Opinião

Reinventar a Educação (ou menos sistema, mais resultados)

Carlos Sezões, coordenador da Plataforma Portugal Agora

O mundo mudou bastante nas últimas décadas para que tenhamos, em determinadas áreas, uma visão fundamentalista e avessa a qualquer mudança. Se queremos agir sobre uma realidade, devemos começar por compreender essa mesma realidade sem preconceitos ou mistificações. A Educação é um desses temas.

Não é frase feita, é mesmo a minha convicção: a Educação é a base de qualquer sociedade. Em Portugal, a educação foi objecto de um enorme esforço de investimento nos últimos 40 anos, tendo em mente o desafio quantitativo de massificar o acesso à escolaridade. Olhando para a oferta educacional e para as taxas de cobertura dos vários graus de ensino, esse desafio foi razoavelmente enfrentado e vencido.

Neste momento, na era da globalização e do conhecimento, o desafio é outro!  De natureza qualitativa, o desafio é o de dotar crianças e jovens de capacidades (pessoais e sociais) que lhes permitam, por um lado, uma saudável inserção na sociedade, e, por outro, aprendizagens e competências para enfrentarem os desafios da empregabilidade deste século XXI. Como tal, parece-me essencial equacionarmos ou repensarmos algumas questões críticas para os resultados que desejamos, nomeadamente: os modelos de ensino/ aprendizagem, os conteúdos e as metodologias pedagógicas, os modelos de gestão escolar, a responsabilidade da família e da comunidade envolvente.

Infelizmente, como cidadão relativamente atento a este tema, vejo que em Portugal se gosta mais de discutir o acessório e se perde a noção do que é essencial. O debate político amplificado pela comunicação social tem-se focado no “sistema”, em temas como as carreiras, as remunerações e as avaliações de professores; ou a primazia da escola pública vs. escola privada ou ainda os contratos de associação; ora se aborda o (complicadíssimo) sistema de colocação de professores ou o aparente facilitismo dos exames que nos leva a questionar se não estaremos a trabalhar para as estatísticas em vez de nos focarmos em impactos concretos.

Há que centrarmo-nos no que é essencial: os resultados! Por outras palavras, na aprendizagem e na sua consequente e adequada transferência.

Aplicando aqui a máxima “work smarter, not harder”, devemos começar por questionar “o que” aprender. Competências-chave deste nosso século envolvem não apenas uma componente cognitiva, mas cada vez mais a dimensão interpessoal – onde se destacam o pensamento crítico, a resolução de problemas, a comunicação, a colaboração (pessoal e virtual), aprendizagem em rede, a criatividade e a inovação. Estas são competências centrais para a elevação da nossa capacidade de aprender e do nosso propósito diferenciador que, hoje e ainda mais no futuro, nos distinguirão das máquinas e do respetivo machine learning.

Por outro lado, numa era em somos bombardeados por apps e notificações, é necessário dotar cada criança/ jovem de competências de pensamento computacional e gestão da carga informacional (o designado cognitive load management).

Depois, “o como”. Não acredito em modelos centralizados e mecanicistas de ensino, como distribuição massiva e unidirecional de informação. Há que garantir o conhecimento básico e, a partir de um certo nível, despoletar percursos mais individualizados, conforme as características socioeconómicas e culturais de cada escola. Na era da informação acessível e do micro-learning (por exemplo, através de um simples video no YouTube), a autonomia para “aprender a aprender” deve ser um objectivo vincado e assumido.

Teremos, ainda, um duplo desafio quantitativo e qualitativo: 1) inverter o cada vez mais evidente défice de profissionais nas áreas educativas – algo que, se nada for feito, tenderá a agravar-se até 2030 e 2) dotar os professores de competências-chave a função futura de dinamizadores dos processos de aprendizagem, num paradigma relacional fortemente interpretativo e dedutivo.

Quando? Agora! Pessoalmente, acredito que o caminho (já visível na última década) para uma vez maior autonomia das escolas para tomarem as suas decisões, o envolvimento mais intenso dos agentes locais (autarquias, associações, empresas) nas estratégias educativas e a responsabilização (de escolas, docentes e estudantes) em termos de resultados serão parte da solução para uma educação de excelência em Portugal.

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