Entrevista/ “Temos o compromisso de ser uma empresa que acolhe e cuida das suas pessoas”
“Em 2023 cerca de 1/3 da nossa população (excluindo operadores) teve mudanças no seu scope profissional”, afirmou Emília Roseiro, diretora de Recursos Humanos da Bel para a Europa do Sul e Turquia, referindo-se à “mobilidade interna intensa” que existe no grupo que detém marcas como a Limiano e a Terra Nostra.
Emília Roseiro assumiu há um ano a direção de recursos humanos da Bel para a Europa do Sul e Turquia, depois de sete anos à frente dos RH em Portugal da empresa.
Licenciada em Gestão e pós-graduada em Gestão de Recursos Humanos, soma no currículo empresas como a Mars, a Heineken e a Sara Lee Foods, onde consolidou experiência em vendas e marketing antes de integrar, em 2003, a Bel Portugal. Na empresa foi gestora de marcas locais antes de se tornar diretora de Marketing e, posteriormente, de Recursos Humanos.
A Bel é uma empresa familiar francesa com mais de 150 anos de existência que opera há 20 anos em Portugal. É líder de mercado na categoria de queijos em Portugal, com as marcas locais Limiano e Terra Nostra, e com as marcas internacionais A Vaca Que Ri, Mini BabyBel e GoGo Squeeze.
Com duas fábricas em Portugal (Açores e Vale de Cambra), a Bel conta atualmente com um total de 620 colaboradores no nosso país.
Como surgiu a oportunidade de liderar todo o Sul da Europa e a Turquia da Bel?
Portugal é o maior país do cluster, daí ser natural que seja quem gere a equipa maior que esteja mais bem preparado para assumir esta responsabilidade. A minha anterior experiência no negócio também foi um fator importante na decisão da Bel de liderar todo o Sul da Europa e a Turquia.
“Apaixonei-me pela função (…) fascinou-me esta gestão complexa das pessoas e da organização, que exige uma visão de longo prazo, gestão permanente de equilíbrios, colaboração e construção de pontes, resolução de problemas (…)”.
Que funções começou a exercer na Bel e como é que o seu percurso profissional se foi solidificando aos longo destes anos, até à direção de recursos humanos para a Europa do Sul e Turquia?
O meu percurso antes da Bel foi em vendas e marketing – passei pela Mars, pela Central de Cervejas e pela Nobre. Entrei na Bel como Brand Manager da marca Limiano, há 20 anos. Há 10 anos fui desafiada a integrar a equipa de Recursos Humanos, trazendo a visão do negócio e com a ambição de melhorar a comunicação e processos de trabalho. Pensei que seria uma “aventura” interessante para uns poucos anos, mas era evidente um regresso ao negócio.
Apaixonei-me pela função. E percebi o impacto que tem no negócio e fascinou-me esta gestão complexa das pessoas e da organização, que exige uma visão de longo prazo, gestão permanente de equilíbrios, colaboração e construção de pontes, resolução de problemas, transformação, gestão da mudança. Tive o privilégio de o fazer numa empresa que valoriza realmente as pessoas e de ter sempre um “lugar à mesa”.
Quais têm sido os desafios e as aprendizagens que tem tido desde que está na Bel?
A função de RH tem-se transformado a grande velocidade e é hoje muito diferente (para melhor!) e valorizada comparativamente com o passado. Estes 10 anos a crescer na função tiveram muitos desafios que se prendem com a natureza da nossa empresa e negócio: duas fábricas (Açores e Vale de Cambra) e um escritório em Lisboa; grande dispersão geográfica; mais de 600 pessoas com perfis e necessidades muito diferentes; uma forte componente legal e de compliance; uma área onde todos esperam muito, como indivíduos, como chefes de equipa, como lideres da empresa, junto de stakeholders externos, etc.
Também a Bel cresceu muito nesta área – nos processos e sistemas, nas prioridades e recursos disponíveis, no foco nas pessoas, comportamentos, lideranças na centralidade nas pessoas e no planeta.
“O desafio é poder dar uma visão mais global e estratégia, enquanto se confia nas equipas locais e na sua capacidade de implementação e adaptação à realidade local”.
É fácil gerir-se pessoas de culturas tão diferentes? Como se consegue implementar estratégias bem sucessivas ao nível da gestão de pessoas em mercados distintos?
A Bel tem uma visão global muito inspiradora: disponibilizar produtos mais saudáveis e responsáveis para todos: For all, for good. Isto traduz-se de forma muito concreta nos planos de cada geografia, ajustado à realidade e desafios locais. Há uns anos falava-se de “Glocal – pensar global, agir local” – a palavra saiu de moda, mas penso que o seu significado continua muito atual. Há desafios globais: gestão, desenvolvimento e mobilidade do talento, temas da liderança, valores e cultura da empresa. E há desafios locais, sobretudo relacionados com as características do mercado e o modelo de negócio. O desafio é poder dar uma visão mais global e estratégia, enquanto se confia nas equipas locais e na sua capacidade de implementação e adaptação à realidade local.
O que destaca como experiências/ situações mais marcantes do seu percurso profissional?
O meu percurso foi bastante diversificado e por natureza nunca fiquei “fechada na minha caixa” – com respeito pelos outros e com sentido construtivo, sempre me envolvi de corpo e alma nos projetos que abracei. Trabalhei em vendas na Mars (porta a porta, uma experiência muito dura, mas muito enriquecedora), depois em cadeias de retalho, longe de casa, o que alavancou a minha independência. A passagem pela Central de Cerveja, nessa altura com junior marketeer – foi uma experiência fascinante com as grandes agências, eventos. Depois a Nobre, com fábrica, desenvolvimento e inovação locais, num momento alto da marca – ainda muito emocional e património dos portugueses. A chegada à Bel foi a maturidade como marketeer, a trabalhar love brands – Limiano e Terra Nostra – ainda há muitas coisas que vejo no mercado em que contribui ativamente e me dão imenso orgulho.
A passagem por RH, cujo plano era de curto prazo, foi de longe o maior desafio – pela natureza e impacto de tudo o que fazemos – nas pessoas e no negócio. Tenho o privilégio de o fazer numa empresa que trata as pessoas com muito sentido de responsabilidade em todas as situações. E onde a larga maioria tem vidas profissionais duradouras, realizadas e felizes, construindo amizades para a vida.
A profissão é uma grande fonte de realização para mim, e poder ter um impacto positivo nas vidas que toco é o que realmente me move, numa descoberta algo acidental, que agradeço à Bel!
Que iniciativas é que a Bel tem desenvolvido em termos de gestão de pessoas?
A Bel é uma empresa de valores fortes – ousar, comprometer, cuidar – que são muito vividos e que se traduzem em comportamentos que queremos ver transversalmente na organização. O nosso valor cuidar orienta-nos para politicas fortes na área do bem estar, apoio à família. Traduz-se em políticas que fomentem a igualdade de oportunidades e a inclusão, nas suas múltiplas dimensões. A adesão a um modelo híbrido flexível é também muito valorizado.
Há um sentido de pertença forte, alicerçado na nossa missão e propósito, e focados num modelo colaborativo, inclusivo e sustentável. O nosso programa Actors for Good, que aspira a 100% de colaboradores ativistas a nível social e ambiental é um bom exemplo disso – promovemos a capacitação dos colaboradores para fazerem boas escolhas como indivíduos e profissionais; promovemos a intervenção ativa em causas. Existem na Bel várias comunidades multidisciplinares, que promovem estas várias dimensões e amplificam o sentido de pertença.
Como todas as empresas, competimos pelo talento que precisamos de atrair. Estamos particularmente comprometidos com o desenvolvimento desse talento – como cada um pode atingir o seu máximo potencial, sentir-se realizado no que faz. E isso traduz-se numa mobilidade interna intensa. Em 2023 cerca de 1/3 da nossa população (excluindo operadores) teve mudanças no seu scope profissional.
“Procuramos líderes positivos, ambiciosos e humildes, que queiram desenvolver e cuidar das suas equipas, sem medo de serem ultrapassados. Procuramos ambição e resiliência”.
Qual o perfil ideal para trabalhar na Bel?
Procuramos pessoas positivas, que queiram integrar uma cultura inclusiva e colaborativa. Que se identifiquem com a nossa missão e valores. Que acreditem que podemos fazer a diferença para um mundo melhor. Que queiram construir o futuro em cada uma das áreas, contribuído ativamente para além do conteúdo funcional que lhes é atribuído.
Procuramos líderes positivos, ambiciosos e humildes, que queiram desenvolver e cuidar das suas equipas, sem medo de serem ultrapassados. Procuramos ambição e resiliência. Procuramos ousadia nas soluções e compromisso na entrega. E prometemos cuidar.
Que competências comportamentais mais valoriza?
Valorizo a frontalidade e transparência; a capacidade de dar e receber feedback. Valorizo a positividade (não no sentido “cor-de-rosa” do termo, mas no sentido de olhar para as dificuldades com uma postura construtiva e determinada). Dou valor à proatividade e ao pragmatismo. E a capacidade de trabalhar em equipa. Valorizo quem faz o que é certo e não o que é fácil.
Como caracteriza a cultura da Bel?
Os nossos valores são muito presentes e vividos – ousar, comprometer, cuidar. Temos uma missão que visa uma transformação sustentável. Cada um de nós acredita que contribui para fazer a diferença, numa base de colaboração e construção. Temos o compromisso de ser uma empresa que acolhe e cuida das suas pessoas e isso traduz-se em comportamentos que promovemos a todos os níveis da organização.
Quais são os principais desafios na gestão de pessoas na atualidade?
A entrada da geração Z nas empresas representa um grande desafio – a relação com o trabalho e as expectativas são muito desafiadoras para as empresas, para a forma como nos organizamos e trabalhamos. Gerir ciclos mais curtos nas funções, movimentos de carreira mais rápidos, um balanço vida-trabalho equilibrado. Apesar da dimensão do desafio, no final ficaremos a ganhar – sermos mais ágeis e teremos uma vida mais equilibrada. Encontra-se sempre o caminho!
Que tendências perspectivas para o mundo do trabalho?
A digitalização é o presente (continuará a ser o futuro). A capacidade de adaptação será a chave do sucesso – baseada numa postura de aprendizagem ao longo da vida. Vamos trabalhar até mais tarde, mas espera-se que com mais equilíbrio, por isso há também a perspectiva de uma vida mais longa e realizada.
Nota-se muito que gosto de olhar para as oportunidades? Com um sentido de responsabilidade forte, mas como positividade e a acreditar na nossa capacidade de transformação.
Quais as principais estratégias e objetivos na gestão das pessoas da Bel para 2024?
A Bel celebra 20 anos em Portugal, por isso centro-me aqui para esta questão. Sob o mote “Pioneiros de um novo amanhã”, que mostra a nossa história, o nosso ADN, mas sobretudo que nos projeta no futuro. Um futuro que tem de ser novo. E tem de ser construído por todos nós. Esta perspectiva de antecipação do futuro, para nos prepararmos para ele é verdade nas várias dimensões. E, no caso das pessoas, passa por antecipar as competências do futuro e de nos prepararmos. De conhecermos as expectativas de crescimento dos colaboradores e encontrar neles as respostas às necessidades.
A nossa estratégia de gestão de talento para ter uma saúde organizacional robusta, mantendo a abertura e a curiosidade com o que se passa à nossa volta, é trabalhar em opções e cenários que nos deem flexibilidade e nos permitam continuar a ser os “pioneiros de um novo amanhã”.
“Acredito que a melhor forma de responder às necessidades do futuro é antecipá-las”.
Uma das mensagens na página principal do site da Bel é: “Acreditamos que o futuro das gerações é influenciado pela forma como agimos hoje”. Que mensagem gostaria de deixar aos líderes de amanhã?
Acredito que a melhor forma de responder às necessidades do futuro é antecipá-las. Isso requer curiosidade, abertura, criatividade e ação. Se cultivarem esses elementos, terão frutos para enfrentar os desafios – e as oportunidades – que o futuro nos traz!
Respostas rápidas :
Maior risco: a mudança para Recursos Humanos.
Maior erro: ter subestimado a transformação administrativa de RH.
Maior lição: a complacência na gestão da(s) equipa(s) paga-se cara.
Maior conquista: a confiança dos meus stakeholders na liderança de RH.