Opinião

O marketing B2B na era da hiperconetividade

Pedro Celeste, diretor-geral da PC&A

Durante muito tempo, o marketing B2B foi visto como um apoio às vendas: gerar leads, criar brochuras, gerir feiras, organizar eventos. Uma função tática, longe das decisões estratégicas. Mas num mundo onde os ciclos de compra são longos, multidimensionais e profundamente digitais, esta visão tornou-se obsoleta.

Hoje, mais do que nunca, o marketing B2B é uma disciplina estratégica de criação de valor, diferenciação e crescimento sustentado. A lógica do funil — atrair, nutrir, converter — está a ser substituída por uma abordagem centrada na jornada do cliente: não-linear, omnicanal, e com múltiplos pontos de contacto, stakeholders e momentos de decisão. Hoje, a jornada é cada vez mais digital, mas profundamente humana. Exige conhecimento do cliente, conteúdo de valor, e coordenação eficaz entre marketing, vendas e pós-venda.

Como estamos a responder a esta transformação nas nossas empresas?

Conhecemos com precisão o nosso ciclo de venda real, desde o primeiro contacto até à renovação ou expansão do contrato?

Temos mapeadas as personas que influenciam a decisão? Sabemos como e onde se informam?

As equipas de marketing estão envolvidas na definição da proposta de valor, na criação de soluções e na retenção de clientes?

Utilizamos dados para personalizar a jornada, prever intenções de compra e priorizar contas estratégicas?

Muitas empresas continuam a medir o sucesso do marketing pelo número de Marketing Qualified Leads (MQLs), ignorando que o valor real está na qualidade das interações, na profundidade do relacionamento e na capacidade de influenciar decisões ao longo do tempo. O marketing moderno em B2B trabalha com conceitos como Account-Based Marketing (ABM), Revenue Operations (RevOps), Customer Journey Orchestration e Intent Data. É, acima de tudo, um processo de construção de confiança escalável.

No plano internacional, empresas como a Salesforce, a SAP ou a HubSpot transformaram o seu marketing em hubs estratégicos de insights, co-criação e personalização. Mas em Portugal também há bons exemplos. A Vicaima, líder em portas técnicas para edifícios, desenvolveu conteúdos técnicos em múltiplos idiomas, integrando marketing e engenharia para apoiar decisores e prescritores. A Amorim Cork Composites apostou num ecossistema digital de inovação aberta para atrair parceiros B2B em sectores como mobilidade e energia. A Critical TechWorks utiliza um storytelling técnico e campanhas de conteúdo personalizado para envolver decisores da indústria automóvel. A Sogrape, por exemplo, desenvolveu uma plataforma digital B2B para parceiros internacionais. A Secil aposta em webinars técnicos, vídeos e conteúdos orientados a engenheiros e decisores de projetos públicos e privados.

Algumas reflexões da máxima importância precisam ser acauteladas:

  • existe uma visão integrada da jornada B2B, com pontos de contacto consistentes em canais físicos e digitais?
  • os dados dos clientes estão consolidados ou dispersos em silos?
  • as métricas estão alinhadas com o impacto no negócio ou apenas com ações isoladas?
  • há equipas com competências digitais, analíticas e criativas?

Num mundo hiperconectado, onde a diferenciação é cada vez mais difícil, o marketing deixa de ser um megafone e passa a ser um sistema nervoso central — capaz de ouvir, interpretar e agir com inteligência. Já não basta comunicar bem: é preciso saber onde, quando e com que mensagem.

A maior transformação, no entanto, não é tecnológica. É cultural.

É aqui que tudo começa: na decisão de mudar a forma como pensamos o marketing B2B. Porque a diferença entre as empresas que crescem de forma sustentada e aquelas que apenas reagem ao mercado está, cada vez mais, na capacidade de alinhar estratégia, marketing e experiência de cliente como um todo coerente.

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Pedro Celeste

Pedro Celeste

Doutorado em Gestão pela Universidade Complutense de Madrid. Diplomado pelo INSEAD, London Business School, Wharton School, University of Virginia, MIT Management Sloan Management School, Harvard Business School, Imperial College of London, Kellogg School of Management de Chicago e IESE Business School. Na Católica Lisbon School of Business & Economics é Diretor Académico dos Executive Master in Management e coordenador do Programa Avançado de Marketing para Executivos, do Programa de Gestão Comercial e Vendas, do Programa de Gestão em Marketing Digital... Ler Mais..

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