institucionais além do Estado), que possam construir os melhores processos de acolhimento, integração retenção dos vários segmentos que nos procuram – sejam refugiados, profissionais/ trabalhadores, estudantes e empreendedores ou freelancers da nova gig economy. Em termos concretos, políticas alinhadas com alguns objectivos-chave:

  • Definir e assegurar a consistência da marca “Portugal” na comunicação a nível global, que promova a sua proposta de valor como país de destino (a nossa rede diplomática será essencial neste esforço);
  • Estruturar, agilizar e simplificar processos administrativos que assegurem uma mobilidade ordeira, segura e informada;
  • Assegurar um combate eficaz a todos tipos de tráfico, exploração e desinformação (com fins laborais ou outros);
  • Estabelecer uma efetiva gestão do conhecimento entre vários stakeholders nacionais, baseados em dados atuais e prospetivos, sobre necessidades e possibilidades do país – permitindo melhor gestão geográfica, por áreas setoriais da economia, e das instituições de ensino das migrações (no fundo, uma real transformação digital das atuais políticas e processos); 
  • Preparar, transversalmente, o nosso “Estado Social”, para assegurar os direitos mais básicos (saúde, educação e habitação) e uma rápida integração cultural e profissional aos recém-chegados.

Enfim, um conjunto de estratégias e políticas que materializem a visão que aqui defendo: um Portugal atrativo e acolhedor, numa visão de país cosmopolita, intercultural e tolerante.

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Carlos Sezões

Carlos Sezões

Carlos Sezões é atualmente Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders, startup focada na transformação organizacional/ cultural e no desenvolvimento do capital de liderança das empresas. Foi durante 10 anos Partner em Portugal da Stanton Chase, uma das 10 maiores multinacionais de Executive Search. Começou a sua carreira no Banco BPI em 1999. Assumiu depois, em 2001, funções de Account Manager do portal de e-recruitment e gestão de carreiras www.expressoemprego.pt (Grupo Impresa). Entrou em 2004 na área da... Ler Mais..

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