Opinião
O marketing B2B na era da hiperconetividade
Durante muito tempo, o marketing B2B foi visto como um apoio às vendas: gerar leads, criar brochuras, gerir feiras, organizar eventos. Uma função tática, longe das decisões estratégicas. Mas num mundo onde os ciclos de compra são longos, multidimensionais e profundamente digitais, esta visão tornou-se obsoleta.
Hoje, mais do que nunca, o marketing B2B é uma disciplina estratégica de criação de valor, diferenciação e crescimento sustentado. A lógica do funil — atrair, nutrir, converter — está a ser substituída por uma abordagem centrada na jornada do cliente: não-linear, omnicanal, e com múltiplos pontos de contacto, stakeholders e momentos de decisão. Hoje, a jornada é cada vez mais digital, mas profundamente humana. Exige conhecimento do cliente, conteúdo de valor, e coordenação eficaz entre marketing, vendas e pós-venda.
Como estamos a responder a esta transformação nas nossas empresas?
Conhecemos com precisão o nosso ciclo de venda real, desde o primeiro contacto até à renovação ou expansão do contrato?
Temos mapeadas as personas que influenciam a decisão? Sabemos como e onde se informam?
As equipas de marketing estão envolvidas na definição da proposta de valor, na criação de soluções e na retenção de clientes?
Utilizamos dados para personalizar a jornada, prever intenções de compra e priorizar contas estratégicas?
Muitas empresas continuam a medir o sucesso do marketing pelo número de Marketing Qualified Leads (MQLs), ignorando que o valor real está na qualidade das interações, na profundidade do relacionamento e na capacidade de influenciar decisões ao longo do tempo. O marketing moderno em B2B trabalha com conceitos como Account-Based Marketing (ABM), Revenue Operations (RevOps), Customer Journey Orchestration e Intent Data. É, acima de tudo, um processo de construção de confiança escalável.
No plano internacional, empresas como a Salesforce, a SAP ou a HubSpot transformaram o seu marketing em hubs estratégicos de insights, co-criação e personalização. Mas em Portugal também há bons exemplos. A Vicaima, líder em portas técnicas para edifícios, desenvolveu conteúdos técnicos em múltiplos idiomas, integrando marketing e engenharia para apoiar decisores e prescritores. A Amorim Cork Composites apostou num ecossistema digital de inovação aberta para atrair parceiros B2B em sectores como mobilidade e energia. A Critical TechWorks utiliza um storytelling técnico e campanhas de conteúdo personalizado para envolver decisores da indústria automóvel. A Sogrape, por exemplo, desenvolveu uma plataforma digital B2B para parceiros internacionais. A Secil aposta em webinars técnicos, vídeos e conteúdos orientados a engenheiros e decisores de projetos públicos e privados.
Algumas reflexões da máxima importância precisam ser acauteladas:
- existe uma visão integrada da jornada B2B, com pontos de contacto consistentes em canais físicos e digitais?
- os dados dos clientes estão consolidados ou dispersos em silos?
- as métricas estão alinhadas com o impacto no negócio ou apenas com ações isoladas?
- há equipas com competências digitais, analíticas e criativas?
Num mundo hiperconectado, onde a diferenciação é cada vez mais difícil, o marketing deixa de ser um megafone e passa a ser um sistema nervoso central — capaz de ouvir, interpretar e agir com inteligência. Já não basta comunicar bem: é preciso saber onde, quando e com que mensagem.
A maior transformação, no entanto, não é tecnológica. É cultural.
É aqui que tudo começa: na decisão de mudar a forma como pensamos o marketing B2B. Porque a diferença entre as empresas que crescem de forma sustentada e aquelas que apenas reagem ao mercado está, cada vez mais, na capacidade de alinhar estratégia, marketing e experiência de cliente como um todo coerente.








