Entrevista/ “Há um desconhecimento do governo sobre a importância das start-ups”

Hector Gusmão, CEO Fábrica de Startups Brasil

A Fábrica de Startups está em força no Brasil e entrevistámos o CEO da sucursal brasileira para perceber o que é que esta instituição de ADN português vai trazer ao ecossistema de start-ups sul-americano.

Como surgiu a oportunidade de levar a Fábrica de Startups para o Brasil?
Dois dos sócios da Fábrica de Startups Brasil, Hector Gusmão, CEO, e Bruno Castello, COO, conheceram a Fábrica de Startups Portugal em 2015, quando uma start-up de que são sócios foi convidada para participar num programa de aceleração. Mesmo tendo vindo de uma temporada em Silicon Valley, ambos ficaram muito entusiasmados com a metodologia e estrutura do programa de aceleração. A ideia de trazer a Fábrica para o Brasil passava longe, apesar de entenderem que poderia ajudar muito os empreendedores brasileiros, fazer intercâmbio de negócios entre os dois países e ajudar o Brasil a amadurecer o seu ecossistema empreendedor, assim como Portugal.
Foi então que, em 2016, no meio da organização de uma competição de start-ups no Rio de Janeiro, Hector e Bruno conheceram os demais sócios – Fábio Várzea, Marcelo Velloso, Ula Amaral e Waldemar Stefan – que já estudavam o que montar no Rio de Janeiro para apoiar empreendedores. Desde então iniciaram as negociações com o António Lucena, CEO da Fábrica de Startups Portugal, vindo a concluir a parceria em Fevereiro/2017.

O que é que esta nova incubadora e aceleradora vai fazer pelo ecossistema de start-ups brasileiro?
Com a expertise da Fábrica de Startups, assim como o estudo sobre o que o fomento às start-ups contribuiu para a retomada económica de Portugal, já começamos a apoiar e a traçar grandes planos para contribuir para o ecossistema empreendedor do Brasil. Em 2017 apoiámos a prefeitura do Rio de Janeiro a criar a Lei Municipal de Inovação, que incentivará start-ups na cidade. Consciencializar universidades, poder público e grandes empresas sobre a importância de fomentar o empreendedorismo também esteve na agenda do último ano. Em 2018 iniciaremos nossa operação na nossa sede e teremos connosco 130 start-ups por ano, entre aceleradas e incubadas, tendo o objetivo de aumentar as suas chances de sucesso e gerar 50 mil milhões de reais (12,5 mil milhões de euros) por ano em negócios. A nossa sede terá 3.700m² para conectar o empreendedor com todo o ecossistema, desenvolver inovação para as grandes empresas as aproximando das start-ups e fomentar que mais pessoas empreendam. Só com eventos, pretendemos atingir 30 mil pessoas por ano. Queremos contribuir com os outros players para transformar o Brasil numa nação empreendedora de negócios com alto grau de impacto.

O que falta no universo de start-ups brasileiro?
Um das principais coisas é disseminar e apoiar o empreendedorismo. Infelizmente, o brasileiro hoje empreende por necessidade, reduzindo a qualidade e longevidade do negócio. Escolas, universidades e cada vez mais iniciativas de fomento, deveriam mostrar que o empreendedorismo é peça fundamental para a retomada da economia e que é uma alternativa a carreira corporativa ou pública. O passo seguinte é apoiar estes novos empreendedores para que não fracassem. Poucas start-ups naturalmente sobrevivem, mas quanto maior for o apoio, a aplicação de metodologias e a aproximação dos empreendedores, a taxa de sobrevivência só tenderá a ser maior. Por outro lado, faltam políticas públicas que incentivem o crescimento das start-ups: não é possível manter a tributação alta para as start-ups e transações – como por exemplo a entrada de investimento. As start-ups precisam de fôlego no início e ter tempo exclusivo para o seu negócio e não para resolver questões burocráticas. Além disso, elas precisam de ser vistas como o motor de crescimento da economia, de modo que haja cada vez mais capital de fomento, assim como melhor aplicação daqueles existentes.

Considera que o Estado/Governo brasileiro tem um papel ativo na promoção e apoio às start-ups nacionais?
Há um movimento crescente para isso, mas ainda estamos distante do ideal. Muitas vezes há um desconhecimento do governo sobre a importância das start-ups, mas, por outro lado, há alguns estados que já conseguiram avançar bastante, criando ambientes muito propensos a criar start-ups, assim como a sensibilização de diversos órgãos privados de que é necessário se aproximar do governo para ajudá-lo a ter um papel cada vez mais ativo e eficiente.

Qual é a importância do empreendedorismo no atual cenário pouco favorável à economia brasileira?
Se não o único caminho para a saída da crise, um dos principais. Para se ter uma ideia, ao analisar o efeito do empreendedorismo nas quatro últimas profundas crises dos Estados unidos, percebe-se que há um volume intenso de demissões das grandes corporações, versus um crescimento exponencial na criação de novas empresas. No Brasil, 65% dos novos empregos são gerados pelas chamadas scale-ups, ou seja, start-ups em fase intensa de tração. Este é o motor para a economia voltar a crescer, gerar empregos e renda. O movimento de Portugal também foi muito interessante e o Brasil precisa de se inspirar nisso. Um país em crise, que cria diversos incentivos que atraiam boas start-ups e empreendedores de todo o mundo, gerando assim riqueza e referência mundial para se ter negócios, me parece, hoje, render diversos bons frutos.

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