Opinião
Reduzir ou não reduzir … as taxas? Eis a questão!

O Banco Central Europeu cumpre guião da reunião de abril: reduz as taxas em 0,25% para situar a taxa de depósito em 3,75%. Estamos perante o primeiro corte desta taxa de juro na União Europeia desde 2019 e o ponto final do ciclo de endurecimento monetário iniciado em julho de 2022.
Com isto, o Banco Central Europeu já é o quarto banco do G10, após o SNB, o Riskbank e o Bank of Canada, a iniciar o seu ciclo de flexibilização. A decisão surpreendeu poucos, mas o dado mais relevante da reunião de junho é a alteração que introduziram no comunicado: elimina a referência a futuros cortes.
Se a avaliação atualizada do Conselho de Governo aumentar ainda mais a sua confiança de que a inflação está a convergir para o objetivo de forma sustentável, será apropriado reduzir o atual nível de restrição da política monetária, o texto refere que “o Conselho de Governo vai continuar a aplicar uma abordagem dependente dos dados e de cada reunião”. A declaração sobre a decisão de política monetária foi clara: “o Conselho de Governo não se compromete de antemão a seguir uma trajetória de taxas determinada”.
Christine Lagarde não se quer comprometer de antemão com novos cortes. Está a adotar a abordagem gradual e prudente, como os demais bancos centrais, e vai reavaliar a situação, reunião a reunião. A velocidade e o calendário dependerão dos dados de inflação.
Uma pausa em julho?
O Banco Central Europeu tem elevado as suas previsões de inflação para 2024 e 2025, o que implica que este corte inicial poderá não assinalar o início de um ciclo de flexibilização sustentável. E é uma interpretação de que a previsão implica cortes muito graduais das taxas de juro.
Prevê-se uma pausa em julho, antes de o Banco Central Europeu voltar a fazer cortes em setembro e dezembro. A trajetória das taxas do BCE dependerá da evolução dos dados daqui para a frente e da Fed, que não poderá fazer cortes este ano dada a rigidez da inflação americana. É provável que as recentes surpresas em alta dos salários e da inflação mantenham os membros do Conselho numa posição prudente.
Os riscos inclinam-se para menos cortes, principalmente devido a uma inflação rígida dos serviços, um mercado laboral resistente, condições financeiras menos estritas e considerações de gestão de riscos do Banco Central Europeu, que prevê mais dois cortes em 2024.
Não é o típico ciclo de cortes!
Este não é o típico ciclo de cortes. Não se trata de um regresso ao mundo que conhecíamos, em que a inflação estava consistentemente bem abaixo da meta de 2%. Com os mercados de trabalho ainda tensos e a produtividade fraca, as pressões internas sobre os preços podem manter a inflação próxima ou acima de 2%.
Continuaremos a acompanhar de perto as expetativas de inflação, a evolução salarial e a inflação dos serviços. São indicadores-chave da persistência da inflação que determinarão o ritmo e o alcance do ciclo de corte de juros do Banco Central Europeu.
Inflação e salários.
A decisão dependerá dos próximos dados económicos, principalmente da inflação e da evolução salarial, como Christine Lagarde voltou a afirmar durante a conferência de imprensa. Espera que o cenário económico europeu confirme a tendência de recuperação após a fase de estagnação dos trimestres anteriores, mas não é percebido como forte o suficiente para gerar um risco de inflação.
Alguns membros do comité querem observar avanços significativos no futuro antes de apoiar outro ajuste de taxas de juro. A outros pode agradar que a Reserva Federal dos EUA se una à trajetória da normalização antes de se aventurarem demasiado. E é até que ponto o BCE pode divergir da Fed. A margem de divergência é limitada, visto que os sinais que estão a aparecer sobre o abrandamento dos EUA darão à Fed mais margem de manobra. As últimas semanas demonstraram que, para além das políticas dos bancos centrais e das tendências da inflação, a política interna e o seu impacto nas relações internacionais são determinantes importantes dos mercados financeiros e da orientação económica.
A dinâmica de desinflação continuará a ser acidentada nos EUA, bem como na União Económica e Monetária, mas que permitirá, no entanto, que os principais bancos centrais comecem (Fed, BoE) ou continuem (BCE) a reduzir as taxas antes do final do ano.
O número de cortes dependerá em grande medida dos números da inflação e das perspetivas do mercado de trabalho, uma vez que os bancos centrais estão dispostos a ver pressões decrescentes provenientes dos salários, ou números de produtividade mais elevados que se traduzam em pressões inflacionistas mais baixas. Isto traduz-se num ambiente ligeiramente construtivo para os ativos de risco!