Entrevista/ “Não basta estar presente no online, há que ‘fazer negócio no digital'”

João Figueiredo e Ana Cravo, cofundadores do Minty Lab

“A transformação não existe só por uma marca ter um site. É necessário investir, e enquanto as marcas não perceberem isto não haverá uma transformação real”. Quem o diz são os cofundadores do Minty Lab, um “laboratório” digital que ajuda o setor da moda a vingar no digital. João Figueiredo e Ana Cravo explicam ao Link To Leaders a essência do projeto.

Para João Figueiredo, formado em sistemas de informação e anteriormente ligado a projetos na área industrial, e Ana Cravo, mestre em Design, o digital é o melhor canal que as marcas portuguesas têm para se assumirem fora de Portugal. Talvez a pensar nisso, os cofundadores da Minty Lab, e também do marketplace de moda nacional Minty Square, criaram um projeto tecnológico que pudesse oferecer os recursos necessários às marcas para que estas alcançassem o sucesso no digital. Pretendem acelerar a transformação digital do setor da moda, e dar robustez aos negócios de moda no digital – desde a montra, à adaptação da marca, ao serviço ao cliente até à logística e pós-venda.

Afirmam que com o atual cenário de pandemia, Portugal foi um dos países menos preparado na vertente digital, e que qualquer marca pode ter um site por centenas de euros, mas isso de pouco ou nada serve. É preciso mais como explicam ao Link To Leaders. João Figueiredo e Ana Cravo referem também que algumas das tendências que vão marcar o mercado da moda são o facto das marcas deixarem de estar tão concentradas em trabalhar o seu próprio canal e preocuparem-se em vender o produto através da adesão e participação em novos canais que as levem a um maior número de pessoas.

O que é exatamente a Minty Lab?  
João Figueiredo (J.F.): A Minty Lab é um laboratório digital que acelera a passagem do offline para o online. Ajudamos todos os negócios a desenvolver a sua entrada e/ou permanência no mundo digital. Esta vertente surgiu fruto do contacto e experiência que alcançámos com a criação e gestão da Minty Square. Depois de trabalharmos e desenvolvermos o nosso canal de forma bem-sucedida, procurámos ir mais longe e migrámos o nosso how-how tecnológico para as marcas e empresas que pretendam crescer online. No fundo, a Minty Lab permite uma entrada rápida e eficaz no digital, com acesso imediato a uma equipa multidisciplinar.

Como é que este projeto de “laboratório de transformação digital” da moda, como afirmam, surgiu? O que vos motivou a avançar para esta proposta empresarial? 
Ana Cravo (A.C): Durante a evolução da plataforma Minty Square desenvolvemos tecnologia e aprofundámos o nosso conhecimento junto das marcas, compreendendo as suas reais necessidades. As marcas não estão capacitadas de know-how suficiente para enfrentar as constantes transformações que o digital impõe e é nesse sentido que a Minty Lab surge. Não basta estar presente no online, há que “fazer negócio no digital” e colocar os nossos parceiros a fazê-lo bem.

“(…) consideramos que uma marca só poderá ter sucesso no online se conseguir ter capacidade de promover um serviço de excelência em todos os campos anteriores”.

Afirmam-se como uma equipa especializada, focada no sucesso online das marcas. Nesta medida, o que é que as marcas podem esperar das vossas soluções digitais?  
J.F.: Consideramo-nos uma equipa multidisciplinar, capaz de dar resposta aos vários desafios do digital. Temos os pilares e os conhecimentos necessários para poder realizar todo o processo de presença e negócio no online – desde a criação do site, ao branding, à comercialização do produto, à logística, e ao serviço pós-venda, uma vez que consideramos que uma marca só poderá ter sucesso no online se conseguir ter capacidade de promover um serviço de excelência em todos os campos anteriores.

O setor da moda nacional está a saber aproveitar corretamente as potencialidades do digital, nomeadamente no que se refere ao e-commerce?
A.C.: Ainda há um longo caminho a percorrer. Atualmente, e fruto da necessidade, as marcas estão a ir para o online, enfrentando todo um conjunto de novos processos e aprendizagens. Ainda há muito para fazer, e este é o nosso campo de ação.

“(…) é obrigatório estar no online para quem quiser crescer e sobreviver neste novo panorama”.

Pode dizer-se que a transformação digital do setor da moda em Portugal já é uma realidade?  O que é que ainda urge fazer nesta matéria?
J.F.: É uma realidade no sentido em que é obrigatório estar no online para quem quiser crescer e sobreviver neste novo panorama. Porém, tem de existir uma consciência de investimento para a transição e sucesso no mundo digital. A transformação não existe só por uma marca ter um site. É necessário investir, e enquanto as marcas não perceberem isto, não haverá uma transformação real. Montar uma estratégia e identificar quais os processos necessários, as ferramentas que têm de ser usadas e como trabalhá-las, são alguns dos aspetos que exigem conhecimento e trabalho diário. Um único site não chega para vender para o mundo inteiro e o que urge é fazer com que as empresas e retalhistas percebam isto. Muitas marcas, quando olham para o online, têm o objetivo imediato de ir rapidamente além-fronteiras – é muitas vezes essa a estratégia quando nos procuram –, no entanto, é preciso afirmarem-se num mercado, consolidarem-se com sucesso e só depois partir para um novo mercado.

“Portugal foi um dos países menos preparado na vertente digital, sobretudo quando comparado com outros países como França, Alemanha ou países nórdicos (…)”

Quais os países, e mesmo marcas, mais avançados nesta vertente digital? Aqueles que podem servir de inspiração para as marcas portuguesas? 
A.C.: Com o atual cenário de pandemia, Portugal foi um dos países menos preparado na vertente digital, sobretudo quando comparado com outros países como França, Alemanha ou países nórdicos, que consideramos mercados de referência, destacando os marketplaces como a ASOS ou a Farfetch como verdadeiros pontas de lança no que toca ao digital.
A Nike é também uma marca na qual podemos retirar grandes aprendizagens, e que apesar de apostar no canal offline, está cada vez mais focada no canal online registando um dos maiores crescimentos, e, por isso, deve ser absolutamente considerado como caso de inspiração para as marcas portuguesas.

A Minty Lab assume que quer levar os projetos dos clientes ao “próximo nível”. Em que consiste exatamente essa abordagem? 
J.F.: O “próximo nível” consiste no incremento das vendas de todos os nossos parceiros. Com o nosso apoio, as marcas com quem trabalhamos já conseguiram um aumento notório dos resultados e das receitas. Todos os nossos parceiros alcançaram um crescimento positivo exponencial entre os 62% e os 100%. Este aumento ocorreu graças ao desenvolvimento de processos inovadores e uma estratégia digital bem estruturada.

As empresas portuguesas desta área já são recetivas à mudança e à inovação tecnológica, às inúmeras possibilidades de fazer negócio no digital ou ainda privilegiam os espaços físicos?
J.F.
: A presença no espaço físico ainda é uma realidade, contudo há recetividade para apostar no canal online, mas infelizmente o investimento que está a ser feito ainda não é o correto para este tipo de plataformas e serviço. A consciência mudou, mas há que adaptá-la à realidade do mercado. Qualquer marca pode ter um site por centenas de euros, mas isso de pouco ou nada serve.

Que balanço fazem da atividade do Minty Lab? 
A.C.: Estamos num processo franco de crescimento e bastante satisfeitos com o caminho que temos percorrido. Estamos a ajudar a revitalizar marcas com história, como por exemplo a conceituada marca de calçado Nobrand com mais de 30 anos no mercado, e a fazer crescer marcas emergentes como é o caso da Sneakers Delight.  Como conquistas destacamos sobretudo o crescimento sustentável e exponencial que temos vindo a proporcionar aos nossos parceiros.

“(…) vamos redobrar a aposta na Minty Square em 2021. Temos um novo modelo de monetização em afinação (…)”

E como está a correr o vosso primeiro projeto o markteplace Minty Square? É para manter em paralelo com o Minty Lab?  
J.F.: A Minty Square passou, como muitos outros negócios, por um ano de 2020 muito desafiante. No entanto, tem uma marca já forte e algo reconhecida pelo mercado, e é uma montra e uma ferramenta poderosa para o ecossistema de moda nacional por permitir visibilidade a um leque grande de marcas e estilistas emergentes. Também nos ajuda muito a tornar mais robusta toda a nossa oferta aos clientes Minty Lab – dando dimensão e experiência às nossas equipas, permitindo-lhes testar e trabalhar soluções que não seriam possíveis de outra forma, e ainda garantindo escala e tráfego a outras plataformas Minty Lab.

Por todas estas razões, vamos redobrar a aposta na Minty Square em 2021. Temos um novo modelo de monetização em afinação e estamos confiantes que conseguiremos reativar o entusiasmo e a colaboração tanto das marcas parceiras como do mercado nacional, que são essenciais para que voltemos a níveis de volume que sustentem a plataforma por si. Dando bem esse passo ao longo deste primeiro semestre do ano, no segundo semestre estaremos a escalar as atividades nos mercados espanhol, inglês e alemão, onde já estamos presentes.

Tendo em conta o atual cenário económico que se vive, que tendências anteveem para o mercado da moda?  
A.C.: Visibilidade e sustentabilidade. Na nossa opinião, algumas das tendências que vão marcar o mercado da moda são o facto das marcas deixarem de estar tão concentradas em trabalhar o seu próprio canal e preocuparem-se em vender o produto através da adesão e participação em novos canais que as levem a um maior número de pessoas – como os marketplaces. Por outro lado, a sustentabilidade é algo inegável no futuro da moda, com a passagem do fast fashion para o slow fashion a marcar o caminho do consumidor, cada vez mais consciente e alerta para hábitos sustentáveis.

A experiência do consumidor e o serviço ao cliente serão também dois tópicos fundamentais no futuro do mercado da moda, sobretudo numa altura em que as marcas terão de chegar ao consumidor essencialmente através do online. Esta tendência fará com que as marcas tenham de criar mecanismos para conseguir criar um serviço de excelência, independente de contacto físico, para terem sucesso.

É fácil ser empreendedor neste setor de atividade? Quais as principais contrariedades com que a Minty Lab, e também a Minty Square, se têm deparado ao longo dos cinco anos de atividade?
A.C.:
Num mercado tão exigente e em constante mutação, as dificuldades são proporcionais às exigências de cada projeto. Inovar é um desafio constante que gera resistência, mas que temos vindo a superar, entregando produtos com qualidade conquistando assim a satisfação, o respeito e a notoriedade no mercado.

“(…) o digital é o melhor canal que as marcas portuguesas têm para se assumirem fora de Portugal”.

A tecnologia, o digital, pode dar um boost às marcas nacionais no sentido de as colocar no panorama internacional? 
J.F.: Sim, claro. Sem dúvida que o digital é o melhor canal que as marcas portuguesas têm para se assumirem fora de Portugal. Não conhecemos melhor forma do que o online para internacionalizar uma marca.

Respostas rápidas: 
O maior risco:  falta de consciência de investimento das marcas.
O maior erro:  aposta em marcas que não quiseram investir o suficiente.
A maior lição:  conhecimento do mercado, das relações, dos diferentes tipos de gestão que existem.
A maior conquista: dobrar a faturação de um parceiro que já estava no online.

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