Opinião

Responsabilidade e liderança

António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal

Assistimos, no início deste ano, às imagens inacreditáveis do assalto ao Capitólio. Imagens indignas de um país com tradições democráticas fortemente enraizadas.

Foi mais um sinal do estranho mundo em que vivemos e uma lição sobre a necessidade de lideranças assentes em valores, em responsabilidade e no respeito pelos princípios básicos do Estado de Direito.

Terá sido o episódio final de um mandato que deixou a maior potência mundial desacreditada e um povo profundamente dividido. Para além deste triste legado, ficam questões que dizem respeito a todas as nossas sociedades, também na Europa:

Como limitar os riscos de ascensão, mesmo que por mecanismos legítimos, de líderes que possam pôr em causa os valores fundamentais por que nos regemos?

Como desconstruir o paradoxo que nos põe diante do risco de a tolerância ilimitada conduzir ao seu próprio desaparecimento e nos alerta para estarmos preparados para defender a sociedade tolerante do assalto da intolerância?

Como lidar com as redes sociais, em situações em que não é clara a fronteira entre censura e proteção dos cidadãos contra informações falsas e incitação ao ódio ou à violência. Como articular responsabilidade corporativa, autoregulação e lei na abordagem a estas questões?

Como restaurar a confiança e melhorar a qualidade das instituições em que se organiza a nossa sociedade?

Não tenho receitas fáceis para todas estas questões, mas não posso esquecer que os perigos para a democracia de lideranças fracas ou perversas são reais.

Lembro, a este respeito, uma parábola hebraica que, na sua sabedoria milenar, nos faz refletir: as árvores, querendo encontrar para si um rei, pedem sucessivamente à oliveira, à figueira e à videira que reinem sobre elas. Todas as três recusam, invocando as suas diferentes e nobres funções. Só o espinheiro se mostra disponível para ser rei.

Não nos podemos demitir da nossa participação na vida pública e queixarmo-nos, depois, por ela ficar capturada por quem dela se pretende aproveitar para atingir objetivos individuais, mais do que para servir o superior interesse público.

A nossa responsabilidade passa, em primeiro lugar, por uma atitude de cidadania ativa, individual e coletivamente, não receando assumir, se necessário, papeis de liderança, nem sempre cómodos, mas indispensáveis à preservação das instituições que defendemos.

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Antonio Saraiva

Antonio Saraiva

António Saraiva nasceu em novembro de 1953 em Ervidel. Diretor da Metalúrgica Luso-Italiana desde 1989 e administrador a partir de 1992, adquiriu a empresa ao Grupo Mello em 1996, sendo atualmente presidente do conselho de administração. Começou a sua carreira na Lisnave, aos 17 anos. Completou o Curso da Escola Industrial e frequentou o Instituto Superior Técnico. Foi membro da Direção da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos de Afins de Portugal (AIMMAP), de 2001 a 2003, vice-presidente de 2004 a... Ler Mais..

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