Opinião

Kinderpedia, a plataforma romena que quer transformar a educação em Portugal

Evelina Necula, cofundadora e diretora de marketing da Kinderpedia

“O que queremos ver no futuro da educação é a tecnologia a ajudar os professores, os alunos e as escolas”, afirmou Evelina Necula, cofundadora e diretora de marketing da Kinderpedia, uma plataforma  de comunicação e gestão dedicada à educação e direcionada para escolas e jardins de infância. Está em Portugal há cerca de um ano e meio, é utilizada por instituições em todo o mundo, continua empenhada na internacionalização e equaciona uma nova ronda de investimento no próximo ano.

Conectar escolas, professores, alunos e pais na mesma plataforma, otimizando os processos administrativos e de comunicação, é o objetivo da Kinderpedia, uma start-up criada na Roménia, em 2015, que criou uma solução completa de comunicação e gestão para a educação nas escolas. Através da tecnologia, ajuda a transformar a forma como as escolas funcionam otimizando os processos administrativos e colocando a ligação aluno-professor-pais no centro do ato de aprendizagem.

A Kinderpedia está alojada na nuvem, em Amazon Web Services, é multi-idioma e multi-moeda e funciona como uma aplicação móvel nativa no Android e iOS. A plataforma ajuda os professores a pouparem entre 6 a 9 horas por semana e é utilizada por mais de duas mil escolas e jardins de infância em 14 países, em quatro continentes, totalizando quase 200 mil utilizadores.

Chegou a Portugal há pouco mais de ano e meio, onde já está a ser utilizada em várias instituições e a criar parcerias sólidas que lhe permitam expandir o seu raio de ação. De visita Portugal, Evelina Necula, fundadora e diretora de marketing da Kinderpedia, explicou ao Link To Leaders como o projeto evoluiu globalmente e o que espera alcançar no futuro.

O que é exatamente a Kinderpedia e o que faz?
É uma solução de comunicação e de gestão de escolas que responde às necessidades quer de escolas quer de jardins de infância e que traz cinco tipos de benefícios. Por um lado, simplifica a administração das escolas. Com a plataforma, os diretores de escolas têm tudo num único local, toda a sua arquitetura de utilizador, todas as suas aulas, tudo o que está relacionado com a performance da escola…Basicamente, todo o seu planeamento, monitorização e relatórios da atividade da escola ou do jardim de infância está num único lugar.

Ao mesmo tempo é uma ferramenta de gestão de aulas, o que significa que simplifica o trabalho do professor, porque no mesmo interface, que está disponível na internet e no mobile, e na app nativa para a escola e para a famílias, os professores podem fazer o seu horário de trabalho, de aulas.

Usam o seu telefone para marcar reuniões, agendar tarefas, dar feedback a alunos e a pais, fazer observações, disponibilizar recursos educacionais e manter uma comunicação e uma colaboração interativas, quer dentro da sala de aula, quer para quem está longe e têm que fazer atividades síncronas.

A Kinderpedia também é uma janela aberta para os pais saberem mais sobre a atividade dos filhos na escola, e assim serem capazes de os apoiar e colaborar com os professores quando necessário. Isto é particularmente importante porque a comunicação, transparência e colaboração é o que impulsiona significativamente o progresso das crianças, especialmente nos primeiros anos.

Lembro uma pesquisa que foi feita em 2018, pelo Global Family Research Fund, que são os seguidores do Harvard Family Research Project, e que demonstra que o envolvimento da família na educação é um dos melhores indicadores do sucesso da criança na escola, mas também na vida.

Então o que estamos a fazer é construir confiança entre os professores e a família de forma a eles serem capazes de colaborar, de comunicar com transparência e levar apoio às crianças de uma maneira coerente.  Acrescento isto como um benefício adicional, que ajuda imenso. E é uma verdadeira ajuda para o valor da escola, que tem uma janela aberta para as atividades das crianças.

E além destas possibilidades?
Você também pode ver os recursos, as atividades e constatar que a construção da unidade da escola, molda a escola e o lugar que queremos que ela tenha na sociedade do século XXI. Que seja um elemento chave, não apenas algo adicional, nem subsidiário. Não o lugar onde deixamos as crianças quando vamos trabalhar, mas o lugar que verdadeiramente molda personalidades e desenvolve as skills necessárias para o século XXI.

Outro benefício importante, e que liga escolas e jardins de infância, é o que está relacionado com monitorização do progresso das crianças. O que falei até agora é muito o dia a dia das capacidades da escola, mas no fim não queremos saber só o que acontece no dia a dia. De tempos a tempos, queremos poder olhar e ver em que estágio de aprendizagem o meu filho está, onde era suposto estar, e em que ponto ele está em determinada altura. Este é um dos recursos de que estamos mais orgulhosos porque é extremamente flexível, altamente configurável, chama-se Child Monitoring Progress, o módulo de desenvolvimento da criança.

Este módulo é baseado em templates que cada escola pode personalizar às suas próprias necessidades e fazer relatórios que podem mostrar, por exemplo, se uma criança está bem desenvolvida, se precisa de ajuda. É algo muito simples de aplicar nas atividades do dia a dia. Depois de três meses a fazer observações, os professores podem construir um relatório que demonstra que uma certa criança está mais desenvolvida em literacia, mas que precisa de ajuda em matemática, ou seja no que for. Com este tipo de observações, é possível construir lições personalizadas para cada aluno. Além disso podem partilhar este tipo de relatórios com os pais, para suportar o talento de uma criança ou ajudá-las a recuperar sempre que necessário.

Portanto, gestão de escola, gestão de aulas, engagement, progresso das crianças e gestão financeira são os cinco benefícios principais que a Kinderpedia traz de valor às escolas e aos jardins de infância.

Estão nos jardins de infância e nas escolas… qual o vosso principal target?
Uma das particularidades da Kinderpedia, e que nos torna especiais, é o facto de nos dirigirmos aos dois de forma igual. Porque para as funcionalidades de engagement dos pais, estamos muito próximos dos jardins de infância porque eles querem ter a certeza de que conseguem aliviar a ansiedade dos pais, de que constroem confiança, que têm pais que colaboram a moldar o caracter e as skills críticas das crianças.

Temos as ferramentas de gestão de aulas que também traz benefícios excecionais para os alunos porque os ajuda a tornarem-se mais conscientes dos seus projetos, a tornarem-se mais responsáveis. Por isso, sim, dirigimo-nos aos dois e particularmente, dirigimo-nos às instituições que tenham os dois tipos de ensino. Porque esse tipo de instituições não quer trabalhar com uma ferramenta para a parte do jardim de infância e outra diferente para a parte da escola porque isso é quebrar a ligação e deteriorar a experiência de utilizador. Estamos a fazer franchising com instituições que tenham as duas vertentes, o ciclo pré-escolar e ensino primário e elementar.

E no mercado português?
O que acontece no mercado português é que encontramos escolas com diferentes fornecedores e que estão entusiasmadas por poderem usar a Kinderpedia para os dois ciclos. Encontraram esse benefício na Kinderpedia. E isto está muito presente em todos os mercados em que estamos.

Como surgiu a ideia de criar a Kinderpedia?
Há uma história interessante por detrás disso, na verdade. A ideia surgiu em 2015 porque víamos como as escolas e a famílias lutavam para comunicar. Comunicavam entre si de todas as formas, através de notificações, whatsapp, emails, Facebook, jornais da escola, em suma, com todo o tipo de ferramentas. E muitos deles estavam mesmo completamente offline.

Havia algumas ferramentas de comunicação na Europa de Leste, mas eram legacy tools, tradicionais, muito antigas e que não estavam adaptadas às necessidades de hoje. Havia obviamente necessidade desta cloud digital, mobile.

Pensámos que era uma área em que podíamos definitivamente trazer algo de novo. Assim começamos com a ideia de construir uma ferramenta de comunicação que permitisse comunicar uns com os outros, e com a qual os resultados da escola também seriam muito melhores.

Começamos com um fundo comunitário de 135 mil euros. Apercebemos a dada atura de que as escolas não precisavam só de comunicação. Também queriam estar melhor organizadas. Porque não pensar num sistema de comunicação e gestão para as escolas e jardins de infância. Então durante quase um ano o que fizemos foi trabalhar com eles numa base diária a recolher o máximo de informação sobre a forma como organizavam os seus dias. Retiramos folhas de excel, olhamos para elas e tentamos ver o que era comum a todas as instituições. Foi assim que surgiu a Kinderpedia.

“Estamos a recrutar porque estamos num processo acelerado de expansão internacional”.

Quantas pessoas estiveram no início do projeto?
Começamos com três fundadores, o Daniel Rogoz, por natureza um empreendedor, eu própria que tenho o marketing da empresa, e o Valentine que é o nosso CTO, fantástico a construir projetos. Agora somos mais de 35 pessoas na equipa e estamos a recrutar porque estamos num processo acelerado de expansão internacional. Temos a nossa equipa em Portugal, liderada pela Filipa Lemos Cristina [Country Manager da Kinderpedia Portugal] e mais dois membros. Temos uma equipa semelhante no Reino Unido, que começou no início deste ano. Também temos uma equipa nos Emirados Árabes Unidos, contratamos um representante nos EUA e ainda temos uma equipa no Brasil.

“Todos os benefícios que a ferramenta permite estão a ser percecionados no mercado português”.

Estão em Portugal há cerca de um ano e meio. Como está a correr o projeto?
Está a correr bem, as escolas estão a perceber os benefícios que Kinderpedia pode trazer desde o infantário ao segundo ciclo. Gostam da ligação com as famílias, da simplificação de todas as tarefas. Todos os benefícios que a ferramenta permite estão a ser percecionados no mercado português.

Quantas escolas já usam a plataforma em Portugal?
Atualmente estamos em várias escolas, principalmente no setor privado, de Cascais, Oeiras, Sintra, Amadora e Lisboa. E agora devido a uma parceria que temos com a maior federação de associações de pais em Portugal, a Fapoestejo (Federação Associações Pais do Oeste, Lezíria Tejo e Médio Tejo), estamos a começar a entrar no setor público, especialmente na região de Santarém, que também abraçou este projeto. A par do setor privado estamos também a entrar no setor público.

No momento, em quantas línguas é que a plataforma está disponível?
Está disponível em 17 línguas e estamos constantemente a acrescentar mais. Ainda recentemente lançamos em chinês. Estamos muito entusiasmados com a boa aceitação que a plataforma tem tido em várias regiões, porque estamos muito comprometidos com a experiência do utilizador. Sempre que vamos para uma nova região, queremos ter a certeza de que temos o projeto correspondente para as suas necessidades. Por exemplo, para Portugal fizemos a integração SAT-T que ajuda muito as escolas com a sua gestão financeira, porque aqui há uma forma particular de registar todos as faturas com as Finanças. Isso era algo que precisavam e construímos a funcionalidade especificamente para esta região.

“O que estamos a fazer ao nível da expansão internacional, e este é um compromisso importante que temos, é crescer ao mesmo tempo que os nossos parceiros”.

Em que geografias estão atualmente?
Estamos presentes em 14 países, em quatro continentes. À parte da Europa de Leste e Portugal, temos uma presença forte nos Emirados Árabes Unidos e, atualmente, estamos a construir o nosso portefólio no Reino Unido onde já temos os primeiros clientes. E, gradualmente, estamos a crescer em muitas outras regiões. Também já estamos presentes na África do Sul, e estamos em conversações avançadas para muitas áreas como Singapura, Marrocos e Estados Unidos.

O que estamos a fazer ao nível da expansão internacional, e este é um compromisso importante que temos, é crescer ao mesmo tempo que os nossos parceiros. Por exemplo, a Maple Bear é um franchising global do Canadá. São um dos nossos parceiros chave que tem trabalhado connosco na Europa central há três anos e no ano passado escalamos a nossa colaboração para a área dos Emirados Árabes Unidos. No início deste ano anunciamos a nossa parceria a nível global, o que significa que nos próximos meses todas as escolas Maple Bear no mundo, e eles têm 550 instituições, em 35 países, estarão a usar a plataforma da Kinderpedia. Também temos uma parceria semelhante com a Brave Generation Academy, que nasceu em Portugal, mas que também tem grandes ambições internacionais.

“(…) quando se vai para um novo mercado é obviamente difícil começar com os primeiros utilizadores. Porque não nos conhecem, não sabem de onde viemos, o que fazemos.

Que desafios teve de enfrentar no mercado português para lançar o projeto?
Deixe-me falar em primeiro lugar da grande força que temos em Portugal e que nos ajuda a ultrapassar muitos desafios que é a Filipa [Lemos Cristina], partner local muito dedicado que abraçou a filosofia e os valores da Kinderpedia desde o início. E que traz toda a sua paixão e entusiasmo para levar a nossa história, o produto, o que estamos a transformar e a visão que temos para a educação à comunidade de escolas em Portugal.

Normalmente quando se vai para um novo mercado é obviamente difícil começar com os primeiros utilizadores. Não nos conhecem, não sabem de onde viemos, o que fazemos. Não sei se a Covid ajudou ou não nesta área porque antes da Covid, tal como agora, íamos pessoalmente de um lugar para outro. E quando as pessoas nos veem conseguem ver o quão comprometidos estamos, como estamos determinados. Quando encontramos as pessoas através do Zoom é tudo muito impessoal. Por isso é tão importante ter alguém na região que sinta o mercado, que caminhe na mesma direção que nós. A falta de familiaridade, de awareness, e talvez, em certas áreas, uma literacia digital pouco desenvolvida dos professores e das escolas, são potenciais barreiras para adotar novas tecnologias.

Aqui, dois dos principais desafios que enfrentamos é que cada escola tem necessidades diferentes e por isso decidimos, com a equipa da Kinderpedia global, apresentar planos diferentes, com diferentes funcionalidades para acomodar as necessidades que eles têm. Assim, se a escola se quiser focar mais na comunicação parental, pode escolher ter só essa parte da Kinderpedia. E se quiserem mais coisas podemos modificar a plataforma para que possam ter mais funcionalidades.

Outra coisa dificuldade que também encontramos em Portugal, e que resolvemos através de parcerias, como com a Fapoestejo, é o primeiro contacto com os diretores das escolas. Muitos deles não conhecem a plataforma e através de ligações com a network e com estes parceiros que acreditam e que tem este espírito inovador, conseguimos chegar aos primeiros diretores de escolas e começar a apresentar como a Kinderpedia trabalha e os benefícios que proporciona.

Há muitas escolas interessadas na componente de gestão, mas precisam da integração com a lei local. Encontramos frequentemente este tipo de exemplos. Nos Emirados, no Reino Unido e na Suíça, por exemplo, têm um sistema em que precisam de mostrar às autoridades de ensino o rácio entre o número de professores e alunos e nós fazemos isso, ao proporcionar uma plataforma dinâmica com essa funcionalidade. Então, a todo o momento, a plataforma calcula quanto alunos estão na aula e assim o diretor consegue ver quantos professores precisa de ter disponíveis, numa semana, num mês…

Adaptam a plataforma ao mercado e às necessidades de cada instituição?
Sim, definitivamente. Por isso é que é tão importante ter olhos e ouvidos aqui, um trabalho que a Filipa faz, e claro, a capacidade de criar parcerias fortes como as que temos.

Quais os vossos planos para Portugal?
O que queremos obter em Portugal é, por um lado, desenvolver a nossa presença no setor privado, onde já provamos os benefícios e os valores da Kinderpedia. Levar a transformação e inovação que propomos ao máximo de escola nacionais e internacionais possível. E, por outro, gostaríamos igualmente de estar envolvidos, a longo prazo, no setor público porque apercebermo-nos que é onde as ferramentas de comunicação podem ter mais impacto social. E quando falamos de impacto social falamos de literacia digital e de inclusão. Estamos a tentar ajudar a recuperar as perdas na educação dos últimos dois anos devido à Covid.

“A tecnologia tem de ser a espinha dorsal da infraestrutura escolar (…)”

Na sua opinião o e-learning é o futuro da educação?
Acredito que o futuro da educação baseia-se em professores fortes, competentes e com paixão, que usam as melhores, as mais adequadas, as mais envolventes e interativas ferramentas de forma conectarem-se com a sua sala de aula, que agora é feita com nativos digitais. Isso não significa, não ir à escola. Não significa excluir as relações autênticas e a interação em presença. Significa usar todas as ferramentas que têm à disposição de forma a fazerem a melhor educação, quer seja na sala de aula quer seja online em casa onde as crianças também têm de ter acesso a esses recursos.

No meu ponto de vista, o e-learning é apenas uma componente. Definitivamente, é uma parte do presente da educação e uma parte do futuro. Vimos resultados excecionais em académicos e veremos mais e mais no ensino secundário e talvez até no ensino básico. Mas o que queremos ver no futuro da educação é a tecnologia a ajudar os professores, os alunos e as escolas.
A tecnologia tem de ser a espinha dorsal da infraestrutura escolar, para articular e empoderar os currículos, a administração e a comunicação e a forma como fornecem feedback. Não significa substituir nada, significa reforçar.

“E vamos provavelmente procurar uma nova ronda, talvez de serie A, para o próximo ano”.

Está nos seus planos uma nova ronda de investimento?
Começamos em 2015 com um fundo europeu de 135 mil euros e em 2018 encontramos o nosso primeiro business angel, um grupo de três investidores suíços que nos garantiram 225 mil euros para desenvolver a plataforma e provar o conceito. Depois disso, em 2020, fizemos uma ronda pre-seed de meio milhão de euros, que também teve uma componente de crowdfunding o que acredito que é muito bom e benéfico quando se trata de empreendedorismo social. Em 2021 fizemos uma ronda seed de 1.8 milhões de euros onde tivemos a venture capital Early Game Venture como investidor líder, mas em que também participaram os nossos investidores anteriores.

Agora posso dizer que estamos bem financiados, estamos na fase de provar resultados e estamos comprometidos com a expansão internacional. E vamos provavelmente procurar uma nova ronda, talvez de serie A, para o próximo ano.

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