Opinião

Da autoconfiança ao treino de pitch, como podem as empreendedoras levantar mais investimento

Sílvia Taveira de Almeida, Investor In Residence da Católica-Lisbon

As empresas lideradas por mulheres recebem menos investimento de risco e são menos atrativas para investidores, uma tendência transversal no mundo. Como podem as mulheres angariar investimento em pé de igualdade com os homens?

Está provado que a diversidade nas empresas influencia positivamente o lucro, a inovação e a criação de valor nos negócios, e pode fazer crescer o PIB mundial em 3 a 6% (ou seja, 2.5-5 trilhões de dólares americanos para a economia mundial). No entanto, as mulheres continuam sub-representadas nos cargos de chefia e o investimento em empresas lideradas por mulheres é menor quando comparado com as dirigidas pelos pares do sexo masculino. Se distribuirmos o venture capital levantado na Europa por empresas tecnológicas, 93% deste foi alocado a equipas fundadoras constituídas apenas por homens, 5% a equipas mistas e apenas 2% a equipas femininas.

Felizmente, a consciência destes factos é cada vez mais generalizada e multiplicam-se iniciativas para equilibrar a representatividade das mulheres nos ecossistemas empreendedores por todo o mundo. Em Portugal, há espaço para que o empreendedorismo feminino seja cada vez mais incentivado e financiado.

Num primeiro momento, é fundamental que as empreendedoras tomem conhecimento das ferramentas, competência e oportunidades que podem capitalizar para o sucesso de uma ronda de levantamento de capital:

Autoconfiança: aos olhos de quem investe, grande parte do potencial de um negócio parte do seu fundador. A valorização do papel da fundadora e da sua capacidade de liderança são essenciais para conquistar o investidor. Afinal, se não acreditarmos em nós próprias, por que razão há-de o investidor acreditar? Se as capacidades exigidas para a função, como a experiência no setor, o conhecimento do negócio/produto e, sobretudo, a visão para o crescimento da start-up forem evidentes e consistentes, não há motivo para que a mulher seja menos considerada que o homem. A verdade é que as mulheres são, por natureza, mais comedidas na comunicação, mostrando-se no geral menos ousadas nas suas decisões, afirmações e projeções. Nesta situação, esta postura pode ser interpretada como falta de confiança no projeto, o que é logo um sinal vermelho na avaliação da sua rentabilidade potencial. É importante contornar esses aspetos para o sucesso de um negócio, principalmente quando o objetivo é levantar capital.

Equipa experiente, multidisciplinar e diversa: um negócio não vive só do seu fundador. Para o sucesso de todos os negócios é essencial que exista conhecimento técnico por parte dos vários membros da equipa, nomeadamente nas áreas financeira, de marketing e de tecnologia, que confiram credibilidade, excelência e escalabilidade ao projeto. A diversidade – cultural, geracional, de género e de background – é também um aspeto a ter em conta na escolha da equipa, de forma a agregar várias visões para a otimização do desempenho, da sua competitividade e grau de inovação. Aqui a mulher empreendedora pode ter um papel mobilizador e de agente de mudança para uma maior diversidade no ecossistema muito importante.

Preparar a apresentação e treinar o pitch: antes mesmo do contacto com os investidores, deve preparar-se a apresentação do projeto que contém, entre outros elementos, a visão dos fundadores, a proposta de valor, a inovação que traz ao mercado em que opera, o potencial de escalabilidade e lucro, sustentados por um racional e por métricas consistentes, bem com um plano de negócio a 3-5 anos, um plano de ação e, por fim, a proposta ao investidor. O pitch deve ser curto e direto, não mais de 5 minutos quando apresentado oralmente ou descrito em dois ou três parágrafos quando enviado, e abordar a visão, a solução, a disrupção e a proposta. O storytelling é muito importante para cativar a atenção do investidor.

O contacto com o investidor: a escolha do investidor deve ser estratégica tendo em conta o portefólio de projetos já investidos e interesses de mercado do mesmo. As comunidades para networking, incubadoras, eventos, programas de capacitação e de aceleração têm aqui um papel importante no acesso à rede de investidores. Manter uma relação saudável com os investidores é imprescindível para a reputação no ecossistema. Mais uma vez a autoconfiança aqui torna-se um aspeto fulcral.

O papel da mulher é fundamental na mudança de paradigma, mas devem existir estímulos para uma mudança sistémica. As incubadoras têm aqui uma função de destaque na sensibilização, estímulo, capacitação, no investimento em projetos desenvolvidos por mulheres e em desenvolver um ecossistema inclusivo e maduro.

Também os investidores profissionais, desde business angels a firmas de capital de risco e bancos de investimento, deverão assumir um papel de liderança neste processo. Ao constituir equipas diversas, com equilíbrio na representatividade dos géneros, vão contrariar o enviesamento atual na tomada de decisões de investimento. E, não menos importante, poderão – ou mesmo deverão! – fazer uma gestão ativa da diversidade no seu portefólio de investimentos criando objetivos para ir aumentando a representatividade de novos negócios criados e liderados por mulheres. Quanto mais não seja pela razão enunciada no início deste texto: porque, a liderança feminina evidencia um potencial de rentabilidade maior.

O CTIE – Católica-Lisbon Center for Technological Innovation & Entrepreneurship da Católica Lisbon, por exemplo, procura estimular o empreendedorismo feminino através do Women Entrepreneurship Award, um concurso anual (atualmente com candidaturas a decorrer), que distingue e premeia o talento feminino no campo do empreendedorismo.

Fontes:
McKinsey & Company, 2015; Nordea, 2018
The state of European tech, Atómico, 2018
Boston Consulting Group, 2019

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Sílvia Taveira de Almeida é cofundadora e CEO da Business Angels Universidade Católica, é Investor in Residence, e ainda docente na cadeira Entrepreneurship & Innovation na CATÓLICA-LISBON SBE. Colabora com a Fábrica de Startups em projetos de inovação corporativa e é formadora em vários programas de aceleração.
Nos tempos livres, é mentora de start-ups, todas elas com mulheres nas equipas fundadoras. Antes disso, trabalhou durante mais de 20 anos em reconhecidos grupos multinacionais como UBS, General Electric e Cofidis, bem como em grupos portugueses como a EDP e Millennium BCP. É licenciada em Economia pela CATÓLICA-LISBON SBE e tem um MBA pela Kellogg School of Management. Também é membro da Associação Portuguesa de Business Angels (APBA) e do Instituto Português de Corporate Governance (IPCG).

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