Entrevista/ “Os espaços de cowork têm de ser ativos e devem adaptar-se à realidade das empresas”

Diogo Fabiana, Partner IDEA Spaces & Chief Innovation Officer

“O teletrabalho por si só não levou ao aumento da adesão do cowork. O que espoletou esta mudança foi, acima de tudo, uma vontade crescente em adotar novos modelos de trabalho, onde impere o crescimento pessoal, o desenvolvimento da equipa e um ambiente mais familiar”, afirma Diogo Fabiana, Partner IDEA Spaces & Chief Innovation Officer, no Dia Internacional do Coworking.

À medida que a cultura de trabalho se torna mais flexível e focada no equilíbrio entre bem-estar, vida profissional e pessoal, os espaços de coworking ganham popularidade, com pelo menos cinco milhões de utilizadores em todo o mundo.

Atualmente, os espaços de coworking são utilizados por empresas de todas as dimensões, desde start-ups até grandes organizações como o Airbnb e a Amazon. Os freelancers representam 41% dos utilizadores destes espaços, mas a procura de grandes empresas está a crescer, representando cerca de 40% nos próximos anos. Um estudo publicado no site da fintech North One mostra que 84% dos trabalhadores se sentem mais atraídos e motivados em ambientes de coworking, com 69% a notar um aumento no sucesso profissional.

No Dia Internacional do Coworking, falámos com Diogo Fabiana, Partner IDEA Spaces & Chief Innovation Officer, sobre o surgimento dos espaços de cowork, a oferta existente e sobre os planos da IDEA Spaces para o futuro.

Foram os novos modelos de trabalho que deram origem ao coworking ou foi este que motivou a alteração dos novos modelos de trabalho?

Nos últimos anos, temos observado várias mudanças na cultura corporativa. Numa altura em que as empresas tentam responder a desafios como a instabilidade económica, dificuldades de contratação, retenção de talento e o quiet quiting, o conceito de escritório formal, com um ambiente fechado sobre si mesmo, tem vindo a ser deixado de lado em prol de espaços abertos, onde se promove a partilha e o bem-estar. Neste sentido, o surgimento de espaços de cowork mostrou e motivou o desenvolvimento de outros modelos de trabalho, que contribuem para o bem-estar dos colaboradores.

No entanto, a adoção de novos modelos de trabalho, como o teletrabalho, também motivou a expansão e a aposta em espaços de cowork. Os colaboradores perceberam que há outras formas de contribuírem para a empresa, mas também de estas contribuírem para eles, como, por exemplo, através da criação de um espaço em que o bem-estar, flexibilidade e criação de uma comunidade são valorizados.

“A crise no setor imobiliário tem tido um impacto significativo na procura dos espaços de cowork”.

E em que medida a crise no setor imobiliário também propiciou o boom dos cowork?

A crise no setor imobiliário tem tido um impacto significativo na procura dos espaços de cowork. Além de todos os benefícios e oportunidades associadas a este tipo de espaços, o cowork tornou-se ainda mais atrativo porque as rendas dos escritórios estão muito elevadas, particularmente nos grandes centros urbanos. Este é um entrave para todo o tipo de projetos e empresas que se querem estabelecer, mas que veem o aumento dos preços como uma grande limitação para o desenvolvimento do seu trabalho. Os espaços de cowork permitem atenuar esse impacto negativo.

Se o teletrabalho não tivesse proliferado, teríamos hoje o conceito de cowork tão generalizado?

A proliferação do cowork aconteceria mais cedo ou mais tarde. Cada vez mais é imperativo as empresas perceberem que há diversos modelos de trabalho e que é necessário um ajuste dos mesmos, mediante os seus objetivos, a sua atuação e os seus colaboradores. O teletrabalho pode ter acelerado esta perceção de que há outros modelos que funcionam e contribuem para a produtividade, pois durante o período de pandemia houve uma grande resistência em voltar ao trabalho presencial e m rotina cansativa do dia-a-dia. No entanto, o teletrabalho por si só não levou ao aumento da adesão do cowork. O que espoletou esta mudança foi, acima de tudo, uma vontade crescente em adotar novos modelos de trabalho, onde impere o crescimento pessoal, o desenvolvimento da equipa e um ambiente mais familiar. Com todas as suas características, os espaços de cowork conseguem preencher essa lacuna.

No caso do IDEA Spaces, qual o vosso utilizador tipo? Pessoas a título individual? Empresas? Maioritariamente de que setores de atividade?

O IDEA Spaces acolhe uma variedade de “utilizadores”, incluindo tanto indivíduos a título pessoal como empresas de grande dimensão. A nossa comunidade abrange desde start-ups a pequenas e médias empresas (PMEs). Esta diversidade de utilizadores reflete-se nos vários setores de atividade presentes no IDEA, tais como tecnologia, serviços, consultoria e muitas outras indústrias.

“(…) o maior benefício do cowork, e razão pela qual nos procuram, é conseguir, num só espaço, proporcionar momentos de negócio, sem deixar de ter à disposição serviços de bem-estar e crescimento pessoal”.

Quais as principais preocupações/objetivos de quem vos procura?

Um dos principais objetivos de quem procura os nossos espaços é o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. O IDEA Spaces não é apenas um local de trabalho onde as empresas se podem estabelecer e trabalhar nos seus computadores. Vamos muito mais além e destacamo-nos pelas nossas dinâmicas que valorizam as pessoas não só enquanto trabalhadores, mas também enquanto filhos, amigos e pais.

Ao nível do network, promovemos dinâmicas criadas com o objetivo de reforçar a confiança entre os membros e impulsionar a partilha de objetivos em termos de negócios, necessidades de serviços ou parcerias. Além disso, temos ainda os Community Hours, momentos de network mais informal, onde é possível conviver durante uma refeição. Estes são apenas alguns dos eventos que dinamizamos ao nível empresarial, além de muitos outros de cariz social, onde procuramos angariar, a par da comunidade, fundos para diferentes organizações. Posto isto, diria que o maior benefício do cowork, e razão pela qual nos procuram, é conseguir, num só espaço, proporcionar momentos de negócio, sem deixar de ter à disposição serviços de bem-estar e crescimento pessoal.

Em que áreas geográfficas estão mais presentes?

Atualmente, o IDEA Spaces oferece quatro espaços de trabalho na área de Lisboa, mais precisamente no Palácio Sotto Mayor, Saldanha, São Sebastião e Parque das Nações, com uma taxa de ocupação que ronda os 85%. No total, a nossa comunidade conta com mais de 3500 membros e 380 empresas que vão desde start-ups a PME.

A par dos profissionais liberais, como é que as próprias empresas estão a olhar para esta solução de partilha de espaços e de custos uma vez que pode ser uma opção para reduzir as despesas?

Transferir uma empresa para um espaço de cowork é, de facto, uma decisão que tem impacto nos orçamentos, não só de pequenas empresas, como também das de maior dimensão. Por um lado, ao estarem sediadas num cowork, as grandes empresas podem reduzir as suas despesas, canalizando o excedente para outras necessidades materiais ou investindo nos recursos humanos. Por outro, esta lógica também se aplica às pequenas empresas que, além de poderem poupar nesta gestão, têm também mais margem e capital disponível para crescimento numa fase inicial.

Neste sentido, as empresas estão a olhar para esta solução de modo muito positivo. No entanto, este não é o único fator que pesa no momento da escolha e, por isso, os espaços de cowork têm de ser ativos e devem adaptar-se à realidade das empresas de modo a aumentarem a sua atratividade.

Inclusive já temos empresas que estão a rentabilizar os seus próprios espaços (entretanto vagos devido ao trabalho remoto), para coworking. Esse fenómeno pode alargar-se na sua opinião?

Acreditamos que a flexibilidade vai aumentar, mas este fenómeno não resume o conceito de cowork, é preciso mais. Mais experiência, mais vivência, mais colaboração, mais empatia, mais crescimento, mais felicidade. Assim, apesar de existirem alternativas, todas as empresas que ambicionam crescer, captar e reter talento, melhorar a produtividade e promover a felicidade dos seus colaboradores procuram sempre espaços, comunidades, projetos como o IDEA que partilham esses valores e trabalham para esses objetivos, lado a lado com os seus membros.

“(…) pode estar na altura de existir uma união entre os vários players de forma a promovermos Portugal como um destino perfeito para o empreendedorismo (…)”.

Portugal tem assistido ao aparecimento de inúmeros espaços de cowork nos últimos tempos. Estamos perante um setor muito concorrencial?

Como em qualquer mercado, quando a procura cresce, a oferta acaba por crescer. E tem-se assistido a um crescimento muito grande de players de cowork em Portugal, não só pela procura interna como externa. Assim, o mercado está cada vez mais maduro e, consequentemente, concorrencial, mas acredito que a concorrência é muito importante porque nos obriga a ser criativos, a melhorar e a ser inovadores, e esta pressão concorrencial tem vindo a “obrigar” o IDEA a antecipar inúmeras tendências e soluções.

Por fim, olhando para o futuro deste mercado com muito otimismo, pode estar na altura de existir uma união entre os vários players de forma a promovermos Portugal como um destino perfeito para o empreendedorismo e tecido empresarial em geral no estrangeiro. É um trabalho que todos temos vindo a fazer individualmente, enquanto veículos dinamizadores económicos, mas o estágio do mercado e do mundo exige unificação e, como os “coworks” defendem, colaboração.

Face a um escritório convencional, o que é que um espaço de coworking apresenta de mais-valia enquanto espaço laboral?

Os espaços de cowork são espaços agregadores de talento, ideias e equipas. Sendo frequentados por profissionais de diferentes setores, esta proximidade acaba por facilitar momentos de network, troca de ideias e ainda a criação de parcerias. No IDEA Spaces, acreditamos que a nossa configuração aberta e interativa promove a colaboração e o crescimento de empresas, quer a nível de aprendizagem, quer em termos de surgimento de negócios.

Portugal, e os grandes centros em particular, já têm o número sufficiente de oferta de espaços de coworking?

A crise imobiliária é particularmente aguda em Lisboa e noutros centros urbanos. Com um panorama marcado por rendas elevadas, quer no centro da cidade, quer na periferia, os espaços de cowork apresentam-se como soluções integradas, completas e a um preço mais acessível. Neste sentido, estes espaços, entre os quais o IDEA Spaces, têm registado uma adesão positiva por parte das empresas.

No entanto, em Portugal, o investimento não só estrangeiro como também nacional tem vindo a aumentar, com a paisagem empreendedora a expandir-se, graças ao surgimento de novas start-ups e projetos. Este ritmo acelerado no ecossistema empresarial, apesar de muito positivo, acarreta outras questões, entre as quais a disponibilidade de espaços para estas empresas se fixarem. Assim, acreditamos que há espaço para o investimento em espaços de cowork crescer, acompanhando este crescimento e surgimento de novas empresas em Portugal, aumentando a oferta de espaços mais acessíveis, nomeadamente ao nível dos preços, para acomodar estas novas entradas no mercado.

“Acredito que muitos escritórios se manterão, com empresas fiéis a esse modelo, como também reconheço que a adesão aos coworks pode aumentar”.

No futuro, qual o risco de o cowork acabar com os escritórios?

Acreditamos que o aumento dos espaços de cowork esteja relacionado com o rumo da crise imobiliária, mas também com a flexibilidade e modelos de trabalho adotados pelas empresas e colaboradores. No entanto, é importante ter em conta que há empresas que, após experimentarem modelos híbridos, de teletrabalho ou de cowork, também perceberam que esses formatos não se adequam aos seus objetivos, e também é importante ter isto em conta – que cada empresa tem um modus operandi distinto. Neste sentido, acredito que muitos escritórios se manterão, com empresas fiéis a esse modelo, como também reconheço que a adesão aos coworks pode aumentar. No IDEA Spaces defendemos a definição clara do propósito de cada empresa, e isso passa por perceber qual o modelo que funciona melhor com cada uma.

Qual a estratégia do IDEA Spaces para o próximo ano? Aumentar oferta, melhorar espaços…?

2024 está a ser um ano de reestruturação e reposicionamento, com uma aposta vincada em melhorar, renovar os nossos espaços e otimizar a experiência, com grande foco no nosso compromisso de melhorar a qualidade de vida das pessoas, fazendo-as felizes, seja a nível pessoal, social ou profissional. 2025 vai ser, com certeza, um ano de crescimento, seja em expandir os espaços atuais ou mesmo expandir para novas localizações/espaços.

Neste momento estamos em forte crescimento na área de novos clientes, incluindo multinacionais de renome e, por isso mesmo, o investimento tem sido em renovar e melhorar todos os espaços. Olhando para a experiência e crescimento dos nossos membros, vamos lançar agora uma nova app que procura promover networking, mas levando a nossa comunidade além dos nossos espaços, com um investimento de mais de 100 mil euros neste projeto, pois acreditamos que a tecnologia é um pilar essencial da nossa marca.

Quais os investimentos que têm em agenda?

Entre este ano e o próximo vamos investir cerca de dois milhões de euros nas nossas localizações, entre infraestruturas, decoração e tecnologia.

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