Opinião
“As empresas com programas de diversidade LGBTI são mais produtivas, atraem e retêm melhor os talentos”

“As empresas portuguesas estão a reconhecer a importância da inclusão LGBTI e da diversidade enquanto componente essencial do crescimento, da inovação e da sustentabilidade de cada uma delas, contribuindo para a sua rentabilidade e influenciando a própria cultura organizacional”, assegura João Mattamouros, presidente da recém criada REDI Portugal.
Empresas e líderes de diferentes setores uniram-se num compromisso com a diversidade e inclusão LGBTI, sobretudo no ambiente e local de trabalho, e criaram o primeiro ecossistema de empresas em Portugal. Assim nasceu a associação Rede pela Diversidade e Inclusão LGBTI – REDI Portugal, uma entidade que se propõe defender a comunidade LGBTI e uma sociedade mais inclusiva e equitativa, que foi apresentada oficialmente ontem, em Lisboa.
Em entrevista ao Link to Leaders, João Mattamouros, presidente da REDI Portugal, explica que a associação pretende fomentar a colaboração, formação e partilha de boas práticas entre profissionais e organizações, e fala das metas que a Associação quer alcançar este ano: dedicar-se à sensibilização para ativar e potenciar a diversidade e inclusão LGBTI corporativa nas empresas em Portugal.
Como surgiu a associação REDI? Quem está na sua origem?
A REDI em Portugal nasce do interesse de várias empresas em dar voz, dentro dos seus programas de diversidade corporativa, à diversidade das pessoas LGBTI. Algumas destas empresas, também com presença em Espanha, já trabalham a diversidade LGBTI no país vizinho, nomeadamente em colaboração com a REDI España.
É neste contexto que realizámos no verão do ano passado um encontro informal de empresas em Lisboa, coorganizado pela REDI España e pela Cuatrecasas, para debater a situação da diversidade e inclusão LGBTI em Portugal e a possibilidade de criar um ecossistema de partilha de boas práticas e de apoio às empresas para ativar, conectar e potenciar esta diversidade. Desse encontro nasceu a semente do projeto REDI para Portugal, graças ao apoio de 25 organizações fundadoras, de diferentes tamanhos e setores.
A Associação assume-se como o primeiro ecossistema empresarial de Portugal centrado na promoção da diversidade e inclusão LGBTI em ambientes de trabalho. Quais são as vossas metas prioritárias?
70% das pessoas LGBTI não se atrevem a assumir completamente esta dimensão da sua identidade nos seus locais de trabalho por medo da repercussão que possa ter nas carreiras ou relações laborais. Paradoxalmente, essa ocultação preventiva provoca mais stress laboral e carreiras profissionais menos promissoras (o que é designado de “rainbow ceiling”), com prejuízo para as próprias empresas, assim como a renúncia a direitos laborais e de equilíbrio entre vida pessoal e profissional (licenças de casamento, maternidade, doença do cônjuge ou filhos, etc.) dos trabalhadores.
O propósito-chave da REDI é que cada pessoa possa ser ela mesma e desenvolver todo o seu potencial no local de trabalho, independentemente da sua orientação, identidade, expressão ou características sexuais. Para isso, é essencial conectar as empresas e acompanhá-las na sua jornada rumo à inclusão: dar o primeiro passo, tornando explícito o seu compromisso com a igualdade de oportunidades e a não discriminação, sensibilizando sobre a vantagem e a importância da diversidade e promovendo políticas corporativas que também incluam as pessoas LGBTI.
As empresas portuguesas estão a reconhecer a importância da inclusão LGBTI e da diversidade (…)”.
Que expetativas têm quanto à adesão das empresas portuguesas à associação?
As empresas portuguesas estão a reconhecer a importância da inclusão LGBTI e da diversidade enquanto componente essencial do crescimento, da inovação e da sustentabilidade de cada uma delas, contribuindo para a sua rentabilidade e influenciando a própria cultura organizacional. A diversidade LGBTI, muitas vezes invisível e desconhecida, diferencia as empresas verdadeiramente comprometidas com a equidade. As empresas com programas de diversidade LGBTI são mais produtivas, atraem e retêm melhor os talentos e oferecem soluções empresariais mais criativas e inovadoras. É por isso que acreditamos que o nosso ecossistema irá crescer a cada ano, a par com a consciencialização das empresas em matéria de diversidade e inclusão LGBTI.
Qual o vosso plano de ação para este ano?
O nosso lançamento oficial e público aconteceu ontem, coincidindo com o EuroPride de Lisboa 2025. O evento contou com a presença de representantes das empresas associadas, entidades aliadas e personalidades reconhecidas na área da promoção da diversidade, bem como com uma mesa-redonda corporativa sobre a importância da diversidade na liderança e na cultura corporativa. Também entregamos os diplomas de adesão. Este encontro traça o roteiro de ação da REDI para 2025: dedicar-nos à sensibilização para ativar e potenciar a diversidade e inclusão LGBTI corporativa nas empresas em Portugal.
Qual a relação com a homóloga REDI Espanha? Há sinergias entre associações?
Algumas das empresas fundadoras da REDI em Portugal já integravam a REDI em Espanha. Estas empresas apostaram no modelo da REDI e, após o sucesso alcançado no país vizinho (já são mais de 300 associadas) e conscientes das vantagens de trabalhar a DEI LGBTI, decidiram trazer o modelo para Portugal em colaboração com empresas com presença no nosso país. A REDI em Portugal foi criada por e para Portugal, mas em cooperação e pleno contacto com a REDI España e com o seu modelo de sucesso como inspiração. Embora sejam associações independentes e de âmbito nacional, a REDI España é associada fundadora especial da REDI Portugal e integra o seu Conselho de Administração.
O que é que ainda está a faltar para a verdadeira diversidade e inclusão no contexto empresarial português?
A diversidade das pessoas LGBTI ainda tem um longo percurso até ser tratada com normalidade nos ambientes de trabalho. 46% das pessoas LGBTI não revelam a orientação sexual numa entrevista de emprego, de acordo com o estudo Diversity at Work (2021) da ManpowerGoup. Quase 4 em cada 10 pessoas LGTBI foram alvo de piadas ou comentários depreciativos no ambiente de trabalho, e a falta de um compromisso explícito com a diversidade e inclusão LGTBI nas empresas leva muitas pessoas LGBTI a renunciar às medidas de conciliação da vida profissional e familiar ou aos seus direitos laborais, de acordo com dados do Relatório Anual do Observatório da Discriminação contra Pessoas LGBTI+ em Portugal (2020-2022), elaborado pela ILGA Portugal. Queremos mudar esta realidade através da sensibilização das chefias de topo, da Administração, do departamento de Recursos Humanos e de todas as pessoas que trabalham em empresas, para que compreendam as vantagens das políticas corporativas inclusivas para pessoas LGBTI.
“A existência de leis não garante o cumprimento das mesmas se não for acompanhada por uma consciencialização mais alargada e uma mudança cultural (…)”.
Que medidas é que a REDI Portugal gostaria de ver implementadas a nível governamental para melhorar a realidade atual das pessoas LGBT no local de trabalho?
No contexto internacional, alguns países da Europa são pioneiros em direitos e liberdades para pessoas LGBTI. Portugal ocupa atualmente o 11.º lugar no mapa europeu, segundo a ILGA, mas ainda há desafios a enfrentar. A existência de leis não garante o cumprimento das mesmas se não for acompanhada por uma consciencialização mais alargada e uma mudança cultural, também a partir das empresas.
Nesse sentido, Espanha é uma referência com a lei para a igualdade real e efetiva e a não discriminação de pessoas LGBTI. Esta lei inclui medidas concretas que as empresas com mais de 50 funcionários estão obrigadas a implementar para garantir processos de seleção e formação sem preconceitos, sanções e protocolos específicos contra a discriminação, e programas educativos para sensibilizar as pessoas que integram a empresa. É uma lei única em todo o mundo, incluindo Portugal. Quando a REDI nasceu em Espanha, em 2018, também não existia essa legislação, mas um grupo de empresas apostou firmemente em políticas corporativas de inclusão LGBTI, tanto por uma questão de direitos humanos, como por uma questão de negócio. É num contexto idêntico que nasce a REDI em Portugal.
E o que é que as empresas portuguesas devem fazer para fomentar a colaboração e partilha de boas práticas entre profissionais e a organização?
Um dos pilares da REDI é “conectar” e com este conceito referimo-nos à partilha de boas práticas, casos de sucesso e testemunhos inspiradores. A melhor forma de promover a inclusão é ver a transformação que já está a acontecer em muitas empresas. A realização de eventos de partilha de boas práticas e networking é fundamental, e associar-se à REDI é a melhor forma de aceder a esses recursos.