Opinião

O que não se mede, não se gere!

Alberto Jorge Ferreira, CEO Future Compta

Esta frase, atribuída a Peter F. Drucker, para muitos, onde me incluo, o pai da Gestão Moderna é tudo menos consensual, a começar pelo facto de o próprio Instituto Drucker garantir que nunca foi proferida pelo próprio, e por conter imensas variações semânticas da frase que acabam por retirar o seu conceito mais importante “O que não se mede, não se pode melhorar”.

Já em 1956 V. F. Ridway criticava fervorosamente este mantra da gestão moderna e como podem imaginar não é minha intenção, nem objetivo, trazer luz sobre um tema em discussão há mais de 60 anos, embora esta abordagem crítica contenha em si alguma verdade, dado que foca sobre as consequências disfuncionais da medição de performance, no seu nome original “Dysfunctional Consequences of Performance Measurements”, ou seja, dos efeitos negativos da tomada de decisão precipitada, sobre indicadores sem a devida análise dos seus efeitos, reações e consequências.

Também a utilização de indicadores, enquanto objetivos cegos de performance, distorcem, na grande maioria dos casos, os resultados dos próprios indicadores. Vejamos a atual situação de alguns “call centers” onde são definidas métricas por número de chamadas atendidas, ao invés de definir indicadores de concretização, os resultados são as inúmeras chamadas automaticamente desligadas assim que atendemos, com isso atingem o objetivo e ficam com mais tempo para realizar ainda mais chamadas inúteis, mas o resultado não é seguramente o esperado por quem contrata esse serviço.

Por outro lado, é importante manter presente que existem domínios onde a produção de indicadores não adiciona valor ou a subjetividade é tão elevada que o exercício é inútil. Atualmente existe uma tendência de gerir “A felicidade”, o que pressupõe criar indicadores sobre a felicidade, mas eu acredito que tais indicadores não possuem uma linearidade que nos permita modelar a sua performance, tornando o exercício de uma complexidade extrema e sem resultados credíveis. Imaginem o exercício teórico de modelar tudo o que pode fazer um ser humano feliz, obviamente que existem indicadores base relacionados com as necessidades humanas, vejam por exemplo a pirâmide de Maslow onde, teoricamente, estão representados os degraus que precisamos subir para alcançar a felicidade.

Partilho, com base na minha experiência, a importância das medições no exercício de gestão e na sua contribuição para a tomada de decisão mais atempada e informada.

No início da minha carreira, quando a Gestão de Projetos começou o seu caminho de profissionalização em Portugal, era comum ouvir frases como “antes de termos um gestor de projeto isto estava tudo bem” ou “mas porque é que os projetos agora estão todos maus”. Obviamente que estas frases tinham por base o completo desconhecimento do estado dos projetos, a inexistência de gestão e os indicadores de performance sobre os trabalhos em curso não permitia saber se estavam bons ou maus até ser demasiado tarde para uma qualquer tomada de decisão.

Felizmente hoje é reconhecida a importância de uma gestão eficiente de projetos e com indicadores (medições) que nos permitem tomar decisões atempadas, mas, infelizmente, não é preciso recuar muitos anos para recordar situações em que embora com indicadores criados, mas uma gestão ausente ou ineficiente, os resultados foram igualmente desastrosos.

É, por isso mesmo, curioso verificar que não existe reciprocidade entre medição e gestão, ou seja, para uma eficiente gestão são necessárias medições e indicadores, mas o que se mede não se torna automaticamente gerido, embora, de forma muito superficial, seja natural que tal possa acontecer pelo simples facto que a criação do indicador atrai atenção para o tema em questão.

E é nesta relação simbiótica entre indicadores, processos de gestão e uma boa dose de bom senso que reside a eficiência e uma boa performance.

Bom senso porque muito facilmente, e frequentemente, o foco passa a ser a geração de indicadores inúteis e insignificantes, que não agregam valor no processo de gestão e geram uma carga desnecessária nas organizações.

A geração de indicadores, assume assim, uma importância primordial na gestão de performance seja individual, coletiva, de empresas ou pessoal.

É através da criação de indicadores, e da sua atualização periódica e constante, que se obtém informação que nos permite tomar decisões sobre o curso da ação. Reparem num exemplo que estará seguramente presente em todos, os indicadores do SNS sobre a pandemia, descartando algumas interpretações menos inteligentes sobre esses mesmo indicadores e focando apenas no processo de gestão da vacinação e das fases de desconfinamento, num espaço de um ano e meio, sensivelmente, fomos inundados, felizmente a meu ver, por indicadores que foram essenciais à gestão de todo o processo, mas também na forma como sustentaram, e deram corpo, à comunicação com o público em geral, a disponibilização de indicadores diários permitiu a todos acompanhar a evolução, e alguns recuos, ao longo de todo o processo. Conseguem imaginar uma ação desta magnitude sem a geração de indicadores?

Para além destas virtudes, os indicadores possuem um efeito dinamizador e de incentivo de grande relevo, não é por acaso que os atletas de alta competição, e até os comuns mortais com uma qualquer aplicação de ginásio ou um relógio digital, registam indicadores de performance de forma regular, isso permite, tal como no exemplo anterior, perceber a evolução do seu plano pessoal de treino, mas tem também um outro efeito fundamental, sempre que atingimos um determinado objetivo, definido por um indicador e a sua medição, queremos mais e elevamos o objetivo, é comum ver alguém que começou por fazer uma caminhada no bairro após algum tempo estar a fazer maratonas, obviamente sabemos que a satisfação que o exercício físico nos trás, pela produção química de testosterona, adrenalina e endorfinas, entre outras, se torna viciante e que, é só por isso, essencial para que tenhamos sempre vontade de fazer mais, mas a satisfação pessoal em ultrapassarmos os objetivos a que nos propomos é igualmente viciante.

O conselho é que comecemos por criar indicadores básicos, simples, profissionais e/ou pessoais, que nos permitam medir progresso, à medida que vamos entendendo a performance, ou falta dela, vamos introduzindo mais indicadores, desta vez sobre ações concretas que pretendemos avaliar o seu efeito, analisemos o comportamento como um todo, e é da análise de performance introduzida pelos segundos indicadores que conseguiremos entender o sucesso das ações. Depois é ir corrigindo e elevando a fasquia na justa medida dos nossos sonhos, parece simples, e acreditem que é, e tal como o exercício físico torna-se viciante. Uma última dica, não estabeleçam metas impossíveis de atingir, uma meta atrás da outra costuma resultar melhor.

Hoje deixo-vos um livro que embora escrito em 1993 possui, para mim, muitos pensamentos surpreendentemente atuais sobre Sociedade, Política e Conhecimento, “Sociedade Pós Capitalista” by Peter F. Drucker, com um prefácio sobre Portugal escrito em 2003 para a edição portuguesa.

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Alberto Jorge Ferreira

Alberto Jorge Ferreira

Alberto Jorge Ferreira é um gestor executivo de renome internacional, que já liderou a transformação e renovação de empresas em 14 países e nos quatro continentes, sendo especialista na restruturação e transformação digital de organizações com as mais diferentes culturas e realidades de negócio. Formado em informática, pela Universidade Autónoma de Lisboa, iniciou a sua atividade profissional há mais de 30 anos, na Marinha de Guerra Portuguesa. Após a licenciatura, concluiu uma Pós-Graduação em Gestão de Projetos na mesma instituição... Ler Mais..

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