Retalhistas que se tornam venture capitalists: uma tendência em ascensão nos EUA

Embora algumas empresas de investimento estejam mais reticentes em aplicar o seu capital este ano, há um novo grupo em ascensão nos EUA: os retalhistas que mostram cada vez mais interesse em investir em start-ups.
A Home Depot anunciou em maio a criação de um fundo de capital de risco de 150 milhões de dólares (143 milhões de euros) para investir e fazer parcerias com start-ups em fase inicial. Em março, a Victoria’s Secret anunciou um investimento de 18 milhões de dólares (17 milhões de euros) para uma participação minoritária na marca de moda praia Frankies Bikinis. Um mês antes, a gigante de lingerie revelava que queria investir 7 milhões de dólares (6,7 milhões de euros) em negócios liderados por mulheres.
Apesar de o investimento dos retalhistas em start-ups não ser algo novo, os investidores e consultores acreditam que se está a tornar numa tendência à medida que precisam de evoluir mais rapidamente para responder às necessidades dos clientes. Enquanto alguns concentram os seus investimentos em empresas de tecnologia, outros estão a investir em empresas de pequena dimensão para promover uma causa.
“Cada vez mais retalhistas estão a começar a perceber que investir em parcerias com start-ups realmente cria valor estratégico real e também ajuda a reforçar uma cultura de inovação”, disse Alaina Hartley, chefe de equipa e investidora da empresa de capital de risco Greycroft, citada pelo site norte-americano Modern Retail.
Aceder a conhecimento e melhorar a experiência do cliente é apontado pelos especialistas como o principal motivo que leva os retalhistas a investirem em start-ups.
Veja-se o caso da Walmart que no ano passado fez diversos investimentos em empresas de tecnologia para desenvolver um método alternativo de entrega de produtos. A maior cadeia retalhista norte-americana revelou que fez um investimento no fornecedor de serviços de drones DroneUp, bem como na empresa de veículos autónomos totalmente elétricos Cruise. Os valores dos negócios não foram divulgados. Já este ano a Walmart investiu também na start-up de agricultura vertical indoor Plenty e criou e apoiou uma start-up de fintech chamada One.
O fundo de capital de risco da Home Depot (que vende material para casa e para construção), denominado de Home Depot Ventures, investe em start-ups em fase inicial e em crescimento que podem fornecer soluções para alguns dos desafios que os seus clientes necessitam e que mostram potencial de escala. Entre as empresas em que já investiu, encontram-se a plataforma digital para reformular casas de banho chamada Made Renovation, a plataforma de entrega colaborativa Roadie e a empresa de tecnologia de entregas Loadsmart.
“Quando faz um investimento, tem uma opinião sobre como o produto é desenvolvido. Tem acesso aos developers de produtos e gestores e produtos”, disse Kelly Goetsch, diretora de estratégia da plataforma de comércio digital Commercetools. Além disso, “obtém acesso a novos recursos antes de todos os outros. Portanto, é um diferencial competitivo bastante substancial poder fazer esse investimento”, acrescentou a responsável.
Em 2017, a Target, por exemplo, investiu uma quantia não revelada na marca de colchões Casper, mostrando o seu interesse em conquistar uma reputação trendy entre os consumidores. Para a Casper, o acordo deu à marca a oportunidade de aceder ao know-how de um retalhista de renome.
Kelly Goetsch frisou que “quando empresas ou marcas menores se unem a um grande retalhista isso serve essencialmente como um selo de aprovação”. A parceria com grandes retalhistas torna mais fácil para as empresas menores construir a sua reputação e a sua rede de parceiros de retalho.
No entanto, nem todas as parcerias entre retalhistas e start-ups terminam de forma harmoniosa. Especialistas dizem que os retalhistas e as start-ups podem não partilhar os mesmos objetivos e que, por vezes, os retalhistas de maior dimensão podem acabar por “distrair” as start-ups de atingir as suas metas.
“As start-ups devem sempre estar atentas a quem aceitam investimentos”, aconselha Alaina Hartley, chefe de equipa e investidora da empresa de capital de risco Greycroft. “Gostamos de pensar nisso através de uma estrutura de alinhamento de valores. Está alinhado com a visão, está alinhado com os valores da empresa e é alguém com quem gostaria de trabalhar nos próximos 10 anos?”, questiona.
Investir em start-ups como estratégia de branding
Para muitos retalhistas, o financiamento em start-ups é também uma ferramenta de branding para apoiar uma causa específica, disse Adam Pressman, diretor administrativo da prática de retalho da AlixPartners. É disso exemplo o investimento da Victoria’s Secret nas mulheres empreendedoras. Há algumas semanas, a Victoria’s Secret lançou um marketplace inclusivo chamado VS&Co-Lab.
Outro dos exemplos chega-nos da Target. Após os protestos do Black Lives Matter, em 2020, a Target foi um dos retalhistas que prometeu investir em negócios detidos por negros. A empresa disse que prevê gastar 2 mil milhões de dólares (cerca de 2 mil milhões de euros) em negócios propriedade de negros até 2025. Até agora, a Target aumentou os seus investimentos em empresas e fornecedores neste segmento em 50%.
“Estes investimentos podem ser uma ferramenta de marketing realmente eficaz, desde que as empresas também demonstrem esse compromisso com os seus valores e outras dimensões do negócio”, explicou Hartley, acrescentando que as marcas devem garantir que a sua base de funcionários reflete a demografia dos seus clientes e reavalia constantemente o seu valor.