Opinião

Assimetria de informação no contexto eleitoral

Carlos Rocha, economista e gestor

Neste semestre letivo acabei de lecionar a última matéria relativa à disciplina de Microeconomia 2, cujo tema foi a assimetria de informação. Para quem é leigo na matéria, ela não tem relevância nenhuma, mas para os estudiosos é algo muito interessante e que aplicamos no dia a dia, às vezes sem saber.

Ao nível académico, esse tema é tão importante que já rendeu um prémio Nobel de Economia, em 2001, concedido a George Akerlof, Michael Spence e Joseph E. Stiglitz. Segundo a entidade que concede o prémio, esses académicos contribuíram com o seu conhecimento para uma boa compreensão do fenómeno da assimetria de informação no mercado. Segundo a teoria, num mercado com informação assimétrica, um ou mais agentes económicos envolvidos em transações podem deter informações qualitativa ou quantitativamente superiores em relação a outros, gerando falhas de mercado.

Assimetria de informação, Teoria dos Jogos e mercado eleitoral

Antes da Assimetria de Informação, a matéria lecionada foi a Teoria dos Jogos, outra matéria apaixonante, que também rendeu um prémio Nobel de Economia, concedido a vários economistas que contribuíram significativamente para essa teoria. Quem não se lembra do filme “Uma mente brilhante?”. Foi em 1994, John Nash, John Harsanyi e Reinhard Selten receberam o Prémio Nobel de Economia pelos seus contributos para a Teoria dos Jogos. Embora esses académicos tenham ganho o prémio, a teoria foi inicialmente desenvolvida pelo matemático húngaro John von Neumann nas décadas de 1940 e 1950. E parece que as duas teorias estão relacionadas, pois Neumann utilizou modelos teóricos para situações nas quais várias partes participam de uma negociação, às vezes com acesso desigual a informações, uma clara situação de assimetria de informação.

Além do Prémio Nobel, o artigo “The Millennium Prize Problems” da revista Science, afirma que a Teoria dos Jogos foi classificada como a terceira teoria matemática mais importante do século XX, atrás apenas da Teoria da Relatividade Geral e da Teoria da Mecânica Quântica. O artigo também afirma que o MIT classificou a Teoria dos Jogos como a quarta disciplina académica mais importante do século XX, atrás apenas da física, da matemática e da química.

Sempre que possível, dou exemplos práticos para que os alunos possam ver a aplicabilidade da teoria estudada. Nada melhor do que aplicar a um assunto que mexe com a nossa vida em sociedade, tanto a nível nacional, regional ou internacional – as eleições.

Segundo informações da imprensa internacional, em 2024, mais de 50 países em todo o mundo irão realizar eleições – presidenciais, legislativas e municipais. Alguns dos países que terão eleições incluem os Estados Unidos, Rússia, México, Índia, Irão e Taiwan (já realizado).

Naturalmente, falar de eleições é falar de políticas públicas e dos programas dos partidos e candidatos para atingirem os objetivos propostos nos programas eleitorais. Ao eleitorado é disponibilizada alguma informação sobre alguns assuntos e alianças pré-eleitorais, mas há assuntos nos quais os candidatos não se pronunciam e se recusam a abrir o jogo ao eleitorado, criando uma falha no mercado, pois os candidatos estarão na posse de informações que não querem transmitir ao mercado eleitoral.

Na realidade, o eleitorado pode ter informação pré-eleitoral, mas depois das eleições só os vencedores sabem o que farão com o resultado, ficando o mercado eleitoral sem possibilidade de reagir, pelo menos nas eleições já realizadas. Certamente que estamos no campo da assimetria da informação em que os candidatos possuem informação que não transmitem ao “mercado eleitoral”. Resultado, acabam por implementar políticas, tomar decisões e fazerem alianças que não informaram previamente ao mercado, pois se informassem o mercado eleitoral previamente, poderiam não ter aquele resultado.

No campo empresarial, os líderes precisam de conhecer todas as opções dos candidatos por forma a saberem tomar as suas decisões estratégicas relativamente às suas empresas. Os empresários e investidores precisam de ter todas as informações e as opções pós-eleitorais dos candidatos por forma a saberem se avançam ou não com novos investimentos. Os agentes económicos precisam de conhecer as estratégias, políticas e planos dos candidatos potencialmente vencedores, nomeadamente a estabilidade da política fiscal. Os trabalhadores precisam de conhecer as políticas de rendimentos e preços no cenário pós-eleitoral. De uma maneira geral, toda a sociedade precisa de conhecer toda a informação para saber votar, e para isso não pode haver assimetria de informação, ou seja, os candidatos não devem esconder as suas políticas mesmo que elas sejam menos populares.

A teoria apresenta algumas soluções para minimizar esse problema, nomeadamente a sinalização. Por isso, os eleitores e os adversários devem exigir que toda a informação sobre as políticas, alianças e estratégias pré e pós-eleitoral sejam previamente conhecidas.

Recorrendo à Teoria dos Jogos, podemos também ter uma solução que é considerá-lo como um jogo repetitivo em que, conhecendo o resultado da primeira rodada (última eleição), o mercado eleitoral passa a saber o comportamento e a seriedade do candidato. Com base no resultado da última eleição (último jogo), o mercado eleitoral passa a saber a estratégia do candidato e, na próxima eleição (jogo repetitivo), os eleitores saberão agir e não serão eventualmente enganados.

Conclusão

Todos devem estar cientes de que podem encarar qualquer processo eleitoral como uma falha de mercado e exigir toda a informação previamente e devem também sinalizar todos os candidatos para na próxima rodada do jogo poderem agir de acordo com o perfil do candidato.

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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