Opinião

Tenho uma ideia para um negócio: a neurodiversidade ajuda?

Isabel Neves e Isabel Moço, coordenadoras da Pós-Graduação em Empreendedorismo de Negócios*

Perfeito e parabéns – é assim que tudo pode começar. Pode, porque pode ser diferente: por exemplo, pode já ter um negócio e não saber como o desenvolver e fazer crescer. Mas vamos a este cenário em que tem uma ideia para um negócio.

Começamos por alertar que transformar uma ideia num empreendimento de sucesso requer mais do que apenas uma boa ideia. Tem de a suportar com uma estratégia robusta, inovação constante e uma visão abrangente e transversal de todos os requisitos que deve cumprir. A continuação deste texto poderia seguir muitos caminhos, mas o que escolhemos aqui é explorar porque é que a (re)construção de um negócio deve ter, “lá dentro”, neurodiversidade.

A diversidade é frequentemente negligenciada na conceção de um negócio, mas pode ser extremamente valiosa. A inclusão de indivíduos neurodiversos, mesmo nas fases de conceção do empreendimento, pode ser um tremendo impulsionador, e deve ser considerado desde o início – não é muito comum esta reflexão, pois desde logo o empreendedor procura rodear-se de quem se alinhe com o seu pensamento e a sua visão, como forma de agregar vontade e recursos. No entanto, se todos “disserem o mesmo” a evolução e a diferença são inibidos e tornam-se mais lentos.

Por neurodiversidade entendemos a variedade de diferenças neurológicas naturais no cérebro humano, abrangendo condições como autismo, déficit de atenção, hiperatividade, dislexia, entre outras. Essas condições são muitas vezes entendidas como deficiências, mas a proposta deste texto é reconhecer essas diferenças como uma possibilidade construtiva para uma ideia de empreendimento, e que podem trazer habilidades e perspetivas únicas que podem ser valiosas na resolução de problemas e na criatividade, ambas críticas para o arranque ou progressão dos negócios.

Empresas e empreendimentos que acolhem neurodiversidade, para além das questões essenciais de assumir um papel socialmente responsável, podem beneficiar por terem “diferença lá dentro”. Com frequência, indivíduos neurodiversos revelam habilidades excecionais em determinadas áreas, como por exemplo o cálculo matemático, ou pessoas com autismo que podem ter elevada atenção ao detalhe e uma capacidade de concentração superiores. Pessoas com hiperatividade também podem ser altamente criativas e capazes de pensar “fora da caixa”, o que mesmo numa fase de arranque se pode constituir como uma mais-valia.

Mas não se pense que é só encontrar as pessoas e distribuir tarefas – pode exigir mais tempo, mais esforço, mais adaptabilidade e há que ponderar se esse é o momento para o fazer. Para aproveitar os benefícios da neurodiversidade é essencial criar um ambiente de trabalho inclusivo que apoie e valorize os contributos de todos, o que por vezes é difícil a quem “tem uma ideia”, porque é a sua, porque a criou e, eventualmente está disposto a investir parte da sua vida nela, o que pode causar menos flexibilidade em aceitar outras perspetivas e pontos de vista.

Mas há ações simples e fáceis de implementar, como por exemplo reduzir estímulos sensoriais como iluminação forte e ruído excessivo. No fundo, criar cuidadosamente um espaço confortável e acolhedor para todos, mas atendendo também às necessidades dos neurodiversos. Igualmente pode passar por definir horários de trabalho flexíveis e considerar a possibilidade de trabalhar remotamente, ou mesmo ter circuitos de comunicação clara e objetiva que garantam que todos compreendem expetativas e tarefas. Acrescentamos ainda que a grande maioria das pessoas também precisa aprender a trabalhar com neurodiversos, e há que garantir esta condição – formar gestores e pares sobre neurodiversidade é crucial para criar um ambiente inclusivo, construtivo e produtivo. Alertar para as necessidades e os pontos fortes das pessoas neurodiversas pode reduzir preconceitos e promover uma cultura de respeito e colaboração.

Até aqui abordamos o tema do ponto de vista das vantagens e cuidados do empreendedor/gestor que enquadram pessoas com neurodiversidade nos projetos. Mas há outra perspetiva: empreendedores neurodiversos. Estes enfrentam desafios únicos, mas também trazem ao mundo dos negócios, a diferença muito suportada até na experiência de enfrentar e superar dificuldades, tornando-as vantagens competitivas. Por exemplo, Richard Branson, o fundador do Virgin Group, é disléxico. Embora tenha enfrentado desafios significativos na infância, Branson acredita que a dislexia lhe deu habilidades únicas, como uma visão holística dos negócios e uma abordagem inovadora na resolução de problemas, referindo frequentemente que a sua condição o ajudou a pensar de forma diferente e a encontrar soluções criativas.

Por entendermos que esta pode ser uma diferença a incorporar no seu empreendimento, logo desde a ideação e planeamento do negócio, apontamos algumas pistas que podem ajudar empreendedores neurodiversos e aqueles que desejam apoiar a neurodiversidade nos seus negócios.

Desde logo, apoiar-se em mentores que compreendam as suas necessidades e que possam oferecer orientação, quer pela visão, quer pela sua prática. Poderá também ser interessante participar em redes e circuitos de empreendedores neurodiversos, pois a visibilidade da experiência pode ser um poderoso apoio emocional e prático.

Promover uma cultura de respeito e valorização da diversidade humana deve ser responsabilidade de todos os que estão no mundo dos negócios e do trabalho – recordamos a série “Bright Minds – Astrid e Raphaelle” onde, em cada episódio, é a forma diversa de entender as situações que permite a resolução dos desafios, para concluir que se tem uma ideia de negócio, talvez a mesma possa ter um caminho de sucesso se coadjuvada por pessoas com neurodiversidade. Teste-o.

 

*Universidade Europeia

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