Opinião

As novas competências chave de um CEO na era da IA

João Rodrigues Pena, fundador e CEO da Arboris

A Inteligência Artificial (IA) está a reconfigurar profundamente o papel do líder de topo. Se antes o foco de responsabilidade da liderança executiva se centrava na orientação estratégica e na gestão da organização num ambiente de relativa estabilidade, a IA muda o paradigma com a avalanche de informação, a automatização de decisões  e mudanças tecnológicas exponenciais.

Consequentemente, já não há lugar para o CEO tradicional: o novo CEO tem de ser capaz de alinhar tecnologia, pessoas e propósito com um enorme sentido de leitura do contexto e de adaptabilidade. E as competências chave do CEO alteram-se radicalmente – as clássicas continuam a pesar mas há domínios críticos que marcam uma rotura com o passado. Destacamos três.

Primeiro, a competência de literacia digital e de IA. Não se espera que o CEO seja um programador, mas é indispensável que domine os fundamentos da Inteligência Artificial, as suas aplicações e os seus benefícios, retorno económico, limitações e riscos. Entender o que é um algoritmo de machine learning, como funcionam os modelos de linguagem como os LLM ou quais são os riscos de viés e segurança permite ao líder dialogar com as equipas técnicas, tomar decisões informadas e evitar dependências cegas da tecnologia. CEOs com essa literacia digital tornam-se mais aptos a identificar oportunidades de inovação, a distinguir hype tecnológico de valor real e a fazer, afinal, uma gestão mais eficaz do negócio e da organização.

A mentalidade de dados é para nós a segunda competência chave. O CEO da era IA tem de gerir a empresa como um sistema de informação vivo onde o “data” do sistema é uma tremenda fonte de vantagem competitiva. Mas é fundamental que a tomada de decisões orientada por volumes de dados cada vez maiores não seja cega – a capacidade de julgamento associada à sensibilidade humana tem de ser um fator decisivo, o que conduz a uma síntese que exige tanto raciocínio analítico quanto julgamento humano e ético.

Em terceiro lugar, a ética e responsabilidade do comportamento do líder. De facto, à medida que a IA influencia decisões sobre emprego, privacidade e consumo, o CEO torna-se o guardião da confiança pública. É sua função garantir que os sistemas de IA usados pela empresa sejam transparentes, auditáveis e livres de discriminação. Isso implica estabelecer políticas de governança algorítmica e promover uma cultura de uso ético da tecnologia. O CEO do futuro será avaliado não apenas pelo crescimento e valorização da empresa, mas pela integridade digital que imprime à organização.

A par destas novas competências chave, a visão estratégica para a transformação digital do CEO também deve evoluir. Implementar IA não é simplesmente adotar ferramentas automatizadas, é repensar o modelo de negócio, a cadeia de valor e a experiência do cliente. Por isso, o líder tem de conseguir combinar a definição da visão de longo prazo com uma experimentação tática ágil no terreno, criando ecossistemas colaborativos com startups, universidades e parceiros tecnológicos. O sucesso dependerá da capacidade de adaptar continuamente a organização a um mundo em que a vantagem competitiva é efémera e a inovação é constante. Isso vai exigir ao novo CEO uma inteligência emocional amplificada através da empatia, da escuta ativa e da capacidade de inspirar no complexo ambiente das equipas híbridas, compostas por pessoas e sistemas inteligentes.

Acresce que a agilidade cognitiva se torna um requisito inegociável. A velocidade com que a IA muda setores inteiros obriga o líder a aprender, desaprender e reaprender constantemente. CEOs eficazes cultivam curiosidade intelectual e humildade para se rodearem de especialistas. Deixam de ser “detentores de respostas” para se tornarem curadores de perguntas relevantes, estimulando uma cultura organizacional de inovação e experimentação. Dizia um emérito Professor universitário norte-americano doutorado em IA que os líderes devem ter a consciência de que por mais rápido que avancem, as soluções tecnológicas estarão sempre um passo à frente … e por isso o espaço para correr atrás do aperfeiçoamento tecnológico é infinito.

Em síntese, o perfil tradicional de comando e controlo do CEO da era da IA evolui profundamente para um novo perfil de liderança adaptativa e ética, capaz de unir inteligência artificial e inteligência humana num propósito comum. O futuro das empresas dependerá menos da tecnologia que adotam e mais da qualidade da liderança que a guia. A IA cria de facto um novo CEO – um líder que pensa com dados, que decide com consciência e que inspira com humanidade.


Natural de Lisboa, João Rodrigues Pena possui uma licenciatura em Engenharia Civil pelo IST e um MBA pelo programa Wharton/NOVA. Desenvolveu a sua carreira em consultoria empresarial de alta direção nomeadamente como Senior Partner na Roland Berger e Presidente da AT Kearney para Portugal e Espanha onde assessorou a Administração de alguns dos maiores grupos nacionais e estrangeiros sobretudo sob controlo familiar.

Foi presidente executivo de um dos maiores grupos portugueses, com um portefólio diversificado espalhado pela Europa, África e América do Sul. Nos últimos anos, e a par com cargos de administração não executiva e assessoria em grupos e empresas familiares nacionais, fundou e é presidente de empresas em diferentes setores, estando sobretudo dedicado à Arboris, firma de assessoria customizada, vocacionada para apoiar acionistas de grupos empresariais familiares no seu desenvolvimento e fortalecimento, que nasceu há quatro anos.

É membro da Ordem de Malta, da ACEGE, do Conselho de Cidadãos da Câmara Municipal de Lisboa, Embaixador dos Antigos Alunos da Nova SBE do seu ano e membro do Conselho Superior da Associação de Antogos Alunos do MBA Wharton/NOVA.

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