Opinião
O elogio da simplicidade

Vivemos num mundo complexo, confuso, com excesso de informação. E o que fazemos perante isto no nosso dia-a-dia? Acrescentamos complexidade, somamos confusão e contribuímos mais ainda para essa desinformação.
E todos nós somos culpados pela complexidade em que vivemos. Somos culpados, ativa ou passivamente. Mas, também e curiosamente, somos as principais vítimas. E é precisamente esta qualidade de “vítima” que, ao menos egoisticamente, nos deve fazer pensar.
Todos os dias somos confrontados com leis que não conseguimos interpretar, contratos que não temos como ler, serviços que não conseguimos utilizar, formulários que não sabemos preencher, instruções que não sabemos executar ou e-mails que, simplesmente, não entendemos. Todos os dias temos o nosso “irritante”, aquela situação que nos coloca, ainda que por breves momentos, num patamar próximo do “analfabetismo funcional”.
Mas a complexidade é de tal forma cómoda e encontra-se tão aculturada que, quando comunicamos – seja através de uma apresentação, de um relatório, de uma orientação ou de um simples e-mail – muitas vezes nem nos apercebemos que estamos precisamente a incorrer nesse vício.
E que em todo este processo, que conta com participação do Estado, dos bancos, das seguradoras, dos fornecedores de serviços, das empresas em geral ou de cada um de nós, em contexto profissional ou pessoal, contribuímos para uma enorme deseconomia de recursos ou mesmo para a não obtenção do efeito pretendido.
Por isso, simplificar devia ser elevado à categoria de desígnio nacional. Um simplex que vá para além do contexto do Estado e dos serviços públicos. Uma cultura de simplificação que seja adotada dentro das empresas e das organizações e em cada interação nossa com os outros.
E como podemos concretizar este objetivo? Colocando sempre o foco naqueles a quem nos dirigimos, sejam eles os cidadãos, os clientes, os consumidores, os colegas ou os colaboradores. Organizando e estruturando o que queremos comunicar. E comunicando sempre o essencial, de forma direta, clara, concisa, em linguagem corrente e entendível na perspetiva do “utilizador”, ou seja, daquele a quem se dirige a mensagem.
E não apenas é possível, como também vantajoso, quebrar a “longa tradição” da complexidade e “inovar” no sentido da simplificação. Leis, contratos, produtos ou serviços comunicados de forma simples aumentam a confiança, a satisfação e o sentimento de transparência. Orientações ou informações internas simples, aumentam o grau de compreensão, de execução, de envolvimento e de alinhamento em relação à estratégia e à sua operacionalização. Contribuindo assim a simplificação para, numa linguagem mais empresarial, melhorar a “customer experience” e gerar um enorme valor acrescentado.
Parafraseando o Padre António Vieira, “perdoem-me a complexidade e extensão desta “carta”, mas não tive tempo para ser mais simples.”
*Equipa de Coordenação – Plataforma Portugal Agora
Carlos Sá Carneiro é responsável pelo desenvolvimento estratégico da Portugal Expo 2020 Dubai e professor convidado da Porto Business School (PBS). Anteriormente, foi diretor de New Business da Altice, tendo a seu cargo os departamentos de desenvolvimento de novos negócios, de smart cities e de empreendedorismo e start-ups. Nesse âmbito, foi responsável pelo lançamento do programa ENTER e da incubadora de empresas do Grupo.
Licenciou-se em Direito, área na qual concluiu a parte curricular do doutoramento. Completou o Programa Avançado de Gestão da PBS e possui Pós-Graduações em Direito Fiscal e em Contratos em Especial.
Ao longo da sua vida profissional foi fundador da Uppertech Consulting, Advisor da United Nations University (O.U. on Policy-Driven E-Gov), assessor do Primeiro-Ministro (2011-2015), sócio da CBSC e da GMSCC, sociedades de advogados, consultor da Aderta (Madrid), co-diretor executivo da pós-graduação em Fiscalidade da UIFF/PwC e administrador da Antab, S.A. Complementarmente, tem participado como orador em conferências e congressos nas áreas da transformação digital, empreendedorismo e e-Gov.
Mantém uma participação cívica ativa enquanto membro do plataforma Portugal Agora, ex-coordenador do Grupo da Boavista e membro fundador do Grupo Portugal XXI, fóruns multipartidários dedicados à reflexão política, económica e social.