Opinião

O ano político terminou agitado e começará ainda mais agitado. O Primeiro-Ministro apresentou a sua demissão, perante as suspeitas resultantes de mais um processo criminal promovido pelo Ministério Público. O Presidente da República decidiu, no quadro das distintas opções previstas na Constituição, dissolver a Assembleia da República e marcar eleições para 10 de março de 2024.

Os principais partidos políticos tocam os tambores, organizam-se nas suas casernas e preparam-se para a disputa eleitoral. Uma certeza para 2024: teremos uma nova liderança no Governo, provavelmente novas propostas políticas, mas dificilmente se espera que surjam novas formas de governar o nosso País. Afinal, o País precisa de decisores, que com as suas políticas possam trazer o progresso económico, social e cultural. Mas o País precisa sobretudo de decisores que sintam que os tempos que vivemos tanto exigem estabilidade como emergência na ação.

Estabilidade significa não eliminar nem alterar as políticas que permitem atrair investimento, criar emprego e sustentar o crescimento económico. Não é mais possível gerir o País ao sabor da demagogia e populismos políticos e do imediatismo mediático, sem nunca fazer um prévio planeamento ou uma avaliação independente dos resultados de determinadas medidas. Os exemplos recentes da amálgama de alterações constantes do chamado Programa Mais Habitação, ou a forma como sucumbiu o regime do Residente Não Habitual (RNH), ou ainda o corte e costura das negociações à mesa do Orçamento do Estado, são verdadeiros casos de estudo sobre como não fazer política. Tudo é negociado, artigo a artigo, vírgula a vírgula, apenas para satisfazer a barganha política e conseguir 5 minutos de glória no “prime time” televisivo. O resultado são regimes jurídicos indecifráveis pela sua complexidade ou incompletude, e muitas vezes até incoerentes face aos seus propósitos iniciais.

Emergência significa enfrentar os problemas reais vividos pelos Portugueses: ter rendimentos estáveis que permitam construir um projeto de vida pessoal, familiar e profissional e que não se degradem com alterações disruptivas do custo de vida; poder aceder uma habitação, seja qual for o tipo de ofertas habitacionais e o perfil socioeconómico em causa; dispor de uma rede de serviços públicos que satisfaça de forma eficiente as necessidades quotidianas, sobretudo nos planos da educação, da saúde e da proteção social. E também enfrentar os problemas vividos pela população migrante, sejam investidores, reformados, trabalhadores, estudantes ou empreendedores. É incompreensível, para não dizer embaraçosa, a forma como acolhemos cidadãos estrangeiros e como o poder político olha inoperante há anos para esta realidade.

No fundo, as políticas públicas devem ser estáveis para que a economia possa funcionar e os agentes económicos não tenham receio de desenvolver a sua atividade e de ter iniciativa para implementar novos projetos inovadores. Mas há muitas políticas que requerem emergência de ação porque o bem-estar das populações não pode ser permanentemente adiado pela incapacidade de nos sabermos gerir e organizar.

O ano de 2024 marcará os 50 anos da Revolução de Abril e da entrada num Portugal num regime democrático, pluralista e, sobretudo, respeitador das liberdades dos seus cidadãos. Vivemos num País que tem as suas instituições democráticas consolidadas, o seu Estado de Direito aprofundado e que se encontra plenamente integrado na comunidade internacional, sobretudo depois da adesão à União Europeia.

Mas não podemos viver num País parado no tempo, que não é capaz de crescer economicamente, que está refém das matrizes ideológicas do pós-25 de abril e que não consegue acompanhar os desafios globais.

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André Miranda

André Miranda

André Miranda é managing partner da Fieldfisher Portugal, coordenando as áreas de direito público e regulatório da Sociedade, com especial foco nos setores da energia, imobiliário, jogo, transportes e saúde. Conta com uma longa carreira profissional, tendo feito parte, entre 2005 e 2010, do XVIII Governo Constitucional e do XVII Governo Constitucional, como Chefe do Gabinete do Ministro dos Assuntos Parlamentares e Chefe do Gabinete do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, respetivamente. Entre 2010 e 2011,... Ler Mais..

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