“Não tenham medo da vida, por favor! A vida é bela”

O final do ano letivo aproxima-se e muitos estudantes já só pensam nos exames. A segunda quinzena de junho traz consigo esperança, angústia e medo.

Esta é a história da Maria, mas podia ser também a do João. A Maria está a frequentar o 9.º ano. Tem o síndrome da menina perfeita. Para lá de ser uma excelente aluna, está envolvida no desporto, na dança e no voluntariado. Tem 5 a tudo! Neste momento ter que escolher uma área deixa-a muito nervosa. No meio da conversa diz-me que sabe que vai escolher, mas que vai voltar para trás e que vai fazer mais do que um curso, porque acha que se vai arrepender e quem sabe… todo este discurso acontece de rajada. Sem pausas. Deixo-a a terminar e no final digo-lhe ‘Maria é apenas a escolha de uma área. Não fiques angustiada. A vida vai-te levar a lugares que hoje nem consegues imaginar. Eu própria já fui tantas coisas!’. De alguma forma tento apaziguar o seu coração. Apesar de saber que não consegui, por alguns momentos fiz-lhe perceber que não tem mal nenhum falhar e… que não é preciso ser perfeita!

Esta história serve para ilustrar as várias histórias com que me cruzo no âmbito da Shape Your Future. Jovens de 14 anos que já carregam um mundo de angústia, condicionados por pais que fazem com que tenham horários de 12 horas por dia, em que não há espaço para o descanso, quanto mais para a reflexão! São jovens que não se conhecem e que muitas vezes têm dificuldade em expressar o que os faz felizes. Jovens que estão habituados a que alguém vá escolhendo por eles…

A partilha desta história remete-me para uma frase do Papa Francisco, que por estes dias nos deixou: “Não tenham medo da vida, por favor! A vida é bela”.

A verdade é que parece que nem todos os jovens conseguem ver isso. Em Portugal, quase 31% dos jovens têm sintomas depressivos, a maioria moderados ou graves.

Existem muitas causas, para além das académicas, que contribuem para estes números. Dito isto, a pressão que colocamos nos nossos jovens para atingirem o sucesso académico, não é de minimizar. E muitas vezes, somos nós pais que temos dificuldades em aceitar que o tal exame pode não correr bem, que a entrada no curso pode ficar comprometida, que vai ser um ano perdido…

A pressão para o sucesso torna-se tão grande que acabam por correr atrás de coisas que afinal não era aquilo que queriam, ou que afinal nem eram assim tão importantes.

Esta é a história do Manuel. Queria entrar em Gestão. Habituado a ser excelente aluno, há dois anos não conseguiu entrar por uma décima na sua universidade de eleição. Depois do choque inicial, fez as malas e decidiu ir conhecer o mundo. Percebeu que afinal não era Gestão que verdadeiramente o fazia feliz. Depois de ter ajudado a reconstruir aldeias, em lugares remotos, percebeu que o seu ikigai (razão de viver) estava na arquitetura! Hoje olha para esta experiência como o melhor que lhe podia ter acontecido. Pela primeira vez lidou com o fracasso, ganhou resiliência e teve a capacidade de se pôr em causa, a si e ao que o fazia verdadeiramente feliz.

Olhando para a história do Manuel e da Maria, penso muitas vezes que esta pressão para o sucesso acaba por deixar os nossos jovens encurralados. Muitos deles até poderiam ser coisas diferentes, mas o medo de desiludir leva-os a escolher vidas que não seriam as suas, se pudessem verdadeiramente escolher. E que potencial acabamos todos por perder!

“Vamos treinar para reconhecer a esperança. Poderemos, então, ser faróis de futuro para quem está ao nosso redor.”

FRANCISCO, Cidade do Vaticano, 2 de outubro de 2024