Entrevista/ “Tudo na vida tem um lado bom e um lado mau. Basta decidirmos para qual decidimos olhar”

Curiosamente esta é uma das citações mais usadas nos últimos dois anos nas redes sociais. Hoje deparei-me com uma publicação com esta frase e instintivamente, percebi que não se poderia adequar melhor a esta crise que todos atravessamos.

O COVID-19 é uma realidade que não podemos evitar. Apareceu sem avisar, e ao que parece veio para ficar por tempo indeterminado. Obrigou a milhões de famílias a nível mundial a reorganizarem-se e ficarem isoladas em casa. Estatutos ou liberdades que damos como garantidos foram-nos tirados, em prol da segurança individual e coletiva. Num mundo social e de livre circulação, de repente estamos confinados a um espaço único, pequeno, onde pessoas que habitualmente só se encontram poucas horas por dia, terão de coabitar dias, semanas, talvez meses.

Naturalmente que do ponto de vista social isto terá consequências nunca vistas. Algumas já imediatas. Basta olharmos para as pessoas que seguimos no Instagram ou Facebook e 50% dos posts referem como estão cansadas de estar em casa, que não sabem o que fazer com os filhos ou mantê-los entretidos, as suas preocupações, alarmismos, desespero por não existir um escape nem um prazo definido para tudo voltar ao que há uma semana atrás considerávamos “normal”.

No entanto, num prazo de apenas cinco dias são cada vez mais frequentes os posts de esperança. Imagens de pais e mães a brincarem com os filhos, a realizarem trabalhos manuais, a escreverem mensagens motivacionais, opções de leituras, aprendizagem, evolução.

Naquela que considerava a minha vida “normal” via os meus filhos no máximo três horas por dia. Três horas em que mesmo assim, inevitavelmente, pegava no telefone, atendia chamadas ou respondia a mensagens. Urgentes ou não, era a minha realidade.

Não estou de baixa nem de quarentena e estou num regime misto de teletrabalho, presença no escritório e assumir o papel de mãe. Mesmo neste caos, nunca passei tanto tempo com os meus filhos ou pelo menos nunca lhes dei tanta atenção. Dou por mim a pesquisar atividades para fazermos, receitas simples para cozinharmos, trabalhos manuais que lhes possam interessar, viciei-me novamente em puzzles e o tempo para o telefone é limitado. E sabem que mais? Mesmo em tempo de crise, tudo acaba por correr bem.

Perdi muitos momentos desta fase do meu filho mais velho. Não as perderei com o meu filho mais novo. Apesar de estar estoirada quando me deito, voltei à rotina das leituras diárias que tanta falta me faziam. Todos os dias vejo surgirem novas oportunidades de autodesenvolvimento, aquisição de novas competências e novos desafios à distância de um clique.

Se não sinto saudades de muita coisa? De tudo! De abraçar mesmo quem não abraço com frequência, de correr e brincar na rua em família, de exercer a minha liberdade pessoal e de ter tempo para mim.

Mas cada vez tenho uma certeza maior, que sairemos disto mais fortes, mais unidos e mais focados.

O tempo é o bem mais escasso que temos e a vida passa num instante. Que aproveitemos esta calamidade para usufruir exatamente desse recurso precioso que nos está a ser imposto e que teimamos em ignorar. Utilizemos o tempo para aproveitar cada segundo, para abrandar o ritmo, para apreciar os detalhes, para deixar de dar tudo como garantido pois a única coisa que nesta vida é certa é o agora.

Decidi olhar para o lado bom e tentar ignorar o lado mau. Aceitar a nossa fragilidade e impotência perante a situação e disfrutar da sorte de ter quem me é mais próximo junto a mim e a esses abraçar, abraçar muito e sempre.