Opinião
A ciência económica ao serviço das pessoas
Ao longo de três anos, mais concretamente entre 2012 e 2016, cerca de uma centena de aldeias moçambicanas foi alvo de uma experiência no âmbito da tecnologia do mobile money. Essa pesquisa consistia na disponibilização a metade daquela amostra de meios para a realização de pagamentos através do telemóvel.
Durante 36 meses levaram-se a cabo inquéritos a 2000 famílias, analisaram-se os dados das transações ocorridas e retiraram-se um conjunto de ilações baseadas em dados factuais. A principal conclusão sublinhava que o uso da tecnologia do mobile money melhora, de facto, a vida das populações. Fundamentalmente, porque facilita às pessoas do universo rural socorrerem-se da ajuda dos familiares que vivem nas cidades em situações de maior aperto.
Exemplos como o acima descrito, responsabilidade do centro de investigação e conhecimento NOVAAFRICA (criado pela Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa – Nova SBE), baseiam-se na utilização do método experimental na economia do desenvolvimento. Uma renovada abordagem que tem vindo sistematicamente a ganhar peso nas duas últimas décadas no combate à pobreza mundial. De resto, este acento na análise empírica, em contraponto à teoria, valeu recentemente o Prémio Nobel da Economia aos norte-americanos Michael Kremer, da Universidade de Harvard, e Abhijit Banerjee, do Massachusetts Institute of Technology, e à francesa Esther Duflo, igualmente do MIT.
Trio de laureados que através da criação do Poverty Action Lab tem conduzido, então, inúmeros estudos no terreno à procura de respostas para mitigar a pobreza no Globo. A novidade reside na fórmula adotada: fazendo, questionando caso a caso, avaliando pessoa a pessoa, medindo de forma sistemática, incluindo experiências no local. Metodologia entretanto implementada em países da Ásia, de África e da América Latina, em colaboração com Estados, organizações governamentais e organizações não governamentais, que permite demonstrar quer as políticas com consequências práticas, quer as políticas menos funcionais.
O modus operandi é em tudo idêntico às experiências no campo da medicina: é criado um grupo de teste que beneficia de uma qualquer intervenção para debelar certo(s) tipo(s) de problema(s) previamente identificado(s) e um grupo de controlo que manter-se-á sem nenhum tratamento. A escolha dos participantes é aleatória garantindo deste modo a similaridade de ambos os grupos (e exceção será somente a terapêutica). Conseguir-se-á assim a relação causa-efeito.
Resultado que enfatiza sobretudo uma convicção nestes tempos um tanto desconsiderada: a ciência económica deverá estar ao serviço das pessoas. Na verdade, provavelmente todos sobrevalorizamos em detrimento do indivíduo os mercados, as taxas de inflação, os números do défice, as dívidas públicas, os juros bancários, os conceitos de competitividade versus produtividade. Talvez esta reformada economia do desenvolvimento possa reaproximar-nos das pessoas.
*Associação Nacional das Empresas das Tecnologias de Informação e Eletrónica