Os 4 pilares para uma start-up científica de sucesso

Gerir uma start-up não é para todos. Se for uma de base científica, mais ainda. Isto porque nem sempre os académicos têm o perfil adequado – ou a inclinação – para serem empreendedores. Barbara Domayne-Hayman, do londrino Francis Crick Institute, considera que é possível, se assentarem a empresa em quatro pilares.
Um empreendedor de sucesso tem de unir tudo à sua volta e saber influenciar as pessoas. Tem de ser capaz de angariar dinheiro, ser bom a apresentar ideias e a estabelecer confiança, e saber como liderar e inspirar uma equipa. E quando o empreendedor vem da área científica e de investigação?
Gerir uma empresa não é para todos. Por vezes os cientistas têm ótimas ideias, mas não têm o perfil certo – ou talvez a inclinação – para concretizar e levar a tecnologia adiante. Barbara Domayne-Hayman, empreendedora residente no Francis Crick Institute, em Londres – onde orienta cientistas em direção à junção de investigação com indústria/mercado –, considera que a exposição dos cientistas ao empreendedorismo melhorou nos últimos 20 anos.
Contudo, refere a também executiva no site Nature.com, neste lado de cá do Oceano Atlântico ainda há um longo caminho a percorrer por comparação com os EUA, em que o empreendedorismo está no ADN de muitas instituições de ensino superior, e há o pressuposto de que um académico irá estar envolvido em pelo menos uma start-up ao longo do seu percurso. E acrescenta que, no Francis Crick Institute, os estudantes já são incentivados a desenvolver a sua ciência de forma a ter impacto no mundo real.
1. Da academia para os negócios
No desenvolvimento de um negócio/empresa, é preciso ter uma dose de paciência, porque as escalas de tempo são longas e há que ir construindo relacionamentos. O empreendedor irá, por exemplo, ter muitas conversas que não levam a nada. Assim, sempre que perguntam a Barbara Domayne-Hayman o que é preciso para criar uma empresa científica de sucesso, a empreendedora elenca os quatro principais pilares a ancorar:
- Necessidade de mercado. A sua ideia atende a uma necessidade do mercado? Como testou essa necessidade? Os cientistas costumam estar tão maravilhados e focados na sua tecnologia que não conseguem ver como irá funcionar no mundo real, ou quem irá querer pagar para a ter. Têm de conversar com os potenciais utilizadores sobre o impacto da tecnologia e obter feedback dos clientes numa fase inicial.
- Tecnologia. Como pode proteger a sua ideia? Se não puder protegê-la, ninguém irá investir. E como pode dar uma “prova de conceito” funcional da forma mais fácil e barata?
- Pessoas. Para os investidores, a sua equipa é pelo menos tão importante quanto a sua tecnologia. Os cientistas que querem ser o chefe e não ouvem bem as opiniões das outras pessoas têm um alto risco de fracassar. Os relacionamentos podem ser muito intensos numa empresa de pequena dimensão: os atritos surgem e não há para onde escapar. Todos precisam de encontrar o seu estilo, mas uma boa liderança é crucial.
- Finanças. Se acertar nos primeiros três pilares, deverá conseguir angariar dinheiro. No entanto, a captação de fundos é sempre difícil para as empresas em estágio inicial, e tem de entender não só os donativos, mas também os vários tipos de investimento, que vão do capital de risco a angel investors. E, em tempos de pandemia, o financiamento é particularmente difícil de obter – muitos investidores estão a concentrar-se no portefólio de empresas que já têm em carteira, pelo que a exigência quanto a um novo investimento é ainda mais alta que o habitual.
2. Construir a sua rede
Após o doutoramento, Barbara Domayne-Hayman trabalhou 11 anos em marketing internacional na divisão de agroquímicos da ICI (agora parte da Syngenta). Em seguida fez um mestrado em liderança e estratégia na London Business School, onde descobriu o mundo do empreendedorismo. Afirma que queria usar a formação científica e a experiência comercial para fazer algo em empreendedorismo, e tudo se conjugou para que entrasse em biotecnologia. Desde então, trabalhou numa série de empresas no setor como diretora comercial, diretora executiva ou presidente, ou em funções não executivas. É também membro do comité de investimento Seed Funds da Universidade de Cambridge, onde entra em contacto com start-ups emergentes, e preside o comité de investimento Seed Fund do LifeArc em Londres, que investe em start-ups de biomedicina em estágio inicial.
Refere que a comunidade de biotecnologia é unida e tem sorte por haver pessoas generosas e decentes que geralmente estão preparadas para dar muito tempo livre de mentoring e conselhos a alguém que está a começar. E que investiu muito tempo a construir a sua rede de networking – o que significa que, se não sabe a resposta para algo, conhece alguém que sabe.
3. Modelo de proximidade
Os investigadores no Francis Crick Institute trabalham ao lado de cientistas tanto de empresas de grande dimensão como de pequenas empresas. O instituto criou um modelo de proximidade para trabalhar com multinacionais farmacêuticas como a GlaxoSmithKline, a AstraZeneca ou a Merck & Co, o que contribui para o desenvolvimento de competências, incluindo a experiência de trabalhar no setor, bem como para a inovação que conduz a publicações.
4. Resistências e resiliência
Para ser um empreendedor de sucesso precisa de resiliência e de persistência. Recebe murros no estômago vezes sem conta e é rejeitado outras tantas. Barbara Domayne-Hayman prefere falar em “contratempos” em vez de “fracasso” (que lhe parece terminal). Acrescenta que pode permitir-se 20 minutos para se lamuriar, para em seguida se erguer e pensar em novos caminhos a seguir. Mas também precisa de prestar atenção aos comentários e manter a mente sempre aberta.
Pode, por exemplo, permanecer na área académica e ter outras pessoas a gerir o negócio. Pode permanecer envolvido, ao fazer parte do conselho científico, a trabalhar como consultor e ficar com ações de fundador. Mas se se decidir a experimentar o empreendedorismo, saiba que vai precisar de se preparar para uma autêntica montanha-russa, e para não ter um dia aborrecido no escritório!