Entrevista/ “As empresas não mudam por si só, mudam porque as pessoas que as compõem mudam”

“O RH é um departamento de pessoas que trabalha para as pessoas. Por isso, o segredo é sempre colocar as nossas pessoas no centro de qualquer decisão”, afirma Anna Villar, a nova diretora de Recursos Humanos da Henkel Ibérica.
Desde o início deste mês que a Henkel Ibérica tem uma nova diretora de Recursos Humanos que assumiu a liderança da estratégia de talento e cultura da empresa para Portugal e Espanha. Anna Villar, profissional com mais de 20 anos de experiência na área de Recursos Humanos, assumiu o cargo depois de quatro anos como responsável pelas Relações Laborais da Henkel Ibérica.
Fã de tecnologia, quando esta ajuda nas tarefas rotineiras, defende, contudo, que o “RH é um departamento de pessoas que trabalha para as pessoas” e que, por isso, “o segredo é sempre colocar as nossas pessoas no centro de qualquer decisão”. Anna Villar acredita que o departamento de Recursos Humanos deve garantir que a tecnologia não substitua o que é essencialmente humano, trabalhando para que “a tecnologia esteja ao serviço das pessoas, e não o contrário”.
No desempenho das novas funções vai centrar-se nos valores que partilha com os Compromissos de Liderança da Henkel: paixão, humildade, diversão, autenticidade e criatividade.
Que desafios a esperam ao assumir a liderança da estratégia de talento e cultura da Henkel para Portugal e Espanha?
A Henkel é uma multinacional familiar e, embora às vezes pareçam conceitos opostos, para mim não o são. A Henkel cuida das pessoas, preocupa-se com o seu crescimento e com a sua segurança. Os Recursos Humanos não podem falhar nesse aspeto. Temos de liderar, antecipar-nos, ser referências na forma como acompanhamos as pessoas no seu desenvolvimento profissional e pessoal.
O que não pode faltar na política de RH de uma multinacional como a Henkel, com milhares de trabalhadores?
O coração. O nosso objetivo é sermos “Pioneers at heart for the good of generations”. É muito bom ter políticas escritas, mas o importante é vivê-las e senti-las. Pessoalmente, sou apaixonada pelo meu trabalho, faz parte de mim, e o que quero é que as pessoas em Portugal e em Espanha sintam os Recursos Humanos, não apenas que leiam políticas.
“Para mim, é fundamental compreender cada país e cada grupo de pessoas que compõem a Iberia (…)”.
Quais os seus projetos imediatos para o desenvolvimento da área de Recursos Humanos da Henkel Ibérica? Ideias diferentes para Portugal e Espanha, uma vez que estamos perante culturas diferentes?
Todas as empresas enfrentam desafios importantes: mudanças nos sistemas de gestão, transposição da diretiva europeia sobre transparência salarial, implementação da inteligência artificial para além dos sistemas de RH, retenção e atração de talentos, convivência intergeracional… e o dia a dia, que não é menos importante. Para mim, é fundamental compreender cada país e cada grupo de pessoas que compõem a Iberia, para que os projetos em que empreendemos cheguem realmente a todos. A diversidade é um dos maiores atrativos da Henkel, e devemos saber valorizar o lado positivo de sermos uma organização que integra muitas culturas diferentes. Na Henkel Ibérica temos mais de 30 nacionalidades.
Quais são as principais alterações que assinala no setor dos recursos humanos nos últimos 20 anos de atividade profissional? O que mudou mais? As empresas, as pessoas?
Um pouco de tudo. As empresas não mudam por si só, mudam porque as pessoas que as compõem mudam. É como uma paisagem: onde antes havia uma montanha e uma floresta, agora há um bairro residencial e uma autoestrada. A paisagem não mudou, nós, pessoas, é que a transformámos.
A mudança mais percetível para mim é a velocidade. Quando comecei a trabalhar, usávamos pouco o e-mail e os telemóveis eram praticamente inexistentes. Hoje, quem entra no mercado de trabalho quer ter tudo claro desde o primeiro dia: o que vai fazer, quando vai ser promovido, qual será o seu salário em 3, 5 ou 7 anos… E isso adiciona uma complexidade importante ao nosso trabalho em RH.
Desde 2021 que era responsável pelas Relações Laborais da empresa. De que forma essa experiência vai moldar as suas novas funções?
Comecei a minha carreira na Henkel em 2002, no departamento de pagamentos, e saí em 2007. Quando me propuseram voltar em 2021 para assumir a responsabilidade pelas Relações Laborais, não poderia ter ficado mais feliz. Estes quatro anos permitiram-me reencontrar a cultura da Henkel, reconectar-me com muitas pessoas que já estavam na empresa quando saí, trabalhar com quase todas as equipas e conhecer a nossa fábrica em Montornès del Vallés (Barcelona), que representa quase 50% dos colaboradores na Península Ibérica. Foi uma excelente formação para ter uma visão transversal da Henkel na Península Ibérica, enquanto me permitiu estabelecer relações de confiança com a equipa de gestão, que me acolheu muito bem. Sinto-me muito grata pela autonomia e confiança que me foi dada pela Griselda Serra, que foi a minha responsável e diretora de RH até agora e a quem devo estar nesta posição hoje.
Quais os seus Leadership Commitments para este novo cargo?
Na primeira reunião com a equipa após a confirmação da minha nova função, partilhei com eles as atitudes que mais valorizo e que estão totalmente alinhadas com os Compromissos de Liderança da Henkel: paixão, humildade, diversão, autenticidade e criatividade.
Sinto-me uma privilegiada por estar numa empresa cujo propósito reflete os meus próprios valores: “Pioneers at heart for the good of generations”. É um propósito com o qual me identifico 100% e que está em sintonia com os nossos compromissos de liderança: ser empreendedores, trabalhar com paixão e fazê-lo como equipas fortes que acreditam nos seus resultados.
Numa altura em que as dificuldades de atração e retenção de talentos estão na ordem do dia, no caso da Henkel qual a estratégia para ultrapassar essas dificuldades?
Ter a melhor proposta de valor como empresa. Devemos ser capazes de elaborar propostas ad hoc que sejam atraentes para os talentos que queremos — os que já temos e os que procuramos. E isso não se resume apenas ao salário: são benefícios, é cultura, são valores. Só assim poderemos atrair e reter talentos num momento tão exigente.
“Na Henkel, trabalhamos para que a tecnologia esteja ao serviço das pessoas, e não o contrário”.
Perante o ritmo acelerado da digitalização e da transformação tecnológica das empresas, e com os negócios cada vez mais orientados para o digital, como gerem as expetativas do capital humano da Henkel?
O segredo está em acompanhar as pessoas nesse processo de transformação. A digitalização não pode ser apenas uma questão de sistemas. Na Henkel, trabalhamos para que a tecnologia esteja ao serviço das pessoas, e não o contrário. Isso implica formar, ouvir, adaptar e, acima de tudo, comunicar muito bem as mudanças, e é nisso que estamos a trabalhar. As expetativas dos jovens talentos hoje são muito diferentes: procuram agilidade, transparência, ferramentas intuitivas e também espaços onde possam contribuir com ideias e sentir-se parte da mudança. A partir dos Recursos Humanos, temos o desafio de traduzir essa transformação tecnológica em experiências humanas que coexistam com os nossos valores.
Inovação, tecnologia sustentabilidade, governança, pessoas… como se equilibram todas estas vertentes num universo empresarial tão competitivo como o atual e qual pode ser o papel dos RH no sucesso da relação entre todas essas vertentes do negócio?
Todas as dimensões têm uma coisa em comum: as pessoas. E o RH é um departamento de pessoas que trabalha para as pessoas. Por isso, o segredo é sempre colocar as nossas pessoas no centro de qualquer decisão. A inovação nasce daqueles que se atrevem a errar, a tecnologia está ao serviço das pessoas para que possam avançar melhor e mais rapidamente, a sustentabilidade, na qual a Henkel é pioneira, também é pensada por pessoas e para pessoas e, acima de tudo, para as gerações futuras, que serão as que poderão avaliar se fizemos bem ou mal, e a governança é necessária para que tudo avance com sentido e ordem.
Qual o cunho pessoal que gostaria de imprimir à cultura de RH da Henkel Ibérica?
A paixão e a humildade. Sermos capazes de aprender com os nossos erros e usá-los para sermos melhores. Como já disse anteriormente, que os Recursos Humanos estejam sempre presentes, não apenas quando somos necessários.
A liderança feminina faz a diferença no mundo dos negócios? Em que medida?
É verdade que este tema ainda está muito em voga, e só quando deixar de ser discutido é que significará que se normalizou. Pessoalmente, acredito que o que faz a diferença é o trabalho bem feito e bem reconhecido, e aos poucos as mulheres têm conseguido essa segunda parte. Sou totalmente a favor da integração. Assim como mencionei anteriormente, a diversidade cultural é fundamental em todas as suas dimensões. No final, tudo se resume ao respeito pela pessoa que está ao nosso lado.
“(…) devemos educar as novas gerações para que compreendam que o pensamento crítico é insubstituível”.
Para onde caminham os Recursos Humanos num futuro cada vez mais dominado pela tecnologia, pela IA?
Humanizá-lo novamente. Sou uma grande fã da tecnologia quando nos ajuda com tarefas rotineiras e repetitivas que não agregam valor, contudo acredito que deve sempre andar de mãos dadas com uma pessoa. O departamento de Recursos Humanos deve zelar por isso e garantir que a tecnologia não substitua o que é essencialmente humano.
As tarefas que envolvem tratamento pessoal, escuta, empatia, acompanhamento… não devem ser substituídas por uma máquina. As novas tecnologias vieram para ficar, e devemos tirar partido delas, mas também devemos educar as novas gerações para que compreendam que o pensamento crítico é insubstituível.
Respostas rápidas:
Maior risco: Querer fazer demasiadas coisas em pouco tempo
Maior lição: Saber pedir desculpa
Maior erro: Pensar que posso fazer tudo sozinha
Maior conquista: Que a equipa se divirta a trabalhar e que as pessoas possam contar com os RH