Opinião

O novo reporte ESG – agora sim, o paradigma vai mudar!

Margarida Couto, presidente do GRACE*

No último dia de julho, quando tantos de nós se preparavam para ir (ou já estavam!) de férias, eis que a Comissão Europeia aprovou a versão final dos tão esperados ESRS (European Sustainability Reporting Standards).

Pode parecer só mais um novo acrónimo da densa “sopa de letras” que resulta do European Green Deal, mas é bem mais do que isso e é bom que nos preparemos para as múltiplas decorrências da aprovação dos ESRS – a partir de 2024, e ainda que de forma faseada, as demonstrações de sustentabilidade passarão a ter a mesma relevância que as demostrações financeiras. E não, não é só para as empresas cotada e para as grandes instituições financeiras! Em 2025, este novo “reporte ESG” passa a abranger também todas as grandes empresas, leia-se, todas aquelas que não sejam PMEs.

São assim mais de 50.000 empresas na UE – estima-se que quase 900 das quais em Portugal – que terão de divulgar matérias tão vastas quanto: (i) as suas política e objetivos de sustentabilidade, com descrição do progresso registado em cada ano; (ii) que órgãos/departamentos internos são responsáveis pelas matérias de sustentabilidade e que grau de expertise detêm; (iii) que incentivos ao desempenho de sustentabilidade existem, nomeadamente em termos de remuneração variável da gestão de topo; (iv) em que medida a trajetória da empresa é compatível com a transição para uma economia sustentável, incluindo no que se refere ao aumento máximo da temperatura em 1,5ºC; (v) quais são os principais riscos de sustentabilidade que a empresa enfrenta, tanto nas suas operações quanto na sua cadeia de valor; (vi) que processos de due diligence estão implementados para identificar os principais impactos adversos da atividade da empresa, com indicação das ações adotadas para os prevenir, mitigar ou remediar. E por aí fora, porque é mesmo muito extensa a informação a divulgar.

Os ESRS compreendem 12 standards de reporte (2 “cross-cutting”, 5 “do E”, 4 “do S” e 1 “do G”), os quais estabelecem de forma muito detalhada (e prescritiva!) o modo como as empresas devem reportar a diversa informação de sustentabilidade – ambiental, social e de governance. O facto de estes novos standards serem obrigatórios na UE assegura a comparabilidade dessa informação. O facto de a mesma passar a ser objeto de auditoria confere-lhe fidedignidade, e contribui para combater o greenwashing, essa praga de descrédito que tem infetado os esforços de tantos. E a circunstância de ter de ser submetida em formato machine-readable (com recurso à linguagem XBRL), de acordo com tags previamente determinados (à semelhança do que já sucede com a informação financeira das empresas cotadas), garante acessibilidade aos relatórios ESG por todos os stakeholders, de uma forma que permitirá contrastar todo o tipo de informação “com um mero clique” (no futuro European Single Access Point) e tomar decisões em conformidade.

É todo um novo paradigma, uma verdadeira “revolução” que mudará para sempre a paisagem do reporte anual das empresas! E sim, é verdade que só aparentemente é que as PMEs ficam de fora deste movimento e anunciar o contrário não lhes presta um bom serviço – sabendo-se que integram cadeias de valor de empresas maiores, as pressões de sustentabilidade a que estas estão sujeitas projetam-se necessariamente sobre as PMEs suas fornecedoras.

Os dados estão lançados e os ESRS são incontornáveis. Num certo sentido, para todas as empresas em geral, independentemente do respetivo tamanho.

Mas é essencial compreender que o reporte ESG não é – não deve ser! – um fim em si mesmo, mas antes o resultado da execução de uma estratégia de sustentabilidade destinada a tornar a empresa mais competitiva e resiliente. Desta forma, olhar para os ESRS como uma infindável pilha de novas obrigações, corresponde a sacrificar, às mãos da tirania da compliance, as imensas oportunidades de diferenciação que uma adequada estratégia de sustentabilidade pode oferecer.

Para o GRACE é cada vez mais claro que as empresas que adotarem mais cedo essa estratégia são aquelas que chegarão mais fortes ao futuro. E é por isso que continuaremos a dedicar um elevado esforço ao desenvolvimento de ações de consciencialização dos nossos Associados para todas as oportunidades que estes novos e inescapáveis desafios encerram. Acreditamos que saber detetar oportunidades onde os outros vêm dificuldades continuará a ser uma chave que abre as portas do futuro e queremos ser um acelerador do ecossistema empresarial português rumo a um futuro cada vez mais sustentável!

 

*Em representação da Vieira de Almeida & Associados – Sociedade de Advogados

Comentários
Margarida Couto

Margarida Couto

Margarida Couto é licenciada em Direito e pós-graduada em Estudos Europeus, pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa. Integra a Sociedade de Advogados Vieira de Almeida & Associados (VdA) desde 1988, sendo a sócia que lidera a área de prática de Telecomunicações, Media e Tecnologias da Informação e a área de prática do Terceiro Sector e Economia Social. É a sócia responsável pelo Programa de Pro Bono e de Responsabilidade Social da VdA, presidindo ao Comité Pro Bono... Ler Mais..

Artigos Relacionados