Opinião

Qual é a sua canção de liderança?

João Vieira da Cunha, escritor

Em julho de 2021 acabou o teletrabalho na escola de gestão onde sou diretor de investigação. Fizemos um evento para marcar o regresso. Uma das partes desse evento incluía um breve discurso de cada diretor. Cada um de nós tinha que escolher uma música que tocaria quando entrássemos no palco para discursar.

Pense nisso. Se você tivesse que discursar para os seus colaboradores depois de um ano e meio de Covid-19, que canção é que escolheria?

A decisão é importante porque qualquer coisa que quem manda faz é um ato simbólico. As pessoas interpretam tudo o que o chefe faz, mesmo que não haja nenhuma intenção por parte do chefe de comunicar o que quer que seja. É talvez por isso que os líderes são postos em espaços fechados, mesmo quando quem trabalha está em ‘open space.’ Fechar os líderes em gabinetes reduz os momentos em que os líderes estão visíveis e, por isso, reduz a quantidade de coisas que os líderes dizem e fazem que são interpretadas pelos colaboradores.

É talvez também por isso que muitas das interações entre líderes e colaboradores são formais e também coreografadas. Porque o dia a dia no trabalho, especialmente em trabalhos em que se preenchem papéis e se fazem slides, é cheio de ambiguidade e incertezas. Há ambiguidade e incerteza porque ninguém sabe se está a fazer bem o seu trabalho porque o que se produz é difícil de avaliar. Ou pior, a avaliação do que se produz é profundamente subjetiva e individual. É fácil de passar de bestial a besta de uma semana para a outra, mesmo que não se mude nada.

Também há ambiguidade e incerteza porque os processos que sustentam este tipo de funções são fáceis de redesenhar, mesmo que não sejam fáceis de mudar. Uma linha de montagem não pode ser redesenhada de um mês para o outro, mas a organização de uma equipa de vendas pode. Claro que as pessoas podem resistir e tornar a mudança difícil, mas isso só aumenta a incerteza e ambiguidade.

Em situações de incerteza e ambiguidade as pessoas usam tudo o que têm à mão para procurar estabilidade e previsibilidade. É para isso que servem os horóscopos e o tarot. Para antecipar um futuro que não é possível prever, mesmo que se saiba ler muito bem uma carta astral.

Nas empresas, os movimentos dos planetas ao longo de desenhos imaginários que unem estrelas, são substituídos pela observação dos líderes. E tal como para a astrologia não interessa se as estrelas são mesmo capazes de comunicar o futuro, para os colaboradores não interessa se o que os lideres dizem e fazem tem como intenção transmitir o que os lideres pensam e o que pretendem fazer.

Não há mais nada para prever o futuro e a incerteza é uma experiência difícil. Às vezes não há nada mais do que o caminho dos planetas e o comportamento dos líderes para antecipar o que nos vai acontecer e por isso é para eles que olhamos para ver o futuro.

Qualquer coisa que os lideres fazem é um ato de comunicação, quer eles queiram quer não. Quando essa comunicação é formal e cerimonial, todos os detalhes são escrutinados, mesmo a escolha da canção. Por isso, todos os detalhes do que dizemos e fazemos enquanto líderes, meso a canção que escolhemos para a nossa entrada em palco, conta e conta muito.

Sabendo isto tudo, se tivesse de escolher uma música para a entrada do seu discurso de regresso ao escritório qual é que escolheria? (Se precisar de ajuda para decidir, que tal dar uma vista de olhos ao meu livro ‘Descubra a sua voz de liderança´).

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João Vieira da Cunha

João Vieira da Cunha

João Vieira da Cunha é escritor. Utiliza uma variedade de meios para partilhar as suas ideias, desde as mais prestigiadas revistas científicas na área da gestão até uma conta rebelde no Twitter. É doutorado em Gestão, pela Sloan School of Management do MIT, e Mestre em Comportamento Organizacional, pelo ISPA. A sua escrita tem um tom irónico e provocador. O objetivo é ajudar os gestores a refletir sobre o que é liderar na Era da Informação. A esperança é que... Ler Mais..

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