Entrevista/ “Queremos estar sempre a ajudar os hospitais na fase da biópsia, não na fase de autópsia”

José Pedro Fernandes, vice-presidente da SISQUAL WFM

“Em muitas geografias no mundo, morrem mais pessoas ao fim de semana do que durante a semana dentro dos hospitais, porque os recursos humanos mais preciosos preferem folgas ao fim de semana, e, por isso, os doentes ficam mais vulneráveis. Logo, o primeiro grande desafio é trazer um nível elevado de segurança aos pacientes”, afirmou José Pedro Fernandes, vice-presidente da SISQUAL WFM, em entrevista ao Link to Leaders.

Num mundo cada vez mais digital, não há dúvida de que a eficiência se tornou num pilar fundamental da produtividade empresarial. No entanto, na procura frenética por soluções tecnológicas de ponta, a gestão eficaz de recursos humanos é muitas vezes negligenciada. É neste ponto que o software especializado em Workforce Management (WFM) se apresenta como uma ferramenta essencial que faz a diferença no desempenho do negócio, defende José Pedro Fernandes, vice-presidente da SISQUAL WFM.

Fundada em 1992, no Porto, hoje a SISQUAL WFM está presente a nível nacional, onde mais de 70 hospitais utilizam o seu software, no Brasil, Espanha, Reino Unido, Arábia Saudita e Polónia.

Ao Link to Leaders, José Pedro Fernandes revela que “atualmente, em mais de 50% dos hospitais a organização das escalas ainda é feita à mão. Num hospital pode haver em média até 8000 trocas de horários por mês”. Por isso, defende, “é necessário haver um processo automático em que isto aconteça, e que, quando chega o final do mês, consiga cruzar todas a rubricas e variáveis como horas a mais ou a menos, subsídios ou faltas, para que essa informação venha espelhada na folha de pagamentos. O cruzamento da assiduidade e horas com estas rubricas para salários tem de ser feito em tempo real. Se não houver processos automáticos de gestão neste tipo de situações, torna-se muito difícil de gerir e ter de alguma forma excelência operacional dentro do hospital”.

Que balanço faz destes mais de 10 anos à frente da SISQUAL WFM?
Ao refletir sobre mais de uma década na SISQUAL WFM, destaco o notável crescimento da empresa, mantendo uma trajetória de crescimento de dois dígitos anualmente. Observo um crescente sucesso do produto que, ao longo do tempo, evoluiu para se tornar numa referência global em Workforce Management. Hoje, competimos com os líderes de mercado, conquistando espaço em um setor de nicho que muitas vezes demanda a venda do conceito antes do produto, especialmente em mercados onde a tecnologia ainda não atingiu um público mais amplo. O crescimento da SISQUAL WFM não se resume apenas à expansão geográfica, mas também ao desenvolvimento contínuo do produto, capacitando-o a competir efetivamente em escala global.

Quais os desafios que se colocam à gestão hospital nos dias de hoje?
O principal desafio é a própria vida dos pacientes. Em muitas geografias no mundo, morrem mais pessoas ao fim de semana do que durante a semana dentro dos hospitais, porque os recursos humanos mais preciosos preferem folgas ao fim de semana, e, por isso, os doentes ficam mais vulneráveis. Logo, o primeiro grande desafio é trazer um nível elevado de segurança aos pacientes, isto é, fazer com que cada um de nós, quando entra num hospital se sinta seguro, quer seja à segunda ou ao sábado. Depois, há outros desafios que são tecnológicos e que vão dar viabilidade à parte operacional. Isto é, em linguagem de hospital, queremos estar sempre a ajudar os hospitais na fase da biópsia, não na fase de autópsia. Queremos que nos hospitais, os programas sejam vistos em tempo real, e possam ter solução em tempo real, uma vez que, o que está em causa, ao contrário do setor do retalho ou dos serviços, não é a faturação, mas sim a vida das pessoas.

Aquilo que também é um grande desafio nos hospitais é a automatização dos processos, isto é, fazer com que hoje se consiga de forma automática controlar toda a operação. Através destas tecnologias, enfermeiros chefe, por exemplo, não precisam de passar 70% do seu tempo a desenvolver tarefas administrativas, mas sim a formar colegas e a desenvolver competências. Por fim, outro desafio é sermos capazes de, em qualquer mudança de turno dentro de um hospital, fazer o redimensionamento da equipa que vai entrar no turno seguinte, de forma automática e muito ajustada ao que é a criticidade dos doentes que estão naquele momento a entrar naquela unidade e a taxa de ocupação de camas.

“Atualmente, em mais de 50% dos hospitais a geração das escalas ainda é feita à mão. Num hospital pode haver em média até 8000 trocas de horários por mês”.

De que forma é possível otimizar a eficiência operacional dentro dos hospitais?
Para que um hospital possa responder àqueles que são os grandes desafios, é preciso que as tecnologias, e não só a nossa, estejam a ser usadas. Atualmente, em mais de 50% dos hospitais a geração das escalas ainda é feita à mão. Num hospital pode haver em média até 8000 trocas de horários por mês. É necessário haver um processo automático em que isto aconteça, e que, quando chega o final do mês, consiga cruzar todas a rubricas e variáveis como horas a mais ou a menos, subsídios ou faltas, para que essa informação venha espelhada na folha de pagamentos. O cruzamento da assiduidade e horas com estas rubricas para salários tem de ser feito em tempo real. Se não houver processos automáticos de gestão neste tipo de situações, torna-se muito difícil de gerir e ter de alguma forma excelência operacional dentro do hospital.

Quais as vantagens da plataforma SISQUAL WFM?
Temos 14 módulos para a área da saúde numa suite e que o hospital pode adaptar a ferramenta às suas necessidades, pode não usar todos, mas verá valor em utilizar muitos deles. O que acontece no mercado é que há empresas que competem com a SISQUAL WFM que desenvolvem apenas uma pequena parte do processo. Ou são empresas de assiduidade e só trabalham a assiduidade, ou são empresas de gestão de escalas e só trabalham a gestão das escalas. Perante isto, a SISQUAL WFM consegue desenvolver o processo desde o início até ao fim, o que será sempre uma vantagem para quem utiliza a ferramenta, principalmente a assertividade no cálculo das rubricas quando integrados ao sistema de folha de pagamento.

Quantos hospitais utilizam atualmente a vossa plataforma?
Em Portugal, mais de 70 hospitais utilizam o software da SISQUAL WFM, mas posso dizer que, no Brasil, temos mais de 400 hospitais a usarem a nossa plataforma.

Os hospitais devem olhar mais para a questão da eficiência da organização ou para forma como os recursos humanos são geridos?
Nos hospitais, é crucial equilibrar a eficiência da organização e a gestão dos recursos humanos. Em qualquer cenário, seja em países desenvolvidos ou em desenvolvimento, os recursos humanos representam uma parcela significativa – entre 45% e 65% – dos recursos do hospital. A competência e qualificação desses recursos são de extrema importância para o funcionamento adequado da instituição. A eficiência da organização também desempenha um papel vital. Ela está intrinsecamente ligada às ferramentas e sistemas que a instituição utiliza. Um hospital que utiliza ferramentas avançadas pode otimizar seus processos e, consequentemente, facilitar a gestão dos recursos humanos.

É importante reconhecer que ambos os aspetos estão interligados. Uma organização eficiente pode melhorar a utilização dos recursos humanos, mas estes continuam a ser a chave para o funcionamento adequado do hospital. Em contextos de Workforce Management (WFM), é crucial considerar como as ferramentas e sistemas podem melhorar a gestão dos recursos humanos, mas também reconhecer os limites da automação nesse ambiente. Enquanto na logística é possível substituir pessoas por máquinas, num hospital, a substituição total de profissionais por robôs é inviável, destacando a importância contínua dos recursos humanos na prestação de cuidados de saúde.

“Antes procurávamos que os hospitais respondessem numa primeira linha e hoje não temos apenas a primeira linha. Quem está à frente de uma instituição hospitalar mexe com um valor fundamental que é a saúde”.

Qual a importância das lideranças nas instituições de saúde?
É muito importante que haja lideranças muito bem sustentadas e bem preparadas. Hoje, gerir um hospital é um desafio muito complexo, e por isso, as lideranças estão cada vez mais preparadas e mais à procura de boas ferramentas e bom conhecimento uma vez que o desafio é cada vez mais exigente. Antes procurávamos que os hospitais respondessem numa primeira linha e hoje não temos apenas a primeira linha. Quem está à frente de uma instituição hospitalar mexe com um valor fundamental que é a saúde. Não estamos a tratar de números, mas um hospital não pode dar prejuízo porque se der prejuízo pode ter de fechar e assim prejudicar uma comunidade inteira – são centenas de pessoas que podem ter a sua saúde agravada por não terem a capacidade de ter muito bons cuidados de saúde.

Quais as competências necessárias para a gestão de instituições hospitalares?
Atualmente, é preciso uma mescla de conhecimentos que vão desde os conhecimentos de gestão pura e dura aos conhecimentos médicos. Se repararmos, hoje está a haver um crescimento exponencial na telemedicina, que começa cada vez mais a ganhar um enorme espaço e quem está a gerir instituições hospitalares tem de ter competências genéricas a nível da gestão, mas também competências especificas daquele negócio que muitas vezes têm a ver com um conhecimento muito grande daquilo que é a parte operacional dentro de um hospital e dentro da própria evolução da medicina. Nestes casos, acabamos por ter de pensar que há uma multidisciplinariedade de competências que têm de estar presentes.

Hoje em dia os médicos são bons gestores? O que ainda precisam?
Eu acho que os médicos têm de ser cada vez melhores médicos e os gestores hospitalares cada vez melhores gestores, e estes lados não se deviam confundir. Os médicos devem manter-se fiéis às suas competências, exercer o melhor possível a medicina e humanizarem a medicina.

“Somos responsáveis pelas escalas de todos os enfermeiros do SNS, e o SNS tem vindo a investir nos seus recursos humanos e o recursos a ferramentas é uma aposta de quem dá o devido valor a esses recursos, mas existe ainda um caminho a percorrer”.

O SNS tem investido o suficiente nos recursos humanos?
A SISQUAL WFM presta um grande serviço ao SNS. Somos responsáveis pelas escalas de todos os enfermeiros do SNS, e o SNS tem vindo a investir nos seus recursos humanos e o recursos a ferramentas é uma aposta de quem dá o devido valor a esses recursos, mas existe ainda um caminho a percorrer.

Projetos para o futuro da SISQUAL WFM?
Há 15 anos que só fazemos uma coisa que é Workforce Management e fazemo-lo enquanto os melhores nas geografias em que trabalhamos. O maior desafio estratégico é fazer com que aquilo que já é uma realidade, seja uma realidade ampliada. Hoje, a SISQUAL WFM é uma empresa multinacional que está presente com escritórios próprios em cinco países do mundo e que tem parceiros em mais 10. Nos próximos anos queremos estar na Turquia, México e Chile. Estaremos em 22 geografias na Europa por termos ganho uma conta que não está relacionada com o meio hospitalar, mas sim com a área do retalho. É este o nosso objetivo, que a SISQUAL WFM seja cada vez mais internacional, mais forte e com uma maior amplitude.

No que toca aos objetivos técnicos, ou seja, relacionados com o produto, temos grandes ambições. A SISQUAL WFM está a fazer um caminho com um crescimento muito sustentado e orgânico, e obviamente tem que ter ambições muito fortes para continuar a crescer da maneira como tem crescido.

 

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