Entrevista/ “Queremos tornar a Seedrs líder global no mercado de investimento”

Filipe Portela, Regional Manager Ibéria da Seedrs

Aos 37 anos, e com um percurso profissional pouco convencional, Filipe Portela gere o desenvolvimento ibérico da plataforma equity-crowdfunding Seedrs. Com o Link to Leaders partilhou a ideia de que Portugal tem todas as condições para criar negócios à escala global.

Como é que um fisioterapeuta de formação passa a ser empreendedor e aposta em negócios com especial enfoque na tecnologia e nas causas sociais?
Fisioterapeuta de formação, mas empreendedor de coração. Desde a juventude que estou envolvido em novos negócios e projetos e foi durante um “Gap Year” entre o secundário e a universidade que me dediquei em full-time pela primeira vez a uma “start-up”. A tecnologia entra por uma questão de gosto pessoal e porque se queremos um negócio escalável e com impacto, dificilmente evitamos a tecnologia.

O impacto social surge pela vontade de ajudar o próximo, aliada a uma descrença nos atuais sistemas de modelo de negócio. Sou defensor da iniciativa privada, contudo não acredito que os modelos atuais, que não se preocupam com a sustentabilidade dos recursos que utilizam (desde os materiais aos humanos), sejam sustentáveis a longo prazo. Acredito que dentro de uma década os negócios sobreviventes serão aqueles com fortes preocupações de sustentabilidade e/ou de retorno do impacto que têm na comunidade. E podemos ver provas disso diariamente, incluindo no mercado de ações, com as empresas mais sustentáveis a terem melhor performance a longo prazo do que as restantes.

Liderou a Ingeniu.com, um dos primeiros sites e-commerce em Portugal. Que balanço faz da experiência?
A Ingeniu.com é um projeto de irmãos e amigos, iniciado em 2003 e literalmente na garagem de casa. Foi de facto um dos primeiros negócios online em Portugal e, em 2008, um dos primeiros a adotar uma estratégia omnichanel com bastante sucesso. Como tal, na altura esperávamos ficar riquíssimos com tanta inovação e a vantagem de sermos first-movers. Obviamente tal não aconteceu, mas divertimo-nos imenso, erramos muito, aprendemos ainda mais e acima de tudo, comprovamos que Portugal tem todas as condições para criar negócios à escala global.

E a HealthySystems? Como surgiu a ideia de criar esta start-up?
A HealthySystems nasceu de um encontro casual com antigos professores do mestrado de Informática Médica, numa empresa onde estava a estagiar. Eles tinham já o produto e a tecnologia e precisavam de alguém que os ajudasse a estruturar o negócio e o arranque de uma potencial empresa. O facto de eu ser alguém com background em saúde e tecnologia, e de já nos conhecermos, só ajudou. A empresa cresceu e continua a crescer rapidamente, sendo hoje uma referência internacional no que toca a segurança, proteção e confidencialidade dos dados de saúde digitais. Entretanto, cedi a minha posição na empresa para iniciar outro projeto inovador noutra vertente: a Fundação+Mais, a primeira entidade privada 100% dedicada aos negócios sociais e investimento impacto.

Em 2016 passou a integrar a equipa da Seedrs. Como encarou este desafio?
Eu já era um investidor ocasional na Seedrs e acompanhava o seu rápido crescimento, principalmente pela curiosidade de ter um cofundador português. Na altura não estava à procura de emprego até porque estava a full-time no lançamento do Impact Hub Lisbon, mas fiquei curioso e quis saber mais quando vi uma posição aberta para o lugar de Business Developer para Portugal. Ao falar diretamente com o Carlos Silva (cofundador), percebi que ali era um local onde queria estar, uma ótima experiência de aprendizagem e um grande desafio. Isto, porque já tinha tido a experiência de trabalhar em start-ups e em multinacionais, mas ainda não tinha a experiência de passar por uma scale-up (empresa em rápido crescimento). Entre outros, a Seedrs é a 1.ª plataforma global a ser regulada financeiramente, 1.ª plataforma a ter um passaporte financeiro MiFID, 1.ª plataforma a lançar um portfolio update sobre todos os investimentos realizados e a 1.ª plataforma a lançar um mercado secundário de ações das empresas investidas. Que boa viagem tem sido.

O que espera conseguir na Seedrs?
É nosso objetivo tornar a Seedrs líder global no mercado de investimento no capital de start-ups, pelo que espero contribuir para tal no que respeita à região do sul da Europa. Dentro deste objetivo geral, tenho um gosto pessoal que Portugal seja uma referência em termos de investimento e empresas investidas (sendo que já o é relativamente ao tamanho da população).

De que forma o modelo de equity crowdfunding é cada vez mais a resposta viável para os negócios em fase inicial de crescimento?
Como exemplo, a Seedrs apareceu no mercado em 2012 e como uma resposta alternativa ao mercado tradicional de investimento. Até ao momento foram já investidos mais de €420 milhões em ~630 campanhas sendo que, em 2016 e 2017, foi o investidor mais ativo do Reino Unido em empresas early-stage.
Este modelo é agora uma primeira opção para muitas empresas em fase de forte crescimento, principalmente porque é um modelo relativamente rápido: média de quatro meses entre a candidatura e os fundos no banco; eficiente: toda a comunicação é realizada com uma única entidade, que depois gere toda a comunidade de investidores; incentiva co-investimentos: a plataforma não pretende ser um substituto, mas sim um complemento aos investidores institucionais tradicionais, permitindo-lhes diluir o seu risco e assim investir em mais start-ups.

Estudos mostram também que as empresas financiadas com um misto de crowd e investidores profissionais, têm melhores performances durante e depois das campanhas; com custo acessível: as fees são pagas apenas em caso de sucesso da campanha e em percentagem do valor angariado e incluem todos os documentos legais de nível profissional; inclui uma forte campanha de comunicação e marketing: qualquer campanha de crowdfunding deve ser encarada na sua génese como uma campanha de comunicação e marketing, já que a empresa, os seus produtos e serviços vão ser comunicados para toda a comunidade física e digital dos fundadores, família e amigos, bem como da própria plataforma (só na Seedrs são +300.000); e muito importante, este modelo permite a criação de fortes e envolvidas comunidades: cada vez mais o tamanho e a qualidade da comunidade de uma empresa pode fazer a diferença entre a mesma ter ou não sucesso num mercado global e competitivo.

Ao realizar uma campanha de crowdfunding, a empresa está a envolver ativamente e financeiramente uma média de 300 investidores, espalhados por toda a Europa que têm todo o interesse em que a empresa tenha o maior sucesso possível, logo vão ajudar como conseguirem que a empresa alcance esse sucesso. Reflexo disto é o número de empresas cotadas em bolsa ou com investimentos avultados já confirmados, que mesmo assim quiseram utilizar a Seedrs para ter acesso a esta comunidade.

Que motivações o levaram a optar por um MBA na Porto Business School?
Depois da união do mundo da tecnologia com a saúde com o Mestrado em Informática Médica e, apesar de já estar e ter estado envolvido em algumas start-ups, tudo estava a ser realizado pelo “senso comum” e auto aprendizagem, pelo que senti que me faltavam algumas bases e alguma consolidação de conhecimentos a nível de gestão. Depois de estudar várias hipóteses de formação, a nível nacional e internacional, no final, o Magellan MBA da Porto Business School foi uma escolha quase óbvia, principalmente por três fatores: a relação qualidade/preço: excelente qualidade dos professores nacionais e internacionais, ótimo programa curricular com uma exigente carga horária, dupla certificação internacional e tudo a um preço relativamente acessível; a ligação com empresas: embora acredite que a teoria seja necessária, acho-a apenas introdutória, logo uma forte relação com as empresas e com o se passa no terreno era algo que procurava e sem dúvida que a PBS tem essa conexão; e o profissionalismo de todas as pessoas dentro da escola, desde o front-office até aos colaboradores do bar, todos estão envolvidos com a escola, com os alunos e preocupados em providenciar uma experiência agradável. Um ótimo efeito-secundário desta relação, é que não estranho ver frequentemente alunos de há vários anos, passarem pela escola apenas para ir dizer um “Olá” ou tomar um café com a equipa.

Quais os desafios que esta formação o obrigou a enfrentar?
Um dos principais desafios foi a gestão de recursos, principalmente do tempo, como arranjar tempo para aprender tanta matéria nova, concluir os trabalhos pedidos com rigor e estudar para os exames. Chegamos a colocar em causa a própria sanidade. No final tudo corre bem e saímos mais fortes do que entramos.

Nos vários projetos em que está envolvido, enquanto investidor, gestor e orador, de que forma o MBA foi importante?
Há sem dúvida uma altura antes e uma depois do MBA na minha vida. Sempre tive vontade de fazer várias e diferentes coisas, mas só depois do MBA tive a rede de contactos, a autoconfiança e os conhecimentos necessários para de facto fazer acontecer os meus objetivos. No meu caso não creio que tivessem sido alcançados sem a realização do MBA.

Como definiria o seu percurso profissional até chegar aqui? Quais as experiências mais impactantes e as que mais definiram o seu perfil profissional até chegar às atuais funções?
Estou confiante ao dizer que um percurso de um fisioterapeuta que gere o desenvolvimento de negócio ibérico da plataforma líder europeia de equity-crowdfunding não é de todo um percurso tradicional. Não se pode dizer que tenha sido também um percurso planeado. A curiosidade e a vontade de aprender sempre foram drivers importantes para mim e sempre me senti desafiado a sair da minha zona de conforto criando conexões entre diferentes sectores. Isto na criação da Ingeniu, ou quando era Fisioterapeuta e investi na Fisioterapia Dermato-Funcional (Cosmética), ou quando fui o primeiro fisioterapeuta a entrar no Mestrado de Informática Médica da Fac. Medicina da Univ. Porto e na tese juntei o mundo da Saúde ao da tecnologia ao fazer um estudo do impacto de videojogos na terceira idade (impacto muito positivo já agora, se bem aplicado), quando fui desafiado a criar a Fundação+Mais e quando trouxe o Impact Hub para Lisbon  de forma a para pensar e aplicar novos conceitos e ferramentas para os negócios sociais e investimento de impacto, até agora mais recentemente com a Seedrs, onde estamos a criar de raiz um novo mercado de investimento em startups.

Não há uma “receita” ou uma resposta certa para um percurso de “sucesso” mas eu acredito em três aspetos muito importantes: a paixão: quando gostamos e acreditamos no que estamos a fazer e para o que estamos a contribuir, o trabalho é um prazer; trabalhar com afinco: nem sempre conseguimos os melhores resultados, mas há que trabalhar para isso; e  não ser o mais inteligente da sala: isto faz-nos ser proativos, ir atrás de respostas, procurar ajuda de pessoas que sabem realmente o que fazem e assim criamos uma boa rede de contactos que nos podem ajudar em determinados assuntos.

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