Entrevista/ “É importante as empresas saberem cuidar da comunicação”
A poucos dias de iniciar a 3.ª edição do programa “Gestão Integrada da Comunicação – Uma abordagem 360.º”, com arranque previsto para o próximo dia 5 de abril, José Manuel Seruya, co-cordenador deste programa da Católica Business School, falou ao Link to Leaders da importância da comunicação na estratégia das empresas.
O que deve ser uma boa gestão integrada de comunicação numa empresa?
A primeira coisa que penso ser relevante para que isso aconteça é ter pessoas com uma visão estratégica da comunicação ao nível da alta direção da organização. Esse é, genericamente falando, o primeiro desafio e talvez a primeira dificuldade que se encontra. Regra geral, as pessoas que estão no topo das organizações ou empresas não têm formação específica em comunicação (e não acho que devam ter para se fazer gestão integrada da comunicação), mas é preciso desenvolver essa perspetiva estratégica para a comunicação. Ou seja, julgo que há demasiada perspetiva instrumental da comunicação, no sentido mais operativo, por exemplo, de fazer passar a mensagem comercial, e falta muitas vezes esta visão mais holística, mais completa e integrada.
Como em tudo nas organizações, acho que a comunicação começa pelo topo e se quem está no topo não a promove, se não tem essa capacidade e essa vontade de olhar para a comunicação nessa perspetiva integrada, então vai ser sempre muito mais difícil. É preciso cultivar essa visão integrada e não uma visão parcelar, nem estritamente operativa. E não se trata de haver uma direção de comunicação que porventura faça a gestão integrada da comunicação. Isso poderia ser o ideal, mas temos de pensar que na maioria das organizações não há massa crítica ou volume de negócio para poder ter um diretor de comunicação. A responsabilidade de condução dos destinos de comunicação de uma organização poderá estar incluída noutro tipo de funções, como os recursos humanos, o marketing ou no próprio diretor geral.
No fundo, a gestão integrada da comunicação é uma perspetiva que permite olhar para os stakeholders da empresa (colaboradores, clientes, parceiros, fornecedores, autoridades, etc.), e percebê-los nessa perspetiva integrada. Perceber quem são, que desafios se colocam e atribuir-lhes valor diferencial. Esse é outro desafio muito interessante, porque para fazer gestão integrada de comunicação tem de se fazer gestão de stakeholders. Antes de definir, por exemplo, como se faz a intranet, uma newsletter, um site ou um evento, é preciso reconhecer a diversidade dos stakeholders. Isso é fundamental para perceber o caminho a seguir.
Em que medida?
Há aqui três perspetivas interligadas para agarrar a gestão integrada da comunicação: a perspetiva do topo da direção que deve ter essa visão estratégica da comunicação integrada; por outro lado, ter uma visão dos destinatários, quem são os stakeholders e que tipo de comunicação se quer fazer. Temos depois uma gestão integrada de conteúdos: saber que conteúdo se adapta a este ou aquele tipo de stakeholder. E, finalmente, a parte mais visível, e difícil hoje em dia, a da gestão integrada dos meios de comunicação. É complexa do ponto de vista dos meios e dos métodos que utilizamos para comunicar. Hoje existem muitos e diferentes meios e precisamos de ter diferentes expertises. Esta é outra das dificuldades da gestão integrada. Têm de se integrar conhecimentos para agir em termos de comunicação. Não é só uma questão de técnica, de saber trabalhar em plataformas digitais, por exemplo. São competências de comunicação que têm de se integrar, várias expertises e valências. Daí que este curso também tenha uma diversidade muito grande, porque tocamos várias áreas: desde a gestão de patrocínios ao networking, comunicação organizacional e de crise, media relations ou direito da publicidade.
Então como vai ser o programa?
Há aqui um melting pot de perspectivas que ajuda as pessoas a terem uma visão mais completa e integrada. O que não significa que os participantes saem daqui especialistas, mas sim com capacidade de olhar e de entender a realidade da comunicação desta forma integrada. Pensamos que este programa é um programa inovador porque tenta trazer para a ribalta esta perspetiva integrada da comunicação que está muito ausente da maior parte das organizações. Há todo um caminho de reflexão, de saber como gerir os meios de forma integrada, de saber pensar e decidir comunicação. O desafio é muito grande.
O que tem este programa de diferente?
Nós consideramos o programa irreverente. Exceto em algumas organizações muito grandes, a comunicação é o parente pobre. Não é difícil perceber que a comunicação é importante, o difícil é introduzir a perspetiva profissional da comunicação integrada. É o mais complicado. Mesmo em termos de mercado académico há pouca oferta pós- licenciatura ou pós-graduada sobre esta visão integrada da comunicação. Nós arriscámos com isto. Queremos elevar a fasquia e sermos promotores da gestão integrada da comunicação.
Qual é o impacto que a comunicação pode ter na vida de uma empresa?
Muito grande.Mais ou menos diretamente, a comunicação, em todas as suas dimensões, impacta os resultados da empresa. Por exemplo, no plano interno de uma empresa, em projetos de mudança altamente fraturantes, que podem ser muito bem ou pessimamente comunicados. O impacto de uma má decisão de comunicação pode ser muito grande. A gestão dos silêncios também é importante, tal como a questão da reputação. Vejam-se os riscos de uma reputação nas redes sociais. De facto é importante saber cuidar da comunicação.
Quais são os ingredientes que fazem uma boa comunicação?
Diria que primeiramente o topo da organização, a alta direção, a forma como esta entende a comunicação. Isso é absolutamente decisivo, tudo começa aí. Num outro plano, diria a clareza com que os objetivos para a comunicação são definidos é outro fator decisivo. Ou seja, ter muito claro para que é que serve a comunicação, onde quero chegar com a comunicação. E não há uma resposta teórica que sirva para a totalidade das problemáticas da comunicação que se colocam. Estes dois ingredientes parecem-me absolutamente críticos. Depois há um terceiro pilar que é a questão das expertises. A expertise pode ser interna ou externa mas deve ser multidisciplinar. Há ainda o budget mas uma comunicação pode ser muito impactante sem que o orçamento seja decisivo. Tenho acompanhado casos de sucesso em que os orçamentos são incrivelmente baixos.
De que forma um programa como este pode ajudar a mudar a mentalidade e a forma como se olha para a comunicação nas empresas?
O programa de “Gestão Integrada da Comunicação: uma abordagem 360º”, ainda é um programa jovem, vai para a terceira edição, mas da experiência que temos com as pessoas que já o fizeram é de uma riqueza muito grande, precisamente por esta visão alargada e integrada, muito abrangente. Tem a capacidade de ajudar as pessoas a pensarem a comunicação mas também a prepará-las para tomarem decisões ou para ajudar outros, nas suas organizações, a tomarem boas decisões na área de comunicação.
Todas as pessoas que intervêm no programa falam muito da sua experiência profissional e que vêm à academia trazer a sua “respiração da rua”. Mas não com a ideia pré-formatada de dizer se faz comunicação apenas de uma maneira porque cada caso é um caso. A ideia do programa é abrir horizontes, a outras realidades, mas muito com os pés no chão.
O curso trabalha muito na riqueza dos formadores, na grande diversidade dos cerca de 16 formadores, com visões diferentes e percursos diferentes mas com uma abordagem complementar. Por outro lado, temos a riqueza que são os participantes que vêm de todo o tipo de organizações, e o networking em sala permite o confronto com as próprias experiências e expectativas. Ao longo das 70 horas do programa, as pessoas interceptam a sua vida profissional com o curso, e saem aqui com uma grande quantidade de ferramentas e, sobretudo, com uma visão mais completa e enriquecida das possibilidades da sua própria intervenção nas organizações em que estão inseridas.
Como é que avalia as empresas portuguesas ao nível da comunicação numa escala de 1 a 10?
Para não ser injusto, diria que, numa escala de um 1 a 10, as empresas nacionais estarão entre um 6 e 7. Mas se virmos a comunicação em termos não integrados, neste ou naquele meio de comunicação, nós fazemos comunicação muito bem. Temos muito boas práticas e temos gente fantástica.
O nosso problema não é o déficit de bons profissionais. Acho que temos excelentes profissionais, em comunicação publicitária interna, de crise, por exemplo, quer em consultoras quer dentro das empresas, e por exemplo, boas práticas em filiais de multinacionais em Portugal que são benchmarketing para todo o mundo. Do ponto de vista da gestão integrada da comunicação, e mesmo dentro das melhores organizações, acho que temos um caminho ainda bastante grande a percorrer para fazer conseguir esta visão de 360 graus.
Há alguma área que seja um bom exemplo de gestão integrada?
Diria que os sectores economicamente mais pujantes em termos de comunicação são a distribuição e o turismo. São sectores mais expostos e que precisam muito desta gestão integrada.
*Co-cordenador do programa Gestão da Integrada da Comunicação – Uma abordagem 360º, e professor auxiliar na FCH/ Universidade Católica








